Dez ministros do STF votam por envio de denúncia contra Temer à Câmara

Por Cristiane Bonfanti e Murillo Camarotto,  Valor

Em pouco mais de uma hora, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu nesta quinta-feira o julgamento sobre o prosseguimento da segunda denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB), por obstrução de Justiça e organização criminosa. Por 10 votos a 1, o plenário aprovou o envio da acusação, feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR), para a Câmara dos Deputados.

Iniciada na quarta-feira, a sessão foi retomada hoje quando o placar já estava 7×1 a favor do prosseguimento. Votaram nesta quinta-feira os ministros Marco Aurélio Mello e Celso de Mello, além da presidente do STF, Cármen Lúcia. O único voto divergente foi proferido ontem pelo ministro Gilmar Mendes.

Última a votar, Carmen Lúcia acompanhou o relator e disse que o STF “carece de competência” para tratar de denúncia contra o presidente da República fora dos parâmetros estabelecidos pela Constituição.

O julgamento só aconteceu porque a defesa de Temer entrou com um mandado de segurança solicitando que a tramitação da denúncia fosse interrompida até a conclusão de todas as investigações sobre as informações supostamente omitidas no acordo de delação premiada do grupo J&F.

De maneira geral, os ministros entenderam que as supostas falhas na delação – que embasou parte da denúncia contra Temer – serão naturalmente consideradas em fase posterior, caso a Câmara dos Deputados também autorize o prosseguimento da acusação, o que é altamente improvável.

A defesa do presidente também questionou a validade das provas entregues pelos delatores, que tiveram seus acordos rescindidos pela PGR. Sobre isso, o ministro Marco Aurélio Mello disse que o cancelamento do acordo não prejudica o que foi dito pelos delatores. Não houve decisão expressa sobre esse tema, mas a tendência é que as provas permaneçam válidas.

Aprovado o encaminhamento, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), pretende votar a denúncia contra Temer no plenário em outubro. A oposição ao presidente precisa de 342 votos para autorizar o andamento do processo, o que exigiria o afastamento de Temer por 180 dias.

Votos

Celso de Mello afirmou que o Supremo não pode, num juízo técnico-jurídico, se antecipar à Câmara dos Deputados, que deve realizar um juízo político. “O eventual recebimento da peça acusatória deverá ser precedido da necessária deliberação autorizativa da Câmara”, afirmou. “A autorização da Câmara para processar e julgar presidente configura-se ineliminável exigência”, disse.

Apesar de seguir o relator, o ministro deixou claro posicionamento de que, embora o presidente da República não possa ser responsabilizado, no curso do seu mandato, por atos estranhos ao exercício do cargo, ele pode sim ser investigado tanto pela Polícia Federal quanto pelo Ministério Público. Uma eventual investigação penal contra o presidente, disse Celso de Mello, deverá ter livre curso perante o STF sem necessidade de prévia autorização da Câmara.

Em um voto rápido, Marco Aurélio afirmou que eventuais omissões dos delatores da J&F não compromete o restante das provas apresentadas por eles. “Uma omissão não pode prejudicar o que foi verbalizado. Uma vez rescindido o acordo, não há reflexo a prejudicar o que se tem como objeto”, completou o ministro.

Ontem, a maioria dos magistrados entendeu que não cabe ao STF, neste momento, discutir a validade das provas colhidas a partir das colaborações premiadas de Joesley Batista, dono da JBS, e Ricardo Saud, ex-diretor da empresa, que embasaram a acusação de organização criminosa e obstrução de Justiça contra o presidente.

Já o ministro Gilmar Mendes, que defendeu a devolução da denúncia à PGR com o objetivo de realizar ajustes, argumentou que um presidente da República não pode ser responsabilizado por crimes estranhos ao exercício de seu cargo. A denúncia descreve alguns atos supostamente praticados por Temer desde 2006.

O ministro Dias Toffoli seguiu o voto do relator, Edson Fachin, no sentido de encaminhar a denúncia para a análise da Câmara dos Deputados. No entanto, disse ter uma “divergência teórica” em relação ao voto de Fachin. Para Toffoli, o relator pode encaminhar uma denúncia diretamente à Câmara ou, se entender haver alguma ilegalidade na acusação, levar o caso a plenário.

Também está na pauta desta quinta-feira no Supremo a retomada do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4439, em que a PGR pede que o ensino religioso nas escolas públicas seja de natureza não confessional, ou seja, que não trate de uma religião específica.

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