Tintas com níveis perigosos de chumbo são largamente vendidas no Brasil

Por Zuleica Nycz

Tintas imobiliárias podem conter altos níveis de chumbo, em direta violação da Lei Federal 11762 de 2008.  Estudos conduzidos pela APROMAC Associação de Proteção ao Meio Ambiente e pela Toxisphera Associação de Saúde Ambiental mostram que o mercado nacional está inundado de tintas com chumbo acima do limite permitido. Essas tintas são usadas em residências, escolas, creches, hospitais e postos de saúde, por exemplo, expondo as crianças a dano cerebral permanente pela exposição ao chumbo. 

Durante a Semana Internacional de Ação pela Prevenção à Contaminação por Chumbo em Tintas, liderada pelo PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) e pela OMS (Organização Mundial da Saúde), que acontece de 23 a 29 de outubro, várias organizações não governamentais em todo o mundo fazem um apelo aos governos para que tomem providências para banir o chumbo em tintas.

A Diretora do Departamento de Saúde Pública, Meio Ambiente e Determinantes Sociais da OMS, dra. Maria Neira, declarou: “A exposição ao chumbo é perigosa para a saúde humana, especialmente para as crianças…  Não existe necessidade alguma de adicionar chumbo às tintas.  Já existem substâncias químicas alternativas e seguras que podem ser usadas. A melhor maneira de assegurar que somente tintas sem chumbo sejam vendidas é os países estabelecerem leis, regulamentos e padrões que proíbam a fabricação, importação, exportação, venda ou uso de tintas contendo chumbo.”

No Brasil, a Lei 11762 de 2008 não foi implementada até hoje.  Essa lei fixa o limite máximo de chumbo permitido em tintas imobiliárias e de uso infantil, em 600ppm, mas estudos feitos pela APROMAC encontraram tintas no mercado contendo mais de 170.000 ppm (2009) e cerca de 59.000 ppm em 2012.  Diante da omissão do governo federal em fazer cumprir a lei, em 2010 a APROMAC solicitou ao MPF do Paraná que tomasse providências urgentes para garantir o banimento do chumbo em tintas no Brasil. Em 2016 o MPF entrou com uma Ação Civil Pública contra a União e a Comissão Nacional de Segurança Química do Ministério do Meio Ambiente criou um Grupo de Trabalho para construir uma proposta de Decreto de Regulamentação da Lei, e uma proposta ao Congresso Nacional de um Projeto de Lei para aperfeiçoar a Lei 11762/2008, que tem severos problemas de redação legislativa.

A maior preocupação das ONGs é com a exposição infantil.  Quando as crianças são expostas ao chumbo seu desempenho escolar diminui, o que prejudica o seu desempenho laboral ao longo de toda a vida.  Um estudo recente do Departamento de Saúde Ambiental da Escola de Medicina da Universidade de Nova York investigou o impacto da exposição infantil ao chumbo para a economia dos países e estimou que há uma perda cumulativa total de 977 bilhões de dólares (cerca de três trilhões de reais) por ano em países em desenvolvimento.[[1]]

A perda anual estimada no Brasil é de 84 bilhões de reais, equivalente a 1,43% do PIB nacional.  Na América do Sul, a perda estimada entre os países alcança a cifra de 288 bilhões de reais em média. [2]

Além de causar sérios danos ao desenvolvimento da inteligência infantil, há fortes evidências de que a exposição infantil ao chumbo está relacionada ao aumento da violência e do comportamento impulsivo, e ao aumento dos casos de retardo mental, reduzindo o potencial de aprendizado e da produtividade laboral.  Isso significa que a exposição ao chumbo reduz as oportunidades de emprego e a produtividade na vida adulta das crianças expostas, o que vai afetar negativamente também o desenvolvimento de nações que não decidiram ainda fazer o controle rigoroso dessa substância em produtos vendidos no seu mercado.

As ONGs recomendam que o governo brasileiro implemente – de fato – a lei do chumbo em tintas em todo o território nacional, controlando as importações e a fabricação nacional, e que não apliquem o duplo padrão de exportar tintas nacionais com chumbo para países em desenvolvimento que ainda não possuem uma regulação efetiva.  Recomendam também que as empresas eliminem voluntariamente o chumbo de suas tintas imediatamente e que os consumidores sejam devidamente informados e exijam produtos seguros e rotulados adequadamente.

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APROMAC Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte é uma organização fundada em 1985 com objetivo de proteger o Meio Ambiente e a Saúde Humana, e atualmente representa o FBOMS – Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais pelo Meio Ambiente e o Desenvolvimento, na Comissão Nacional de Segurança Química do Ministério do Meio Ambiente.

TOXISPHERA Associação de Saúde Ambiental é uma organização criada em 2009 no Paraná voltada para a disseminação dos conceitos de segurança química e saúde ambiental.

Ambas as organizações são membro do IPEN, uma rede global de centenas de ONGs de 116 países que atuam para proteger a saúde humana e o meio ambiente dos danos causados por substâncias químicas tóxicas.

[1] Economic Costs of Childhood Lead Exposure in Low­ and Middle­ Income Countries, por Teresa M. Attina e Leonardo Trasande: Environmental Health Perspectives; DOI:10.1289/ehp.1206424; http://ehp.niehs.nih.gov/1206424/ .

[2] http://ehp.niehs.nih.gov/wp-content/uploads/121/9/ehp.1206424.pdf e http://www.med.nyu.edu/pediatrics/research/environmentalpediatrics/leadexposure

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