No Cimi
Além das demarcações de terras tradicionais, os povos indígenas do país lutam para o reconhecimento de um outro direito essencial: a Educação Escolar Indígena Diferenciada. Os povos do Maranhão protocolaram o segundo abaixo-assinado listando as principais reivindicações para a área junto à Secretaria Estadual de Educação (Seduc). O primeiro, de 18 de julho deste ano, não obteve quaisquer respostas; o segundo, cobrando o primeiro e ressaltando a demanda, foi entregue dia 24 de julho. Até o momento não foram chamados para tratar do disposto nos documentos. Os povos indígenas afirmam que caso não obtenham respostas efetivas do governo realizarão manifestações no estado.
Os documentos foram entregues também ao Ministério Público Federal (MPF), que possui uma comissão de caráter nacional apenas para tratar da Educação Escolar Indígena Diferenciada. As demandas expostas dão conta também dos quilombos, além das aldeias dos povos Krepym Kateje, Gavião, Krikati, Tenetehar/Guajajara, Gamela e Tremembé. A Resolução 05/2012 do Conselho Nacional de Educação/Câmara de Educação Básica, órgão do Ministério da Educação, diz que a responsabilidade pela oferta da Educação Escolar Indígena é dos estados, podendo ser oferecida pelos municípios por regime de colaboração e com a anuência dos povos indígenas.
No primeiro abaixo-assinado a desassistência é tamanha que o povo Tremembé, que deveria retomar o calendário letivo neste dia 1º de agosto, decidiu suspender as aulas até que o governo do Maranhão atenda as necessidades de funcionamento das escolas. São centenas de estudantes prejudicados. Na Terra Indígena Pindaré, do povo Tenetehar/Guajajara, os problemas se concentram na infraestrutura, além da ausência de materiais didáticos, alimentação, sobretudo garantindo os contratos de fornecimento de merenda e a contratação de merendeiras indígenas, recursos humanos (contratações e pagamento aos professores, que estão sem receber salários, em alguns casos, desde 2013) e falta de transporte escolar. Alguns povos não têm condições de retomar o calendário letivo a partir deste mês, gerando defasagem e distúrbios pedagógicos.
Toda a cadeia de educação nas aldeias está precarizada, conforme os documentos entregues à Seduc e ao MPF. No caso da Educação de Jovens e Adultos (EJA) não existem professores suficientes para atender a modalidade. Estes alunos, então, são encaminhados ao Ensino Médio gerando distúrbios pedagógicos e aumentando a carga horária dos professores e professoras. Vagas específicas para profissionais indígenas é outra reivindicação, tanto para a parte administrativa quanto para a pedagógica. O que vale também para o transporte escolar, hoje amiúde ofertado pelos municípios com ônibus precários e que não permanecem nas aldeias.
De acordo com os documentos, a Seduc inclusive tem se negado a oferecer informações aos indígenas. A secretaria tem tomado decisões sem consultar os povos. “O direito à consulta está garantido pela Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho). Existe também a Lei nº 8.159/91 que todos têm direito de receber os órgãos públicos de interesse particular ou de interesse coletivo”, diz trecho do abaixo-assinado protocolado no último dia 18 de julho.
Em nota, governo fala em ‘diálogo’
Durante encontro da Teia, entre os dias 22 e 24 de julho, movimento que congrega povos indígenas, quilombolas, camponeses e comunidades tradicionais, os povos indígenas divulgaram uma carta/abaixo-assinado, a segunda a ser protocolada, endereçada ao governo estadual ressaltando reivindicações e desfazendo críticas da Seduc aos povos. Em nota, o governo do Maranhão diz que está em diálogo com os povos indígenas. No entanto, afirmam as lideranças indígenas, as conversas são feitas com um grupo organizado pelo próprio governo e que não passa por nenhuma instância de decisão dos povos.
O resultado do diálogo alegado pelo governo, segundo as lideranças indígenas, joga a responsabilidade às aldeias. “Repudiamos a afirmação do governo do estado de que há inconsistências entre os números de alunos informados pelas nossas lideranças e o censo escolar, e nós jamais impedimos nenhuma equipe de educação de desenvolver suas atividades nas nossas aldeias (…) sempre buscamos diálogos e transparência, sem sucesso”, diz trecho da nota pública.
Leia na íntegra:
Carta ao Governo do Estado do Maranhão
Nós, Povos indígenas Krepym Kateje, Krenyê, Gavião, Krikati, Guajajara, Gamela, Tremenbé, Moquibom reunidos no Encontro da Teia Indígena, na Créh Geralda Toco Preto, território Krepym Kateje, nos dias 22, 23 a 24 de julho de 2016, vimos a público:
1- Repudiar a posição do governo do estado do maranhão referente a luta do Povo Krepym Katejepelo Direito a Educação, Escolas Indígenas de qualidade dentro das nossas aldeias suprindo todas as necessidade de uma educação eficaz, não somos criminoso. A ação do povo foi e é lutar por Direito e não praticar crime. Esclarecemos ao governo do estado e outros órgãos públicos, o ato de convidar três pessoas da educação a ficar conosco foi porque nós estamos totalmente desassistidos e apesar de nossas cobranças quase nada foi feito nos governos anteriores e no governo atual, não temos escolas de qualidade… nossas cobranças estão amparadas na Constituição Federal;
2- Repudiamos a afirmação do governo do estado de que há inconsistências entre os números de alunos informados pelas nossas lideranças e o censo escolar, e nós jamais impedimos nenhuma equipe de educação de desenvolver suas atividades nas nossas aldeias, que sempre buscamos diálogos e transparência, sem sucesso. Nós Krepym nunca tivemos a oportunidade de dialogar com governador atual nem os dos governos anteriores;
3- Esclarecemos que no Brasil e no Maranhão, onde pagamos muitos impostos… as melhorias são mínimas no geral. Precisamos que governador fale com todos os povos. Por que o governo não fala com todos os Povos?
Denunciamos que os direitos do Povo Krepym Kateje continuam sendo violados pelo governo anterior e atual, neste território as escolas continuam sucateadas e nas escolas nossas atendem até o quarto ano sem oferecer condições digna aos alunos, sem professor bilingue nem auxílio; não recebem salários porque estado fechou nossas vagas de bilíngue. Precisamos de escolas de qualidade, merenda de qualidade. Foi preciso o povo se levantar e gritar: educação de qualidade é um direito e um dever de todos receber!
Teia
24 de julho de 2016