Campanha completa 5 anos de luta permanente contra os agrotóxicos e pela vida

Lançada em 2011, a denúncia dos impactos severos que os venenos causam na saúde humana e no meio ambiente é a bandeira central da Campanha

Por Iris Pacheco, da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida 

Neste dia 07 de abril de 2016, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida completa 05 anos de luta e resistência contra uma das principais expressões do modelo agrário capitalista no país, o agronegócio.

O objetivo da campanha é denunciar o modelo que domina a agricultura brasileira por meio de sua principal contradição: os agrotóxicos. Assim, resultado de muitas iniciativas e articulações entre diversas organizações que desde 2010 vinham construindo uma rede em torno dessa perspectiva de luta unitária, a Campanha foi lançada em 2011 denunciando os impactos severos que os venenos causam na saúde humana e no meio ambiente.

Ao mesmo tempo em que a Campanha busca explicitar as contradições e malefícios gerados pelo agronegócio, ela também vem trazer um anúncio. Por isso traz em seu nome a Vida, colocando a agroecologia como paradigma necessário para construção de outro modelo de agricultura.

De acordo Nivia Silva, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), neste período a luta contra agrotóxicos se tornou uma tarefa fundamental para os movimentos e organizações populares, pois “para o agronegócio os agrotóxicos são uma espécie de “calcanhar de Aquiles”: eles expressam uma das principais contradições deste modelo.”

Ainda que o problema dos agrotóxicos seja denunciado desde a década de 1960, é neste período recente que ele tem ficado mais evidente. Desde 2008, o Brasil assumiu o posto de maior consumidor de agrotóxicos do mundo e a Anvisa passou a publicar os dados de contaminação de alimentos por estes venenos. Estimativas fornecidas pela própria indústria de venenos indicava 5,2 litros cada pessoa por ano, em 2008. Hoje, ela subiu para 7,2 litros.

“O uso de agrotóxicos é uma contradição do agronegócio porque, por um lado, não se consegue produzir monocultivos sem eles, mas seus efeitos na saúde e no meio ambiente são cada dia mais gritantes e difíceis de serem encobertos. Durante toda a sua cadeia, os agrotóxicos deixam um rastro de morte e doenças”, ressalta Nivia.

A Campanha nasce em um contexto de avanço do capitalismo no campo, simbolizado pelo agronegócio, e os problemas estruturantes, tanto para campo como para a cidade, ocasionados por este modelo, se acentuam. As corporações transnacionais controlam a produção de mercadorias agrícolas (commodities), o comércio e os preços dos produtos. Bem como, a maioria das fábricas de agrotóxicos, fertilizantes sintéticos, sementes, as mudas e matrizes animais, máquinas e equipamentos. E se apropriam dos recursos naturais e da biodiversidade brasileira.

Uma iniciativa em defesa da vida

No ano de 2011, o dia 07 de abril foi escolhido para o lançamento da Campanha em vários estados, por ser o dia mundial da saúde, e assim a relação entre agrotóxicos e saúde, ficaria marcada nessa data simbólica.

Outra data que é uma das principais referências para Campanha, é o 03 de dezembro, Dia Mundial de Luta contra Agrotóxicos. Todos os anos os comitês da Campanha nos estados, composta pelas organizações e movimentos populares, realizam diversas atividades denunciando os agrotóxicos.

Atualmente, mais de 100 organizações compõem esta rede de luta contra os agrotóxicos, entre elas a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), que entrou no processo por meio do seu Grupo de Trabalho Agrotóxico e Transgênico.

Irene Maria Cardoso, presidente da ABA e professora da Universidade Federal de Viçosa, afirma que é possível estabelecer um outro projeto sustentável para o campo brasileiro sem o uso de agrotóxicos e cita que vários estudos de cientistas do mundo inteiro mostram que é possível produzir alimentos para sustentar o mundo utilizando os princípios da agroecologia.

“Estes mesmos estudos apontam que para tal, são necessárias políticas públicas que apoiem a agroecologia. Precisa-se tomar medidas sobre como empoderar as mulheres, construir uma assistência técnica e extensão rural horizontalizadas, com reconhecimento e valorização do conhecimento dos agricultores/as e comunidades tradicionais; realizar a reforma agrária, para que mais pessoas se engajem na produção de alimentos”, salienta Cardoso.

