Ministério da Saúde viola princípio da descentralização e retira autonomia da Sesai

Por Renato Santana, do Cimi

A autonomia e a descentralização da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) às unidades gestoras na condução do Subsistema de Saúde Indígena foram derrubadas pelo ministro da Saúde, Ricardo Barros. Sem consultar os povos indígenas, o ministro revogou a Portaria nº 475, publicada em 17 de março de 2011, que delegava competência exclusiva à Sesai na gestão orçamentária e financeira, garantindo ao órgão estatal autorização para compartilhar com os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) a decisão sobre a aplicação dos recursos.

O ministro baixou a decisão com a Portaria nº 1.907, publicada nesta terça-feira, dia 18, no Diário Oficial da União. Na prática, as coordenações dos 34 DSEI’s, criados a partir da Lei Arouca (1999), não poderão mais ordenar despesas, fazer contratos e licitações. Como os DSEI’s atuam diretamente nas terras indígenas, os povos estarão submetidos a decisões centralizadas em Brasília sobre demandas diferenciadas e específicas. Se o coordenador local precisar comprar combustível para buscar um indígena em uma aldeia, seja de barco, avião ou carro, terá de pedir para o ministro e aguardar a resposta.

“É o primeiro movimento para acabar com a autonomia do DSEI. Será tudo centralizado e com controle político. Um verdadeiro absurdo, nem na época da Funasa (a Fundação Nacional de Saúde, extinta em 2010) era assim”, diz o indígena Paulino Montejo, assessor da Articulação Nacional dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). A Portaria 1.907, para Montejo, afeta outra portaria, a 33/2013, que fica sem base legal. “É o golpe chegando na Sesai, não há outra interpretação possível”, conclui.

A Portaria 33, publicada em 22 de maio de 2013, regulamenta as competências de gestão financeira e orçamentária delegadas pela Sesai aos coordenadores dos DSEI’s – observando as atribuições da Portaria nº 475/2011. Entre outras competências atribuídas, estão a de ordenar a realização de despesas, conceder suprimento de fundos, requisitar transportes e emitir notas. A descentralização visa atender de forma eficaz a política pública, observando as necessidades diferenciadas do atendimento a cada povo.

“O Ministério da Saúde passa a desrespeitar o princípio da descentralização, um dos requisitos do Subsistema de Saúde Indígena. A centralização causará ainda mais atrasos na execução da atenção à saúde indígena”, pontua o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto. Para o missionário, a concentração em Brasília de despachos, ordens de serviços e destinação de recursos acabará ainda com o controle social dos povos indígenas.

Todo DSEI é fiscalizado por um Conselho Distrital de Saúde Indígena, composto por lideranças das aldeias, governo, organizações indígenas, indigenistas e da sociedade civil. A partir do momento em que as execuções orçamentárias forem retiradas do DSEI, estes conselhos perderão a finalidade. Por outro lado, os gastos com as reuniões dos conselheiros terão de passar pelo crivo da burocracia na Capital Federal. Custos que envolvem longos deslocamentos e amiúde não entendidos pela burocracia palaciana como viáveis.

Outros ministérios também passaram a ter gestões centralizadas, o que indica uma orientação do governo de Michel Temer, como o Ministério da Justiça. “No caso dos povos indígenas afeta diretamente um requisito (a descentralização) fundamental para a execução do atendimento diferenciado de saúde. Essa portaria aumenta a vulnerabilidade dos povos indígenas, além de retirar o controle social e aumentar a possibilidade de corrupção, desvios”, diz Buzatto.

Para lideranças indígenas e indigenistas, a medida vem na esteira da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, a PEC da Morte, que congela os gastos do governo por 20 anos. “A aprovação definitiva da PEC 241, que já foi aprovada em primeiro turno, implicará no orçamento de 2017 uma redução de R$ 430 milhões nas políticas públicas que atendem a agricultura familiar, a reforma agrária, os povos indígenas, os quilombolas e as comunidades tradicionais, diretamente nos serviços essenciais de saúde e educação e de direitos humanos em geral”, disse em nota a Apib.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Íris Morais Araújo.

Criança Munduruku. Foto de Rachel Gepp (Nov/2014).

Comments (7)

  1. É preocupante isto se vier há acontecer com a saúde indígena,tanto pela perda de excelentes profissionais que passam 20 dias direto trabalhando/morando dentro da aldeia ( muitas vezes sem ter um lugar para vc descansar),com a perda destes profissionais como a retirada de todos os serviços que eram fornecidos pelo profissional para os pacientes indígenas ,dentro da aldeia…

  2. A ong, é cabide de emprego. Enquanto uma pedagoga ganha 1,500 para ensinar 40 horas, na ong ganha 7.000, um biólogo tbm, pasmem!! Sem concurso. Conheço uma pessoa que fala que estava sentada,assistindo tv, de repente o cel toca, alguém perguntando se ela queria ganhar 7.000, outros que trabalham nessa tal ong, dizem não suportar índios, até o chamam de fedorentos, acho que o erro está nesse tipo de contrato. E o povo o indígena está desamparado. Eu como índia wai wai sei o que já vi desses pessoal, tem que acabar com esse contrato, o direito da saúde eh de todos, brancos,negros,indios.somos todos iguais.

  3. Conversa fiada. Na última conferência da Saúde Indígena, em Guajará-Mirim, RO, já de sabia que a saúde indígena, infelizmente, iria passar para o município. Não venham com essa golpe. Golpe é o descaso que a SESAI dispensa para os indígenas.

  4. A SESAI TRANSFORMOU-SE NUM CABIDE DE CARGOS COMISSIONADOS, EM ABUSO DO USO DE DIÁRIAS DE VIAGENS FICTÍCIAS, USO POLÍTICO E GASTOS ASTRONÔMICOS, FARRA COM O DINHEIRO PÚBLICO.

  5. Onde tem mais pobre pra gente cortar? Assim pensa a direita no poder. Ou povos indigenas começam um movimento em masa rumo a Brasilia ou nada sera revertido…

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