Brasil: Juiz solta 13 policiais alegadamente envolvidos no massacre de Pau D’Arco

Front Line Defenders

Em 08 de agosto de 2017, um juiz substituto soltou 13 policiais que estavam em prisão temporária em razão de sua alegada participação no massacre de dez pessoas defensoras do direito à terra associados à Liga de Campesinos Pobres – LCP, ocorrido em Pau D’Arco, Pará, Brasil.

A Liga de Campesinos Pobres é um movimento de campesinos, trabalhadores rurais e pessoas defensoras de direitos humanos que trabalha para proteger o direito à terra de suas comunidades. Um problema recorrente no Brasil é a ocupação de terras por grileiros, termo que se refere a indivíduos que se apossam de áreas usando documentos de validade duvidosa. Nesse contexto, várias pessoas defensoras de direitos humanos têm sido assassinadas.

Em 8 de agosto de 2017, um juiz substituto revogou a prisão temporária de 30 dias de 11 policiais militares e dois policiais civis que alegadamente estavam envolvidos no massacre de 10 pessoas defensoras do direito à terra ocorrido em Pau D’Arco. De acordo com o Ministério Público, as execuções foram premeditadas. Os 11 policiais militares e dois policiais civis foram presos por 30 dias em 10 de julho de 2017 a pedido do Ministério Público, a fim de salvaguardar as investigações e evitar interferências e ameaças a testemunhas. De acordo com o Ministério Público, há evidências de que os policiais detidos haviam tentado ativamente impedir a investigação ameaçando outros policiais que estavam presentes, mas não participaram do massacre. Esses policiais também estavam monitorando pessoas que entravam na sede da Polícia Federal em Redenção, onde as investigações estão ocorrendo.

A decisão de revogar a prisão temporária deixou em choque sobreviventes do massacre, promotores envolvidos e outras pessoas defensoras do direito à terra na região, os quais esperavam que as prisões fossem prorrogadas por mais 30 dias.

Na manhã de 24 de maio de 2017, um grupo de 25 trabalhadores sem-terra decidiu reocupar a fazenda Santa Lúcia, localizada no município de Pau D’Arco, no sul do Pará. Um grande número de outros trabalhadores rurais pretendia se juntar aos demais, porém não puderam alcançar o local a tempo. O grupo de 25 trabalhadores decidiu estabelecer um acampamento temporário na mata, a 300 metros de distância da sede da fazenda. Por volta de 6:30am., na mesma manhã, quatro veículos policiais chegaram ao local e os/as trabalhadores/as sem-terra resolveram fugir para a mata densa próxima. Os policiais perseguiram o grupo na mata e os localizaram. De acordo com os/as sobreviventes, a polícia disparou contra o grupo desarmado enquanto eles/as se refugiavam da densa chuva em uma tenda improvisada. Diante disso, as pessoas defensoras do direito à terra Antônio Pereira Milhomem, Bruno Henrique Pereira Gomes, Hecules Santos de Oliveira, Jane Julia de Oliveira, Nelson Souza Milhomem, Ozeir Rodrigues da Silva, Regivaldo Pereira da Silva, Ronaldo Pereira de Souza, Weldson Pereira da Silva e Weclebson Pereira Milhomem foram assassinadas pela polícia.

Diversas pessoas defensoras de direitos humanos e organizações no Brasil temem que a falha das autoridades em proteger as testemunhas e em assegurar que as investigações do caso sejam completas e imparciais põe em risco não somente os envolvidos no massacre de Pau D’Arco de 24 de maio, mas também ameaça a segurança de outras pessoas defensoras do direito à terra, especialmente no Pará. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra – CPT, o assentamento Frei Henri no Pará, também conhecido como Fazendinha, o qual abriga mais de 200 famílias às margens da rodovia PA 273, é um dos mais vulneráveis. Desde 2010, as famílias lutam para que a terra seja incluída na reforma agrária. Apesar de diversas vitórias judiciais, as autoridades têm falhado em cumprir as decisões da Justiça e garantir a segurança das famílias, as quais são frequentemente ameaçadas e atacadas por fazendeiros da região.

A violência contra pessoas defensoras de direitos humanos no Brasil aumentou em paralelo à atual crise econômica e política no país. A situação traz particular preocupação uma vez que um dos primeiros atos do governo interino foi extinguir o Ministério das Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos. Em 2017, após pressão de diferentes setores, o governo criou o Ministério dos Direitos Humanos, com um mandato mais restrito. Além disso, o governo também extinguiu o Ministério do Desenvolvimento Agrário e a Ouvidoria Agrária. Ademais, políticos de alto perfil no país têm feito diversas declarações negativas contra movimentos e organizações da sociedade civil, sugerindo que suas ações tem natureza criminosa. O Ministro da Justiça declarou em discursos que o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra – MST usou “táticas de guerrilha” durante os últimos protestos.

De acordo com a CPT, em 2016 foram registrados 1079 incidentes relacionados a conflitos agrários no país, um aumento vertiginoso comparado aos 771 casos registrados em 2015. No Pará, entre 1995 e 2010 registraram-se 408 incidentes e 61 pessoas assassinadas, aproximadamente 35% dos casos de todo o país. A CPT também registrou que na microrregião que engloba Pau D’Arco e arredores, de 1990 a 2017 foram reportados 72 assassinatos de pessoas defensoras do direito à terra em 39 incidentes.

O Comitê Brasileiro de Defensores e Defensoras de Direitos Humanos reportou 66 assassinatos de pessoas defensoras de direitos humanos em 2016. 32 mortes ocorreram no norte do país, a mesma região onde se localiza o Pará. A maioria ocorreu em razão de conflitos agrários. Até a presente data nesse ano, o Comitê reportou 43 assassinatos de pessoas defensoras de direitos humanos.

A Front Line Defenders mostra grande preocupação em face da decisão das autoridades judiciárias de soltar 13 policiais alegadamente envolvidos no massacre de Pau D’Arco, em face das evidências disponíveis, uma vez que acredita isso pode trazer riscos aos sobreviventes e testemunhas e comprometer a investigação. A Front Line Defenders insta as autoridades do Brasil a tomar todas as medidas necessárias para garantir a integridade física e psicológica das pessoas defensoras do direito à terra envolvidas no caso, bem como suas famílias.

A Front Line Defenders insta as autoridades do Brasil a:

  • Tomarem todas as medidas necessárias para garantir a integridade física e psicológica e a segurança das pessoas sobreviventes do massacre de Pau D’Arco, bem como suas famílias e outras pessoas defensoras do direito à terra no país;
  • Assegurarem que a investigação em curso sobre os assassinatos das pessoas defensoras de direitos à terra Antônio Pereira Milhomem, Bruno Henrique Pereira Gomes, Hecules Santos de Oliveira, Jane Julia de Oliveira, Nelson Souza Milhomem, Ozeir Rodrigues da Silva, Regivaldo Pereira da Silva, Ronaldo Pereira de Souza, Weldson Pereira da Silva e Weclebson Pereira Milhomem sejam completas e imparciais com o objetivo de levar os responsáveis à justiça de acordo com as normas internacionais;
  • Tomarem medidas para garantir que funcionários do governo ou outras figuras públicas se abstenham de fazer declarações estigmatizando o legítimo trabalho das pessoas defensoras de direitos humanos no país;
  • Garantir em todas as circunstâncias que todas as pessoas defensoras de direitos humanos no Brasil possam realizar suas legítimas atividades de direitos humanos sem medo de represálias e livres de todas as restrições.

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