STF analisa proibir amianto há 12 anos, mas é indústria que vai eliminá-lo?

Por Maria Júlia Marques, do UOL

O uso do amianto no Brasil é combatido há tempos, mas a discussão pode terminar em breve. O ponto final que decidirá que o material cancerígeno deixará de ser usado não deve partir do legislativo ou judiciário, e sim, das empresas, que estão migrando para outras fibras. Por fazer mal à saúde, o mercado do amianto é duramente criticado, o que faz com que empresas adotem alternativas saudáveis para se manter operantes, como uma mistura de fibras sintéticas e celulose.

“Desde o início dos anos 2000, mais ou menos, há uma migração da indústria. Existe cobrança de ambientalistas, da comunidade, de alguns órgãos públicos, leis estaduais e municipais, as opções vão se esgotando e cada vez mais os fabricantes de amianto são direcionados a substituí-lo”, diz Roberto Luiz Hecksher Correa Netto, presidente da Abifibro (Associação Brasileira das Indústrias e Distribuidores de Produtos de Fibrocimento). “A tendência é que cada vez mais empresas deixem o mineral”.

Enquanto a mudança acontece nas indústrias, a discussão no STF (Supremo Tribunal Federal) engatinha e tentativas para alterar a lei federal são arquivadas ou rejeitadas. 

Isso porque a lei federal, de 1995, permite a extração, produção, industrialização, utilização e comercialização de um tipo de amianto. Mas algumas leis estaduais e municipais proíbem totalmente seu uso — e são contestadas no Supremo há anos. A lei nacional hoje libera um tipo específico de amianto chamado crisotila, chamado de amianto branco, apesar de a OMS (Organização Mundial da Saúde) indicar todos como cancerígenos.

No dia 23 de novembro, o julgamento de leis da cidade de São Paulo, e dos Estados de São Paulo, Pernambuco e Rio Grande do Sul iniciou, mas foi logo interrompido. Apenas o ministro Edson Fachin proferiu voto e foi a favor de manter as leis estaduais. Em seguida, o ministro Dias Toffoli pediu vista. Não há previsão para o processo retornar à pauta da Corte.

Para se ter uma ideia como o processo anda devagar, a ação contra lei do Rio Grande do Sul está sendo discutida pelo órgão desde 2004. A do Estado de São Paulo desde 2007.

É demais não votarem algo que o próprio mercado vem resolvendo, que faz mal. Se continuarem tão devagar vamos demorar mais 12 anos para decidir? É frustrante”. (Fernanda Giannasi, presidente da Rede Ban Asbestos, grupo que defende o fim do uso amianto mundialmente)

A presidente do Instituto Brasileiro do Crisotila, Marina Júlia de Aquino, defende o produto. “O mineral é durável, eficaz e barato. Se manuseado corretamente, não traz riscos. As empresas sedem à pressão e abandonam o amianto, mas não é necessário.”

Guerra também no legislativo

Além das buscas no judiciário também existiram tentativas de barrar o amianto no legislativo para mudar a lei federal. Projetos de lei no Senado, dos anos de 2009 e 2011, visaram alterar a lei e proibir a extração, importação, transporte, armazenamento e industrialização do amianto, mas ambos foram arquivados.

“A exposição mínima prejudica a saúde. É claro que a lei federal não pensa na saúde do trabalhador, precisamos deixar a saúde em primeiro lugar, e não o interesse econômico”, diz João Gabriel Lopes, advogado da Abrea (Associação Brasileira de Expostos ao Amianto).

O amianto, também chamado de asbesto, é o mineral usado como matéria-prima em produtos como telhas, forros, pastilhas de freios e caixas d’água.

A substância é utilizada pela indústria brasileira por ser abundante e de baixo custo. O país está entre os maiores produtores, consumidores e exportadores mundiais.

O que preocupa as autoridades é que a exposição ao amianto faz mal à saúde. O mineral é feito de fibras e gera um pó que pode ser facilmente inalado ou engolido.

De acordo com o Inca (Instituto Nacional de Câncer), a ingestão de amianto se relaciona com doenças como câncer de pulmão, laringe, trato digestivo e ovário. A OMS estima que mais de 107 mil trabalhadores morrem por ano pelas doenças relacionadas ao material.

“O amianto realmente faz mal. Todo tipo de asbesto, quando inalado, é considerado cancerígeno pela Agência Internacional de Pesquisas sobre o Câncer. O risco que o material traz é maior que seus benefícios para população, se podemos substituir o amianto, devíamos”. (Daniel Junqueira Dorta, professor de toxicologia da USP)

O IBC afirma que, se extraído, manipulado e usado de forma correta, o amianto não é nocivo à saúde. “Sabemos que a fibra não pode ser aspirada, as empresas trabalham para garantir a segurança do trabalhador”, afirma Aquino. “Muito foi investido para melhorar o ambiente de trabalho. A lei fixa um limite de duas fibras/cm³ nas empresas e hoje todas trabalham com 0,1 fibra/cm³”.

Comments (1)

  1. É preocupante que a matéria termine com a fala da representante do IBC, o instituto lobbysta do amianto, financiado pela gigante do mercado ETERNIT, sem ter um contraponto para dizer que a OMS afirma ser o amianto um reconhecido cancerígeno para os seres humanos e não haver nenhum limite seguro abaixo do qual não haja riscos à saúde. Portanto, a afirmação apresentada pelo IBC na última sentença do artigo sobre uma pseudo segurança no ambiente de trabalho referente a uma quantidade “ínfima” de fibras no ar é uma FALSA DISCUSSÃO.

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