Estão roubando o pouco que conquistamos [OPINIÃO]

Esta matéria de Cleber Araújo Santos é a terceira de uma série de matérias de opinião sobre o impeachment por comunicadores populares que estamos publicando aqui no RioOnWatch

Cleber Araújo Santos, de 40 anos, foi nascido em Monte Pascoal na Bahia. Hoje, como morador do Complexo do Alemão, através das redes sociais mostra a favela em suas mais diversas formas e momentos. Atualmente, divulga fatos diários na Página Complexo Alemão e no perfil da Mariluce Mariá, artista plástica que pinta e tem um stand de vendas na estação Palmeiras, local esse que recebem pessoas do mundo inteiro e lhes possibilita ampliar os contatos e mostrar a sua realidade.

Sou morador de Favela, vivo no Complexo do Alemão e sinto na pele o que é viver na periferia. Um ambiente hostil e com muitas dificuldades, marcado pela exclusão e indiferença social de uma cidade partida e totalmente excludente.

O Rio de Janeiro tem duas realidades visíveis ao olho nu, as Favelas e o “Asfalto”, a Zona Rica e a Zona Pobre. A impressão que se dá é que isso é super natural, e foi justamente a possibilidade disso ser mudado que deve ter incomodado. Com isso foi estudado uma forma de mudar o quadro.

O plano parecia ser bom, feito dentro desse atual governo, pensando em auxiliar os pobres que aqui vivem. Pensaram em fornecer habitações novas, em “pacificar” os locais onde o domínio total era das forças paralelas, urbanizar os espaços, trazendo cultura e ações sociais que chegamos até a pensar que seriam sérias mesmo. Tudo seria concreto e verdadeiro, mas o governo, tanto local quanto do estado do Rio de Janeiro, sedentos de alianças com empreiteiras e fome de corrupção, pois tudo perder, o sonho de milhares de pessoas foram ladeira abaixo literalmente.

Obras ficaram pelo meio do caminho, milhões foram desviados e projetos importantes não foram concluídos, como por exemplo as casas que foram indenizadas a preços faraônicos que não saíram do lugar, as ruas que deveriam ter sido urbanizadas que nunca saíram do papel, os espaços que receberiam praças de lazer, quadras poliesportivas que nunca chegaram aqui, sem falar que na parte da educação, só uma única escola foi feita às pressas e ainda ficou fora da favela (Escola Estadual Tim Lopes). Tudo isso estava no escopo do PAC 1 do governo federal mas com execução do governo estadual, com a promessa de ter continuidade com uma segunda etapa do PAC 2. Resumo dessa salada de corrupções: não concluíram o PAC 1 e nunca se iniciou o PAC 2, e todos nós ficamos privados de ter um pouco do sonho realizado, ver a nossa favela mudar para o melhor.

Agora o mais assustador de todo esse enredo, está sendo a arte da segurança, pois até o presente momento é a única parte destes investimentos presente aqui, apesar de ter sido a mais alardeada e mais falha.

A promessa inicial seria a entrada das tais forças de segurança. Faria um rescaldo, avaliaria o terreno, traria acima de tudo “paz” para os moradores e como consequência disso viria em seguida os demais serviços públicos pelos quais somos carentes aqui, mas pelos quais até hoje estamos esperando e nada. As falhas se acentuaram e cada dia mais aumenta a insegurança local, pois a única presença do Estado aqui é o braço armado, o bico do fuzil. Muito triste que querem mediar um conflito somente com o fuzil, só se vê os militares presentes e perdidos no território, sem nenhum apoio das demais secretarias adjuntas ao processo da tal “pacificação”.

Mediante tudo isso, o país entra em uma grande crise política, que se iniciou na não fiscalização da distribuição dessas verbas para essas obras e por conta disso iniciou-se um cataclisma generalizado e como forma de desviar as atenções dos desvios micros nos estados, começou uma grande farsa de que o Brasil inteiro mergulhou numa crise financeira, mas na verdade foi uma grande crise moral e política.

Como sempre a corda estoura no lado mais fraco e nós estamos à mercê dos interesses escusos e partidários de uma disputa de poder e egos assistido em rede nacional. Eles pensam no coeficiente partidário, nas suas famílias, nos interesses pessoais, nos futuros cargos a serem ocupados, menos em nós. Uma lástima viver assim, não temos nenhum valor para a classe política brasileira e isso ficou provado no dia da votação transmitida ao vivo para todo mundo.

O ponto de vista que observo é um parlamento perdido em si mesmo, legisladores obsoletos e anacrônicos, dispostos a subtrair a qualquer custo aquilo que é nosso. Tiram a nossa esperança e mergulham em nefastas ideologias que nada servem a totalidade dos brasileiros. Vivem com as benesses de um poder que eles não sabem administrar. Com isso estão roubando o pouco que conquistamos.

Tudo que temos acompanhado e visto tanto na “grande mídia convencional” e por tantos outros veículos de comunicação alternativa, nos dá a plena certeza que tudo não passa de um grande golpe para retirar um governo popular que ajudou aos pobres. Daí os golpistas tomam as rédeas e voltam a fazer o que já fazem há mais de 500 anos governando esse país: tratar os pobres como escravos que têm apenas o direito de servi-los. Eles se incomodam de ler um texto de um favelado–como esse–de ter pobres escrevendo livros, viajando no mesmo avião, coisas desse tipo, e é perceptível uma grande manipulação generalizada por veículos tradicionais de comunicação apoiando a tudo isso. E muitos até patrocinando.

Somos Favelados e temos a plena certeza que logo no início o combinado era melhorias nas favelas, era um novo momento. Mas estão roubando o pouco que conquistamos, desvirtuando e invertendo e desviando milhões que seriam para serem aplicados aqui…. Nós chegamos a acreditar que tudo iria mudar.

Faço um apelo aos que conquistaram um pouco de autonomia e voz. Lute em favor da democracia e de tudo que é nosso.

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