Rocinha Sem Fronteiras demanda obras de saneamento urgentes

Jody van Mastrigt e Meg Healy – RioOnWatch

Três anos depois das autoridades terem anunciado que a Rocinha, na Zona Sul, seria a terceira favela no Rio a receber um teleférico como sistema de transporte, na segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2), ativistas comunitários continuam a exigir que os fundos para o projeto sejam redirecionados para prioridades mais urgentes. O grupo Rocinha Sem Fronteiras se opôs ativamente à instalação do teleférico desde que os planos foram anunciados em 2013, alegando que os R$152,2 milhões destinados para o teleférico deveriam ser usados para melhorias na infraestrutura de saneamento que estão sendo aguardadas há muito tempo.

Fundada há dez anos, com a finalidade de engajar moradores em diálogos frequentes sobre questões pontuais, Rocinha Sem Fronteiras tem tido um papel central em várias iniciativas de base comunitária. De acordo com a cofundadora Simone Rodrigues, a missão da organização é discutir os direitos civis e os desafios enfrentados pelos moradores da Rocinha, mas o que a difere de outras iniciativas na comunidade é a ênfase na participação pública. “Este é um coletivo –pessoas vêm aqui para aprender e ensinar. Estamos tentando construir e mobilizar juntos”, explica ela.

O cofundador José Martins de Oliveira diz: “O objetivo do grupo é se reunir uma vez por mês para discutir questões urgentes que afetam a comunidade. Além disso, o grupo também espera propagar a conscientização dos direitos civis dos moradores da Rocinha”.

Reuniões mensais apresentam palestrantes convidados que vão de defensores públicos a engenheiros de saneamento e jornalistas comunitários. Os participantes –geralmente, representantes de organizações comunitárias, tais como o Museu Sankofa de História e Memória, a TV Tagarela, o jornal comunitário Jornal Fala Roça, o site de notícias comunitárias Viva Rocinha e a Associação de Moradores da Vila Laboriaux– discutem um tema diferente a cada mês, que vão desde o papel das mídias comunitárias à política de investimentos em saneamento público.

A campanha principal da organização diz respeito aos projetos do PAC 2, que incluem a instalação de um sistema de teleférico e uma série de melhorias de saneamento. Enquanto a maior parte do orçamento do projeto, no valor de R$457 milhões, esteja previsto para financiar o alargamento de ruas, instalação de sistemas de águas pluviais e para o desenvolvimento de sistemas de esgoto, Rocinha Sem Fronteiras afirma que essas intervenções por si só não irão resolver o estado desesperador do saneamento na comunidade, onde o esgoto bruto cai livremente em 23 locais da favela.

“O projeto PAC 2 inclui saneamento e a construção de um teleférico na Rocinha. Nós [Rocinha Sem Fronteiras] somos completamente contra a implementação do teleférico e acreditamos que os R$152,2 milhões destinados à construção do teleférico devem ser redirecionados para a solução dos problemas de saneamento na Rocinha”, disse José Martins.

A densidade da Rocinha produz ventilação limitada que, combinada com a insuficiência na coleta de lixo e infraestrutura de esgoto formal, estabelecem um terreno fértil para doenças infecciosas. Durante décadas, a Rocinha sofreu com as maiores taxas de tuberculose no Brasil –com uma taxa nacional de infecção de 37,2 casos por 100.000 pessoas, e uma taxa na Rocinha de 380 casos por 100.000 pessoas. Os casos de tuberculose diminuíram substancialmente após as obras financiadas pelo PAC de expansão da Rua 4, que era o corredor mais crítico. No entanto, melhorias no saneamento continuam sendo desesperadamente necessárias.

“Levamos o estado ao tribunal e a comunidade espera que o juiz determine que eles terminem os trabalhos propostos”, disse José Martins de Oliveira. “Não é nada mais do que a obrigação do governo canalizar o esgoto”.

No entanto, ativistas alegam que o teleférico previsto seria apenas um elefante branco atraindo turistas, ao passo que necessidades básicas dos moradores não são atendidas. As experiências do Complexo do Alemão e da Providência, as duas primeiras favelas a receber sistemas de teleférico, só reforçam essa posição. Os membros da Rocinha Sem Fronteiras costumam ressaltar que o teleférico no Complexo do Alemão tornou-se um destino turístico popular, enquanto só serviu de transporte para 7% da população. O sistema agora está parado.

Mais recentemente, a crise política no Brasil também tem colocado o destino do PAC na Rocinha em questão, deixando o teleférico e as melhorias de saneamento vulneráveis à suspensão permanente. Enquanto ainda não está claro se algum desses projetos será concluído, o fracasso em concluir as melhorias de saneamento essenciais, reforçou ainda mais a desconfiança da capacidade do governo de prestar estes serviços à comunidade.

Cleber Araújo, que trabalha com a televisão comunitária TV Tagarela, explicou em uma recente reunião que a relação do governo com a Rocinha continua a ser o foco principal da organização. “Tentamos não propagar a argumentação da grande mídia de que a favela é um lugar de problemas, um lugar de morte. Tentamos falar sobre outras formas de violência aqui, especialmente a falta de saneamento básico”, disse ele.

Por enquanto, o Rocinha Sem Fronteiras vai continuar sua campanha de oposição à instalação do teleférico e com o andamento do processo contra o governo, a fim de exigir das autoridades o retorno das obras de saneamento prometidas. O grupo tem visitado o Ministério Público mensalmente e recentemente entregou um conjunto de demandas ao governo. As demandas originadas da população foram levantadas ao longo de várias reuniões comunitárias e abrangem uma série de questões trazidas por moradores, incluindo maior participação do público em projetos do governo, aumento do serviço de ônibus à noite, faixas de pedestres mais claras, a garantia de locais para creches públicas próximas e escolas para crianças na Rocinha, entre outros.

Assista nosso vídeo sobre a situação do saneamento na Rocinha:

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