Noruega corta grana para a Amazônia. Mas o que importa é que o “Agro é Pop”, por Leonardo Sakamoto

Blog do Sakamoto

A Noruega anunciou que vai cortar pela metade os repasses do país ao Fundo Amazônia, utilizado na proteção do bioma, na regularização fundiária e na gestão de territórios indígenas. O corte é uma forma de punição pelo aumento no desmatamento que vem ocorrendo nos últimos dois anos. De 2009 a 2016, o país nórdico aportou R$ 2,8 bilhões no fundo, mas promete aumentar a contribuição se os números voltarem a cair.

O anúncio foi feito por Vidar Helgesen, ministro do Meio Ambiente norueguês, ao lado de seu colega brasileiro, Sarney Filho. Questionado por jornalistas se ele poderia garantir que o desmatamento diminuiria, o filho de Sarney afirmou que ”só Deus pode garantir isso”. Mas que tinha expectativa e esperança de que diminuísse. A Noruega também demonstrou preocupação com relação às mudanças na legislação que vêm sendo empurradas pela bancada ruralista no Congresso Nacional.

Sem entrar no mérito da decisão do financiador (e se a causa do corte é realmente ambiental ou de contenção de despesas), vale reconhecer que as coisas não vão bem por aqui. E antes que comecem a xingar apenas o governo Temer, é importante que se diga que, em se tratando da questão ambiental, fundiária e da qualidade de vida dos povos e trabalhadores do campo, o governo Dilma foi uma tragédia. E falo com a experiência de quem acompanhou de perto a construção de usinas hidrelétricas, como a de Belo Monte e atuou como relator para o hoje Conselho Nacional dos Direitos Humanos sobre violência agrária na região. Menina dos olhos da ex-presidente, Belo Monte fomentou de desmatamento ilegal a trabalho escravo, passando por danos incalculáveis a comunidades indígenas e ribeirinhas, além de levar o caos a Altamira. E, como cereja do bolo, é citada como peça de corrupção no escândalo da Operação Lava Jato.

Quem se posicionou contra sua construção, anos atrás, foi processado, ridicularizado, humilhado e até acusado de não ser patriota e nacionalista. Hoje, um ”eu te disse” não parece o suficiente.

Agora na gestão Temer, o país vive uma escalada sem precedentes de chacinas, massacres e emboscadas de trabalhadores rurais e indígenas. Por quê? Porque fazendeiros, madeireiros, grileiros e afins sentem-se à vontade para fazer o que quiserem com a certeza de que nada ou muito pouco será feito contra eles. A última grande tragédia foi o assassinato de dez trabalhadores rurais pelas mãos da polícia em Pau d’Arco, no Pará.

Temer chegou a entregar o Ministério da Justiça, que controla a Funai, à bancada ruralista na figura de Osmar Serraglio. Quando um grupo de indígenas gamelas foi atacado, em Viana, no Maranhão, e um deles teve a mão quase decepada por um facão, o ministério soltou uma nota em que chegava a questionar se eles eram mesmo indígenas.

Diante de acusações de aumento no desmatamento da Amazônia, muitos representantes de grandes agricultores e pecuaristas fazem chantagem, insinuando que o país tem que escolher entre seguir as regras ambientais (e passar fome) ou desmatar (e garantir soberania alimentar). Forma de maniqueísmo infantil, mas que serve bem à retórica tosca de parte dos empresários que lucra fácil com a expansão agropecuária.

Esse pessoal faz a parte dos empresários do campo que segue as regras sociais, trabalhistas e ambientais passar vergonha internacional.

É possível crescer economicamente, mas com responsabilidade. Respeitando o zoneamento econômico, que diz o que pode e o que não pode se produzido em uma área; realizando uma regularização fundiária geral e confiscando terras roubadas do Estado; executando uma reforma agrária com a garantia de que os recursos emprestados pelos governos às pequenas propriedades – responsáveis por garantir o alimento na mesa dos brasileiros – sejam, pelo menos, da mesma monta que os das grandes; preservando os direitos das populações tradicionais, cujas áreas possuem as mais altas taxas de conservação do país; mantendo o exército na caserna e longe da política fundiária e indígena. Enfim, mudando o modelo de desenvolvimento, o que inclui alterar o padrão de consumo, uma vez que nós do Sul Maravilha devoramos a Amazônia, o Cerrado, o Pantanal, a Mata Atlântica, arrotando alegria.

O problema é que, depois de tudo isso, ainda somos obrigados a ver, em forma de publicidade veiculada em intervalos de telejornais, que o ”Agro é Pop”.

Errado. Por aqui, desmatamento é pop. Trabalho escravo é pop. Expulsão de indígenas é Pop. Chacina de trabalhadores rurais é pop. Ameaça a ribeirinhos é Pop. Contaminação ambiental é Pop. Grilagem de terras é Pop.

Pop, aliás, são também propagandas na TV que criticam os quem apontam os problemas de parte do agronegócio, produzidas lindamente por indústrias de automóveis para vender caminhonete.

Sepultamento coletivo de vítimas da chacina em Pau D’Arco (PA). Foto: Dinho Santos

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