Pedido do MPF garante salário-maternidade para indígenas Mbyá-Guarani entre 14 e 16 anos

Decisão beneficia mulheres da etnia em mais de 30 cidades do noroeste gaúcho

Procuradoria Regional da República na 4ª Região

A partir de atuação do Ministério Público Federal (MPF), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) determinou que o Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) admita o ingresso na Previdência Social e, consequentemente, aceite requerimentos de salário-maternidade formulados por jovens entre 14 e 16 anos, da etnia Mbyá-Guarani, que vivem nas cidades que compõem a Subseção Judiciária Federal de Santo Ângelo/RS (veja a lista abaixo). O MPF ainda garantiu que o tempo de trabalho anterior aos 14 anos, quando comprovado, seja computado para fins de carência.

A decisão unânime da 6ª Turma do TRF4 confirma pedido de ação civil pública (ACP) ajuizada pelo MPF: que o INSS admita o ingresso e abstenha-se de indeferir, exclusivamente por motivo de idade, os requerimentos de salário-maternidade formulados pelas seguradas Mbyá-Guarani da região.

Histórico – O Inquérito Civil nº 1.29.010.000067/2013-84 apurou que o INSS indeferia pedidos do referido benefício às indígenas daquela cultura menores de 16 anos. A autarquia argumentava que elas eram seguradas especiais, pelo exercício de atividade em regime de economia familiar, sendo que esta necessita ter a idade mínima de 16 anos para fazer jus ao salário-maternidade. O Instituto também considerava que o menor de 16 anos não pode ser considerado trabalhador, pois existe proibição constitucional ao trabalho da criança e do adolescente.

O MPF ingressou com ACP, assinada pelo procurador da República Osmar Veronese, onde apontou as diferenças entre a cultura indígena e a não-indígena (sociedade envolvente). Estudo antropológico juntado ao caso pela Instituição mostrou que, a partir dos dez anos, meninos e meninas Mbyá-Guarani gradativamente assumem responsabilidades próprias e que as jovens, com a chegada da menstruação, iniciam a vida sexual, o que as leva a casar e ter filhos precocemente. Por isso, o artigo 55 da Lei nº 6.001/1973 (Estatuto do Índio) estabelece que “o regime geral da previdência social será extensivo aos índios, atendidas as condições sociais, econômicas e culturais das comunidades beneficiadas”, um direito também reconhecido pelo artigo 231 da Constituição Federal, que reconhece “aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”.

No parecer encaminhado ao TRF4, o procurador regional da República Claudio Dutra Fontella lembrou que os tribunais vêm reconhecendo, para fins previdenciários, o tempo de serviço rural respectivo, ainda que a idade de exercício desse labor indígena contrarie a Constituição e a lei no tocante à idade. “A norma editada para proteger o menor não pode prejudicá-lo naqueles casos em que efetivamente trabalhou”, escreveu.

Já na sustentação oral durante o julgamento, o procurador regional da República Maurício Pessuto defendeu que o tempo de trabalho anterior aos 14 anos fosse computado para fins de carência, devido às peculiaridades da cultura da etnia. A solicitação foi incluída no voto do relator e acompanhada por toda a Turma no acórdão.

Cidades da Subseção Judiciária Federal de Santo Ângelo*

Ajuricaba, Augusto Pestana, Bozano, Caibaté, Catuípe, Cerro Largo, Chiapetta, Coronel Barros, Dezesseis de Novembro, Entre Ijuís, Eugênio de Castro, Giruá, Guarani das Missões, Ijuí, Inhacorá, Jóia, Mato Queimado, Nova Ramada, Pirapó, Porto Xavier, Rolador, Roque Gonzales, Salvador das Missões, Santo Ângelo, Santo Antônio das Missões, Santo Augusto, São Luiz Gonzaga, São Miguel das Missões, São Nicolau, São Pedro do Butiá, São Valério do Sul, Senador Salgado Filho, Sete de Setembro, Ubiretama e Vitória das Missões

(*) a decisão também garantiu o benefício para outros municípios da subseção que possam surgir

Foto: Arquivo pessoal da antropóloga Míriam Chagas/PRR4.

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