Massacre de Pau D’Arco completa um mês sem que o Estado apresente respostas

Por Mauro Capagnani, na Justiça Global

Familiares e companheiros de luta dos dez trabalhadores rurais mortos pelas polícias militar e civil em Pau D’arco (PA) cobram do Estado respostas sobre o massacre, o maior dos últimos 21 anos no país. Amanhã (hoje), quando se completa um mês do crime, eles estarão nas ruas de Redenção – cidade que é o principal centro do Sul do Pará – em um ato em memória das vítimas. A intenção é exigir do Estado mais celeridade, tanto nas investigações e na responsabilização dos culpados, como no processo de assentamento das famílias na Fazenda Santa Lúcia, onde ocorreram os assassinatos, e na reparação aos familiares. O protesto começará à 8 horas da manhã, saindo de frente do batalhão da Polícia Militar em Redenção.

O Ministério Público já concluiu que houve execução. Agora, porém, é preciso aguardar que o inquérito seja concluído para que se inicie a fase processual. As informações divulgadas até agora pelo Centro de Perícias Científicas Renato Chaves, do governo paraense, já comprovaram que não havia marcas de tiros nos coletes dos policiais, nem em seus automóveis, o que ressalta o argumento de que não houve confronto. Faltam ser divulgados ainda dados essenciais, como a trajetória das balas nos corpos das vítimas, assim como os exames de balística das 53 armas apreendidas, que poderão esclarecer por quem elas foram mortas. Outro ponto importante é esclarecer a participação dos comandos da PM e da Polícia Civil no caso, assim como a relação deles com os grandes proprietários de terras da região.

A rapidez na investigação é essencial especialmente pela situação de vulnerabilidade que se encontram os familiares e as testemunhas do caso. Atualmente, os 15 sobreviventes do massacre encontram-se escondidos, por causa do risco de serem intimidados ou mortos. Entre os familiares, há casos como o Verônica Pereira Milhomem, de 54 anos, que perdeu os dois únicos filhos no massacre, além de dois irmãos, uma cunhada e dois sobrinhos. Com problemas de saúde, ela agora precisa de uma resposta rápida do Estado.

“Eu faço diálise quatro vezes por semana e também uso uma bolsa de colostomia. Meus filhos eram tudo para mim. Eram eles que faziam das coisas mais básicas, de lavar minha roupa e ajudar no banho. Eles eram meninos muito bons, nunca se envolveram com nada errado. A polícia não tinha o direito de matar eles. Se havia mandados de prisão contra outras pessoas, que as levassem presas. Mas o que ocorreu foi uma execução. Eles não tiraram apenas a vida da minha família, eles tiraram parte de mim”, conta Verônica, que atualmente conta com ajuda de vizinhos para viver.

Para Ireno Sampaio de Oliveira, de 47, que morava sozinho com o filho, Hércules, de 20 anos, morto no massacre, ainda está sendo difícil pensar sobre que caminho seguir na vida: “A gente alugava uma casinha aqui em Pau D’Arco. Depois da morte, não consegui mais morar lá. Meu filho me falava que ia lutar por uma terra para a gente viver, sem passar mais por dificuldades. Ele era um rapaz trabalhador, não fugia de serviço, fosse de pedreiro, em roça ou o que houvesse. Agora ele se foi e não sei como vou fazer. A gente veio junto para aqui tentar a vida. Está sendo bem difícil”, afirmou Ireno.

Desde a semana passada, as trabalhadoras e trabalhadores reestruturaram o acamamento nas proximidades da Fazenda Santa Lúcia, onde ocorreu o Massacre. Eles pretendem ficar ali até que o Estado realize o assentamento das famílias dentro da fazenda. Para eles, o assentamento ainda não ocorreu por falta de atuação do governo federal, o que levou a um agravamento da tensão que levou às mortes. A fazenda está em disputa desde 2013, quando houve a primeira ocupação. Os trabalhadores rurais seguidamente denunciaram que a terra era improdutiva e deveria ser usada para o assentamento. O Incra, todavia, considerou a terra produtiva, mesmo sem qualquer tipo de plantação ou criação nos seus 5.694 hectares. Assim, durante as negociaações referentes à aquisição da área, o órgão do governo chegou a oferecer R$ 21.951 milhões, em dezembro de 2015. O proprietário, todavia, apresentou uma contraproposta mais alta e as negociações não foram adiante.

Além do MP, a Polícia Federal também conduz uma investigação independente, atendendo solicitação feita pelo Conselho Nacional de Direitos Humanos. Há também uma investigação em curso pela Polícia Civil e outra interna da Polícia Militar. Porém, tendo em vista que 29 policiais civis e militares participarão da ação, tanto os familiares e amigos das vítimas, como as organizações da sociedade civil acreditam que os processos independentes do MP e da Polícia Federal deverão esclarecer melhor as circunstâncias do massacre.

Verônica Milhomem perdeu os dois únicos filhos no massacre. Foto: Mauro Capagnani

 

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