ES – Pulverizações aéreas de agrotóxicos não tem fiscalização no Estado

Por Fernanda Couzemenco, no Século Diário

As pulverizações aéreas de agrotóxicos no Espírito Santo são feitas sem licenciamento ambiental e sem qualquer fiscalização. A denúncia, feita em novembro de 2016 em audiência pública realizada na Assembleia Legislativa sobre o assunto, voltou à pauta dos pequenos agricultores do norte e noroeste capixaba. Na verdade, nunca saiu, visto que os sobrevoos são constantes na região, sendo contratados por médios e grandes produtores, principalmente de café, cana de açúcar e banana.

O último flagrante foi feito em Montanha, extremo norte do Estado, no dia 27 de abril, na comunidade de Vinhático. O agricultor Dione Albani da Silva, militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) no município, fotografou (ao lado) o rasante da aeronave, sobre um cafezal, e suas manobras por cima de seu próprio sítio e sobre a Escola Família Agrícola local.

Devido à proximidade com o início da colheita do café, o agricultor afirma que, muito provavelmente, não se tratou de fertilizantes folhear, mas sim de agrotóxicos, mesmo, para evitar ou controlar alguma praga que já esteja se manifestando, como a ferrugem, a broca do café ou o bicho mineiro, muito comuns nessa época de colheita, em que a planta sofre um estresse muito grande.

Dione ressalta que, além da possibilidade de contaminação de áreas vizinhas ao cafezal que contratou o serviço, com sítios agroecológicos e escolas, essa pulverização especificamente também trouxe o risco de ter deixado resíduos no café. “Eu não tenho muito conhecimento sobre agrotóxicos, não tenho propriedade pra falar de período de carência, mas penso que uma semana só, não é”, pondera, considerando que a colheita teve início poucos dias depois da pulverização.

O camponês afirma que essas ações têm sido comuns na região. “Nos últimos quatro meses, já é a terceira ou quarta que eu vejo”. “Geralmente são em cafezais, mas também já ouvir relatos de plantios de eucalipto”, conta.

Abel Taveira de Moraes Junior, presente na citada audiência da Assembleia Legislativa, na época representando a secretaria executiva da Comissão de Produção Orgânica do Espírito Santo (CPOrg), explica que algumas plantações de café só conseguem receber os pesticidas por sobrevoo, devido ao grande adensamento das plantas. “O trator não consegue entrar”, conta. Além disso, o preço do serviço também é mais atraente. “Pulverização aérea é muito barata”, diz.

Veneno no café da manhã

A Instrução Normativa nº 2, de janeiro de 2008, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), determina que as aplicações aeroagrícolas ficam restrita “à área a ser tratada”, observando algumas regras, entre elas, a distância mínima de “500 metros de povoações, cidades, vilas, bairros e mananciais de captação de água para abastecimento da população” e de “250m de de mananciais de água, moradias isoladas e agrupamentos de animais”. Além disso, “as aeronaves agrícolas, que contenham produtos químicos, ficam proibidas de sobrevoar áreas povoadas, moradias e agrupamentos humanos”.

A explicação para a restrição, segundo Dione, é que, mesmo depois de ter passado sobre a plantação que contratou o serviço, o bico do pulverizador, na aeronave, continua deixando cair um pouco de veneno.

Por isso, o último sobrevoo flagrado em Vinhático (Montanha), portanto, estaria desobedecendo a legislação federal, visto que as manobras foram feitas por cima da Escola. “Era hora do café da manhã. Ficamos com receio de alguma contaminação”, relata o professor e coordenador administrativo, Alex Nepel Marins. “A gente trabalha aqui na escola com outro modelo de agricultura, que respeita os recursos naturais e a saúde das pessoas, através do viés da agroecologia. E, ao mesmo tempo, tem que conviver com um avião fazendo isso bem em cima da gente”, reclama.

Jogo de empurra-empurra

Uma instrução normativa do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (Idaf) trazia outras regulamentações, mas foi revogada pela própria autarquia em 2014. A lei estadual vigente, no entanto, que é soberana à extinta normativa do Idaf, exige que seja expedida licença ambiental para a atividade, mas a regra não é fiscalizada.

No Estado, há somente uma empresa autorizada pelo Mapa a fazer o serviço, a Aeroverde, de Linhares. A licença ambiental, no entanto, deve ser exigida pelo produtor que contrata o sobrevoo. “O produtor é quem deve solicitar licença ambiental, mas ele não o faz, a empresa também não pede e ninguém fiscaliza”, afirmou Abel. “A pulverização nunca foi fiscalizada no Espírito Santo e nenhum voo tem autorização ambiental”, alerta.

Há pelo menos três inquéritos que judicializam a falta de fiscalização da atividade no estado: os IC 1.17.003.000083/2015-49 e1.17.003.000107/2014-89, do Ministério Público Federal, e o IC 2014.0013.4884-50, do Ministério Público Estadual.

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