Tentar tirar Janot sugere dificuldade para desmonte factual das acusações, por Janio de Freitas

Na Folha

Celebremos.

Parecia, ou era mesmo, um dos assuntos guardados na área de proteção. Por certo, foi um dos motivos destacados para a pretensão de Michel Temer de afastar o procurador-geral Rodrigo Janot, mesmo vendo-o a poucos passos da porta de saída (a da frente, até aqui). Eduardo Cunha raspou no assunto, de leve, nas armadilhas que, sob a forma de perguntas, da cadeia mandou a Temer. Não houve resposta. Uma decisão virtuosa de Sergio Moro, mais uma, poupou Temer de ver-se ante pontos de interrogação intransponíveis. Mas Lúcio Funaro, o intermediário profissional, o atrevido e ameaçador, não falhou.

Michel Temer e Docas de Santos: tudo a ver, como diz o bordão. Rodrigo Janot mandou ao Supremo, com pedido de inquérito, a delação de Funaro sobre a emissão por Temer, em acerto de que participou Eduardo Cunha, de medida que resultou em concessões e vantagens contratuais para empresas na Companhia Docas de São Paulo, a Codesp de Santos.

Em mãos do ministro Luís Roberto Barroso, o inquérito foi autorizado. Esse avanço encerra a inércia ocupando-se de um só fato, mas há muito tempo Michel Temer é citado, não à toa, como “homem de Docas”. O que isso significa, o Ministério Público, a Polícia Federal e o Judiciário poderiam ter dito ao país, ou ao menos aos paulistas, há anos. Sem precisar de delação.

Outros assuntos também importantes, como a participação em subornos na construção de Angra 3, levaram a defesa de Temer a pedir ao Supremo a suspeição e o consequente afastamento de Janot. O que não é muito gentil com a futura procuradora-geral, se implica a suposição de que, com ela, a vida de Temer ficaria mais leve.

Sobretudo, porém, a pretensão de tirar Janot da visão de Temer sugere dificuldade para o desmonte factual das acusações. Já as referentes a fatos da atualidade, quanto mais ao passado que entrasse no inquérito.

Enfim, celebremos. Sem negar o risco de pasmo com uma conclusão que reponha o assunto no seu ninho de silêncio produtivo e imoral.

Por falar em assuntos da área de proteção, Geddel Vieira Lima é um que, passadas mais de três décadas protegido, vê-se menos distante do mundo dos comuns.

Um esboço desse Geddel está no documentário “Geddel vai às compras”, como lembra o jornalista Tiago Dantas. A propósito das compras de fazendas e imóveis, lá está que o patrimônio de Geddel aumentou 364% em quatro anos, entre 1994 e 98 (governo Fernando Henrique Cardoso).

Não faltou, portanto, quem mostrasse Geddel na melhor autenticidade —nem estou me gabando do processo que moveu contra mim, em vão. A sua corrupção, como a de tantos, não foi obra continuada apenas de corruptos e corruptores. Os mantenedores da velha área de proteção têm a mesma responsabilidade reconhecida aos delinquentes que vêm de longe.

PODE?

Sergio Moro considerou que Lula “não tinha o direito” de lhe perguntar se poderia dizer, aos netos e outros familiares, estar sob julgamento de um juiz imparcial. É uma pergunta que todo juiz pode ouvir, com algum ou sem nenhum abalo. A depender só do juiz e suas condições, não da pergunta.

A resposta de Moro foi, claro, “pode”. Mesmo sem duvidar, nestes tempos indefinidos cabe esperar, até saber se a resposta foi mais para serenar Lula ou para confortar o próprio Moro.

Foto: Bruno Itan. Fotógrafo e morador do Complexo do Alemão

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