Prefeitura do Rio causa pânico ao não alertar sobre chuvas por temer pânico, por Leonardo Sakamoto

Blog do Sakamoto

A gestão Marcelo Crivella não alertou sobre a gravidade das chuvas que caem sobre o Rio de Janeiro desde segunda para evitar que a população entrasse em pânico. Foi o que informou o secretário de Ordem Pública, coronel Paulo César Amêndola. Segundo ele, a situação foi atípica.

Chamamos, equivocadamente, de ”desastres naturais” estragos e tragédias causadas por furações, terremotos, inundações, grandes temporais, entre outros eventos. Mas não há nada de ”natural” nisso, pois já há tecnologia e protocolos para prever, reduzir e evitar o sofrimento causado.

Como a retirada da população de um local, com antecedência, e a recolocação em outro, de forma digna. Ou a melhoria estrutural de uma comunidade para evitar um deslizamento. Ou ainda o aviso à sociedade de que um temporal deve acontecer para que todos possam se precaver. Na cidade de Nova York, por exemplo, todas as pessoas que estão em determinada área recebem um aviso de risco de alagamento em seus celulares horas antes disso acontecer.

Afirmar que uma informação foi deliberadamente censurada para evitar pânico não é apenas um paternalismo burro que desconsidera que a população é capaz de tomar decisões sobre sua própria vida. Também não fica restrito ao campo da irresponsabilidade e da incompetência. É um ato deliberadamente ilegal, pois priva a sociedade de informações públicas fundamentais para a garantia de sua integridade.

As providências não devem incluir apenas um sistemas de alerta decente, para fazer circular informação rápida e efetivamente horas, dias ou semanas antes de um fenômeno natural. Mas também a execução de políticas decentes de habitação, saneamento, contenção de encostas, dragagem de rios, limpeza de vias, campanhas de conscientização quanto ao lixo. Falhas neste caso custam muito e um “foi mal, aí, não tinha como antecipar” não resolve.

Não precisamos de governantes otimistas, que acreditam na possibilidade de chover menos, ou de administradores religiosos, que rezam por uma trégua dos céus, terceirizando a responsabilidade para o Sobrenatural. E sim de gente realista, que tem o perfil de alguém que espera sempre o pior e age preventivamente, não culpando as forças do universo pelo ocorrido, muitos menos a estatística e a metereologia.

O Brasil tem ignorado, há anos, em seus planejamentos os estudos e relatórios internos que mostram que as mudanças climáticas já afetaram, de forma definitiva, nosso regime hídrico. E vai jogar para a população o preço, econômico e social, dessa incompetência ou cara de pau. Não é que chove abaixo ou acima da média. O clima mudou, essas médias não valem mais. Ou seja, o regime hídrico atual não é mais o mesmo daquele que vivenciamos no século 20.

Quando um governo federal, estadual ou municipal usa o argumento de que estamos em um momento atípico para justificar um cataclisma envolvendo água, apenas evidencia que não levou em conta todas as variáveis em seu planejamento. Pois, se tivesse, a própria justificativa não faria sentido.

Reclamamos da arrogância de Donald Trump, que anunciou que os Estados Unidos deixará o Acordo de Paris, que tem objetiva reduzir o impacto das mudanças climáticas. Bradamos que esse comportamento negacionista não nos representa. Mas quando falamos dos desastres nada naturais daqui, muita gente não quer nem ouvir, não acredita, pouco se importa ou xinga quem reclamou – mesma tática do novo presidente do Grande Irmão do Norte.

Marcelo Crivella assumiu há menos de seis meses, portanto a responsabilidade pelo problema acumulado deve ser contabilizada em todas as administrações antes da dele. Mas aquilo que ele poderia ter feito de mais importante (circular rapidamente informação junto à sociedade), não fez. Torna-se, assim, tão responsável quanto seus antecessores.

Pena que as eleições são realizadas em tempo seco. E que a memória dos eleitores seque tão rápido.

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