Sobre a ignorância artificial. Por Eugênio Bucci

Hoje, a ignorância não é uma casa inabitada, desprovida de ideias, mas uma edificação repleta de baboseiras desarticuladas, uma gosma de densidade pesada que ocupa todos os espaços

No A Terra é Redonda

Quando alguém tenta imaginar o que seja a ignorância, a primeira imagem que lhe ocorre é o vazio. De fato, enquanto o saber tem para nós o aspecto de casa cheia e feliz, o não-saber é seu oposto: um lugar macambúzio, desocupado e triste. O conhecimento lembra uma constelação de fagulhas inspiradoras, como um salão de janelas amplas, ensolaradas, cheio de gente bonita indo de um lado para o outro; a estultice é sombra e mutismo, um galpão deserto, escuro, sem ninguém e sem utilidade. (mais…)

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Espectro. Por Julio Pompeu

No Terapia Política

À noite, o vazio de gente deixa os amplos espaços do Congresso com ar sinistro. Os estalos dos móveis, estruturas e outros barulhos ecoam amedrontando aos que não estão acostumados com a grandeza barulhenta daquele vazio. Mas pancadas vigorosas, diferentes dos barulhos normais, gelaram de medo os seguranças naquela madrugada. Três novas batidas ecoaram pelos vãos da moderna arquitetura. Os guardas se entreolharam. (mais…)

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Um catador de espinhas: Ailton Krenak na ABL. Por José Ribamar Bessa Freire

No TaquiPraTi

“Só aceitei aprender a ler e escrever, porque encarei a alfabetização como
se fosse um peixe com espinhas. Tirei as espinhas e escolhi o que queria”.
(Ailton Krenak. 2003)

Ele escolheu o que queria. Por isso, Ailton Krenak foi o primeiro escritor indígena eleito para a Academia Brasileira de Letras (ABL). Soube tirar as espinhas, o que não é tarefa fácil dependendo do tipo de peixe. Traíra e pacu têm muita espinha. Em geral, quem cata para os filhos pequenos são as mães, que os ensinam como fazer. (mais…)

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A desmemória. Uma crônica de Galeano

Um registro do escritor uruguaio sobre o “esquecimento” das origens e do significado do 1º de Maio nos Estados Unidos

RBA

Chicago está cheia de fábricas. Existem fábricas até no centro da cidade, ao redor de um dos edifícios mais altos do mundo. Chicago está cheia de fábricas, Chicago está cheia de operários.

Ao chegar ao bairro de Heymarket, peço aos meus amigos que me mostrem o lugar onde foram enforcados, em 1886, aqueles operários que o mundo inteiro saúda a cada primeiro de maio. (mais…)

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X da questão. Por Julio Pompeu

No Terapia Política

As coisas são como parecem ser. Não há nada por detrás das aparências. Nenhuma essência. Nenhuma verdade. O sentido está nos olhos de quem vê e não nas coisas vistas. As coisas são só coisas, nada mais. Esta é a filosofia de Edinho desde a faculdade. Ouviu coisas assim em uma aula do Curso de Comunicação. Foi libertador para ele. Sempre achou que estudava para iludir com propagandas. Que a essência da publicidade era a mentira. Sentia-se mal com isso. Mas sem sentido, essência ou verdade, também não há mentira. Há só a mensagem, o que ela aparenta e a grana que se ganha com isso. (mais…)

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Cordialidade. Por Julio Pompeu

No Terapia Política

Comprando um lanche naqueles lugares em que todos os sanduíches tem o mesmo gosto, a moça do caixa me cumprimenta sorrindo. Conheço bem aquele sorriso de merda. É igual ao meu. Sorriso de simpatia fingida. Bem fingida, mas que, ainda assim, não esconde o fingimento. Ela não queria estar ali. Não quer que eu tenha um bom dia. Não queria que eu estivesse ali. Não queria ninguém ali. Eu também não queria estar ali, comendo aquela porcaria, mas é o que dá para comer. A gente vive assim, fazendo o que dá. E sorrindo, pra fingir que é feliz. (mais…)

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O asilado. Por Julio Pompeu

No Terapia Política

Tudo passa. Tudo que o tempo fez, o tempo desfaz. Não há mal que sempre dure. Depois da tempestade, vem sempre a bonança. Todas estas frases de consolo escoavam pelas caraminholas da cabeça de Jair. Quando não vinha de suas memórias, aparecia na boca de amigos que tentavam dar-lhe conselhos neste momento difícil. Tudo em vão. Sabiam que Jair só ouvia os próprios conselhos e, mesmo assim, não os seguia quando apontavam para a necessidade de aceitar seus erros, de encarar a realidade. A única realidade que importava para Jair era a de seus sentimentos e, agora, ele sentia medo, muito medo. (mais…)

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