Brasil do Pato: Empresas são “pagas” para apoiar reformas que elas defendem, por Leonardo Sakamoto

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Uma das principais justificativas utilizadas pelo governo federal para aprovar as Reformas Trabalhista e da Previdência é de que o mercado espera que elas aconteçam para sentir confiança na economia do país e nos ajude a sair do atoleiro.

É irônico, portanto, ver o Congresso Nacional negociando a aprovação de perdão ou renegociação (a perder de vista) de dívidas de empresas com o país, que somam vários bilhões, em nome da aprovação das mesmas reformas.

O texto que passou pela comissão especial no Congresso Nacional para discutir o Programa de Regularização Tributária prevê o parcelamento das dívidas em até 180 meses e garante às empresas devedoras o direito a até 90% de desconto em multas. O governo atua para que a mordida seja menor, mas há parlamentares que batem o pé.

Ao mesmo tempo, o governo Temer fez um acordo com a bancada ruralista para perdoar juros e conceder descontos sobre as dívidas bilionárias com o Fundo de Amparo ao Trabalhador Rural (Funrural) em nome do apoio às reformas. Mesmo assim, tramita no Senado uma proposta de perdão geral e irrestrito.

A bem da verdade, não é necessário ao governo ”comprar” o apoio de parlamentares para aprovação da Reforma Trabalhista geral, da Reforma Trabalhista Rural e da nova Lei da Terceirização – sonhos de consumo de parte de industriais, comerciantes e do agronegócio. Isso eles aprovam atendendo ao pedido de suas financiadoras de campanha ou mesmo de seus interesses pessoais, considerando que a bancada de empresários no Congresso Nacional é grande. Tanto que a Reforma Trabalhista que saiu do Planalto era menor e se tornou uma massa gigante e disforme pelas mãos da Câmara.

A Reforma da Previdência, por sua vez, interessa mais aos bancos e ao sistema financeiro. E ela vai custar votos – e talvez até a reeleição – de muitos deles. Vão precisar, portanto, de doações das pessoas físicas de empresários e acionistas em suas campanhas no ano que vem.

Resumindo: parlamentares afirmam que apoiarão as reformas, que são do interesse de empresas, se as empresas forem beneficiadas, antes, com perdão de dívidas – que pioram o quadro de déficit do poder público que está na justificativa de origem das próprias reformas.

Durante o primeiro ano de Michel Temer à frente do país, as cúpulas do governo federal e de sua base de apoio no Congresso Nacional frequentaram reuniões com grandes produtores rurais, grandes industriais, grandes nomes do varejo, exportadores, importadores e instituições financeiras.

Nesses encontros, foram intensamente ovacionados quando prometiam que aprovariam a Reforma Trabalhista, a Lei da Terceirização, a Reforma da Previdência e a PEC do Teto dos Gastos Públicos. Ou seja, a redução do Estado de proteção social brasileiro. Não se ouviu reclamações, contudo, sobre desonerações e subsídios que beneficiam o setor empresarial.

Essas mudanças estão na pauta histórica das grandes associações de classe empresariais. A ponto de parte das propostas da Reforma Trabalhista aprovada na Câmara dos Deputados ter saído diretamente dos computadores de entidades patronais.

Traduzindo: No Brasil, não basta ao grande impor sua vontade. Tem que tirar uma casquinha.

Se saídas amargas são necessárias para sairmos da crise, o Congresso Nacional deveria buscar formas de, ao mínimo, dividir os custos disso entre pobres e ricos para que o prejuízo não fique apenas com os mais vulneráveis. Porque esses perdões acima citados contribuem com o aumento do chamado ”rombo” nas contas públicas, que vão ter impacto na garantia de serviços básicos de saúde e educação ou mesmo na Previdência.

O Funrural por exemplo, ajuda no financiamento da aposentadoria de trabalhadores rurais da economia familiar, transformada em ”vilão” por custar caro. O Congresso Nacional e o governo, ao reduzir essa dívida, transferem o ônus para as costas do trabalhadores rural pobre, que – se aprovada a reforma – terá que contribuir por 15 anos ininterruptos para conseguir sua aposentadoria. Hoje, basta 15 anos de comprovação de trabalho. Ou seja, não vão se aposentar.

Se o Congresso Nacional fosse a representação do povo brasileiro e não do interesse do poder econômico, deveria defender a taxação dos dividendos recebidos de empresas por pessoas físicas, a mudança no imposto de renda, isentando os pobres e a maior parte da classe média e cobrando mais dos que mais têm, com alíquotas de até 40%. Ou ainda aumentar as alíquotas de nossos impostos sobre heranças e taxar grandes fortunas.

Mas não é.

De todas as espécies que habitam a Terra, o pato amarelo é aquela que possui o apetite mais insaciável, devorando tudo ao seu redor.

E é a mais defendida por políticos. Mesmo diante dos maiores cataclismas, estima-se que o trabalhador, espécie em maior número, porém mais vulnerável, corra o risco de entrar em extinção antes deles.

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