Recentemente, um assunto que tem impacto direto na saúde humana e que a Campanha vê a necessidade de fazer a crítica ao uso de agrotóxicos, como principal estratégia de controle adotada pelos governos, é o contexto nacional de epidemia das doenças transmitidas pelo mosquito Aedes Aegypti.

Desde 1968, que o uso de agrotóxicos no combate a vetores de doenças é feito no Brasil, sem mostrar resultados na diminuição dos mosquitos, nem das doenças, que a cada dia aumentam e se tornam mais letais:

“Os agrotóxicos utilizados nas campanhas de saúde pública são os mesmos contra os quais lutamos na agricultura, e são fabricados pelas mesmas empresas. Ou seja, há motivos para se preocupar com a exposição da população aos venenos, como o Malathion, Fenitrothion ou Pyriproxyfen”, alerta Nivia.

Todos eles causam perigosos danos à saúde, sobretudo num contexto de exposição contínua por muitos anos. É comprovado que os mosquitos adquirem sistematicamente resistência aos venenos, o que leva ao aumento da dose ou à introdução de novos venenos.

A Campanha no atual cenário político brasileiro

Segundo Nivia, no âmbito político, o ano de 2015 foi difícil para a luta contra os agrotóxicos. “Mesmo com a realização de ações que ampliaram esta pauta no conjunto da sociedade e denunciaram a questão dos transgênicos, o papel da bancada ruralista e das empresas que tentam fragilizar a ação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA ), além de realizar mudança no marco legal dos agrotóxicos, foram grandes implicadores do processo.”

Porém, nesse cenário houve avanços na luta pelo campo da ciência. Os lançamentos e debates sobre o Dossiê sobre Agrotóxicos da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) e as audiências públicas que evidenciaram uma luta de posições no campo político, fortaleceram as correlações de forças.

“As ações dos comitês estaduais também foram fundamentais no diálogo direto com a sociedade, com a realização de feiras, debates, aulas públicas, etc. No campo legislativo, a luta se deu pela ampliação nos Fóruns Estaduais de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e iniciativas parlamentares nos níveis estadual e municipal”, cita Nivia.

Algumas iniciativas que expuseram o tema na mídia, como o programa Profissão Repórter, que teve claro posicionamento contra os agrotóxicos e ainda expôs pseudo-cientistas vendidos à indústria de agrotóxicos. O documento divulgado pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA), em abril de 2015, teve enorme repercussão e trouxe elementos da associação dos agrotóxicos ao câncer.

Neste ano de 2016, o país se encontra em uma crise política e econômica mais acirrada. O povo tem lidado diariamente com a permanente ameaça de direitos, com a ação conservadora da direita e com o risco de golpe político.

Nivia avalia que é um ambiente favorável para a continuidade e acirramento das derrotas em relação a pauta dos agrotóxicos:

“Podemos usar como exemplo, o não lançamento do Pronara; a ameaça da PL3200 ou Lei dos Defensivos Agrícolas, que tem como objetivo substituir a atual Lei de Agrotóxicos (7802/1989), e altera completamente o sistema normativo de agrotóxicos no país”, afirma.

Recentemente, no dia 22 de março, houve a aprovação na Comissão do Parlamento do Mercosul (Parlasul), do PLS 680/2015, que busca alterar o termo agrotóxico por “produto fitossanitário”. Felizmente, o senador Álvaro Dias (PV-PR) voltou atrás e retirou o projeto, por pressão de ambientalistas e movimentos populares.

Situações como essas reforçam a necessidade de cada vez mais ampliar a luta contra os agrotóxicos. Irene coloca que é preciso anunciar o potencial da agroecologia para a produção de alimentos de qualidade:

“É preciso ampliar as parcerias, envolver mais setores organizados do campo e da cidade na Campanha contra os Agrotóxicos. Busquemos formas de aproximar os produtores de alimentos com qualidade daqueles que querem consumir tais alimentos.”

Além disso, a Campanha segue afirmando suas principais bandeiras contra o modelo da morte. Entre elas, está a proibição da prática criminosa da pulverização aérea, a exemplo do que ocorre na União Europeia; o banimento de agrotóxicos já banidos em outros países do mundo; o fim das vergonhosas isenções de impostos dadas aos agrotóxicos; a criação de zonas livres de agrotóxicos e transgênicos, para o livre desenvolvimento da agroecologia e o maior controle para evitar a contaminação da água por agrotóxicos.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

2 × quatro =