“É preciso travar a luta de classes”, diz presidenta da CUT Minas

No centenário da primeira greve geral do país, trabalhadores vão às ruas contra o golpe e a retirada de direitos

Por Wallace Oliveira, no Brasil de Fato

No centenário da primeira greve geral do país, trabalhadoras/es organizam novas grandes mobilizações contra o golpe e o programa antipopular do governo não eleito de Temer (PMDB). De costas para o povo, os golpistas atuam sistematicamente para destruir os direitos conquistados no último século, colocando o Estado a serviço dos grandes empresários e do sistema financeiro. Para barrar esse retrocesso, é fundamental dialogar com a imensa maioria da população, politizar as discussões sobre o que está acontecendo no país e pressionar os parlamentares junto a suas bases eleitorais. Esse é o ponto de vista da educadora Beatriz Cerqueira, presidenta da CUT Minas e coordenadora geral do Sindicato Único dos Trabalhadores da Educação de Minas Gerais.

Brasil de Fato MG – Que ações serão realizadas para a luta do dia 21 de abril em Minas Gerais? Quais as reivindicações do movimento sindical para o governo do estado?

Beatriz Cerqueira – O dia 21 de abril historicamente é dia de luta social em Minas Gerais. Sempre levamos as nossas pautas para lá. Em 2017, o caráter é diferente pela conjuntura de exceção que estamos vivendo. Acabamos de completar um ano do golpe de Estado e é esta luta que levaremos para as ruas de Ouro Preto: contra o golpe, contra as reformas trabalhista e da previdência e contra a terceirização. As categorias e movimentos que têm pautas específicas também as levarão. A proposta é fazer um ato dos movimentos sociais e movimento sindical, fazendo uma homenagem a lutadores e lutadoras que foram importantes neste ano de lutas que tivemos. Faremos o nosso ato popular, sem grades, sem controle nem revista de bolsas e, esperamos, sem repressão.

Como você recebeu a indicação para receber a medalha da Inconfidência?

A Inconfidência tem um significado de contestação, de levante, de luta contra o sistema. A Medalha deve significar este momento da história mineira. Mas ao longo do tempo assistimos algumas pessoas que não têm nenhuma referência de luta serem homenageadas. Recebo a medalha como um reconhecimento de luta coletiva, não como mérito pessoal. Essa medalha pertence a todo o movimento popular, juventude e sindical que tem enfrentado o fascismo, a criminalização das lutas, que não tem vergonha de suas bandeiras e não abriu mão da luta de classes.

A greve geral convocada para o dia 28 de abril ocorre no momento em que se comemora o centenário da primeira greve geral do país. Qual o significado dessa nova greve no Brasil de hoje?

O momento que o Brasil vive hoje é gravíssimo. Estamos diante da tentativa de imposição de um novo modelo de Estado Brasileiro por um governo e um Congresso Nacional que não têm legitimidade para isso. Este governo, com este programa, não foi eleito nas urnas. Este Congresso não foi eleito para ser uma Constituinte e fazer a revisão da Constituição de 1988, como iniciou em 2016 com a aprovação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 241. Querem um Estado menor, onde não caiba mais educação, saúde, previdência, segurança pública, geração de empregos e combate à desigualdade social e pobreza como políticas públicas para a maioria da população. Querem um Estado que atenda ao sistema financeiro internacional. Por isso, o pagamento da dívida pública e seus juros foi o único ponto que não foi congelado por 20 anos. Querem vender todo o patrimônio do país e privatizar os serviços públicos. Por isso, sofremos o golpe parlamentar em 2016.

Como está a mobilização das categorias no Brasil e em Minas Gerais para a greve do dia 28?

A classe trabalhadora corre o risco de voltar à era pré-Vargas, com as políticas que tentam aprovar no Congresso Nacional. A reforma trabalhista é mais do que rasgar a CLT, é dar garantias jurídicas a um processo de precarização do trabalho como não vivemos na história da República. Ao mesmo tempo, a reforma trabalhista ataca a CLT, a Justiça do Trabalho, o direito à organização sindical, desrespeita Convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). E, se aprovada, não trará mais empregos, como alegam deus defensores.

A indústria brasileira está sendo destruída. As categorias com campanhas salariais tiveram piores resultados da década. A greve se faz urgente e necessária para fazer a luta de massas e frear esta onda conservadora. Mas uma greve, para além do dia em si, envolve um processo de mobilização, debate nas categorias, politização da luta a partir de uma pauta concreta. O dia 28 será um divisor na luta sindical. As direções de sindicatos que continuarem ignorando a conjuntura nacional de ataques que estamos sofrendo serão duramente cobradas pelas bases de suas categorias. Não é possível mais fazer apenas a luta de categoria. Quem fizer isso estará derrotado, sua pauta não avançará porque há uma luta que precisa ser travada antes, que é a luta de classes. Teremos uma forte greve em Minas Gerais com o envolvimento de muita gente. Todo mundo é protagonista desta luta!

Nas últimas mobilizações contra as reformas de Temer, a Justiça do Trabalho puniu alguns sindicatos com multas. Foi o que ocorreu, por exemplo, no dia 15 de março com os metroviários de Minas e de São Paulo. Essas ações são uma tentativa de criminalizar e intimidar o movimento sindical?

A criminalização das lutas sociais faz parte do capitalismo e é essencial para a sobrevivência de um governo sem votos. Mas, na CUT Minas, já decidimos que essas multas não são da categoria e não serão responsabilidade apenas do sindicato. Foram multas por luta de classe. Então, devem ser assumidas por todos nós. A CUT iniciará uma campanha de arrecadação de recursos para o pagamento das multas já existentes e para aqueles que ainda virão.

No dia 31 de março, durante a realização de grandes protestos por todo o país, Temer sancionou a lei da terceirização, um dos maiores ataques aos direitos dos trabalhadores brasileiros desde a criação da CLT, em 1943. O que mais é preciso fazer para enfrentar esse governo que atua de costas para o povo, mostrando-se completamente fechado às reivindicações dos trabalhadores? Como converter as lutas dos trabalhadores em conquistas efetivas?

A primeira tarefa é sairmos das nossas bolhas, dos nossos grupos de Watshapp e de Facebook. Conversar com quem pensa diferente da gente e só tem a Rede Globo como referência de informação. É preciso politizar a luta. O que eles estão tentando fazer é exatamente o contrário. Criminalizam a política e as pautas progressistas para afastar o povo. A negação da política é fundamental para governos autoritários.

Também é preciso entendermos que o ciclo “todos ganham” da última década no Brasil, com o neodesenvolvimentismo, acabou. O trabalhador via o salário mínimo ser valorizado como nunca antes e os banqueiros lucraram como nunca tinham lucrado antes. Esse momento se encerrou. Agora, diante de uma crise mundial, o capital não vai querer dividir o seu lucro com trabalhador. Não se trata mais de avançar em conquistas, mas impedir retrocessos. As reformas da previdência e trabalhistas precisam ser derrotadas. Além do diálogo com o povo, outra ferramenta eficaz é mexer com a base do deputado federal, contar para quem votou nele o que ele anda fazendo em Brasília e como isso vai afetar as pessoas. Envolver Câmaras municipais e prefeitos nessa briga também. Todo vereador e todo prefeito é vinculado a um deputado. Portanto, também é responsável politicamente pela retirada de direitos.

Quem ganha com a terceirização e o desmonte da Previdência?

O sistema financeiro e os grandes empresários.

Na prática, a terceirização significa: salários menores, trabalhadores terceirizados recebendo cerca de 24% a menos com jornada semanal de 3 horas a mais; maior rotatividade, aumento dos acidentes de trabalho e doenças laborais; substituição de concursos públicos por empresas ou cooperativas acabando com políticas de planos de carreira, negociações e pisos salariais. A terceirização irrestrita foi aprovada por uma manobra do governo e Câmara para dar segurança jurídica aos empresários que já desrespeitam direitos básicos dos trabalhadores poderem continuar e aumentar essa prática com a garantia de lei. Não vai gerar mais empregos, vai acabar com empregos diretos e viveremos um fenômeno da “pejotização”, com trabalhadores sendo demitidos e obrigados a criarem pessoas jurídicas para prestarem serviços que antes eram prestados por eles mesmos diretamente à empresa. Mas, agora, sem a proteção da legislação trabalhista, sem Previdência ou FGTS.

Ao sistema financeiro, é essencial que o Estado brasileiro pare de fazer investimentos sociais para, de um lado, garantir a transferência dos recursos do orçamento para o pagamento da dívida pública e seus juros; e, de outro, oferecer como mercadoria aquilo que havíamos conquistado como direitos, criando planos de saúde; planos privados de previdência; escolas e universidades privadas.

Edição: Joana Tavares

Foto: Lidyane Ponciano

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