O absolutismo predomina na 13ª Vara Federal de Curitiba

Por Leonardo Isaac Yarochewsky, no Justificando

No século XVII o rei detinha o poder absoluto. Ele legislava, governava, administrava a justiça e comandava o exército.  O rei absolutista impunha respeito à sua autoridade por meio da força militar e da cobrança de impostos. Valia-se também da “teoria do direito divino”.   Segundo essa teoria, o rei recebia o poder de Deus e era, portanto, seu representante na Terra. Coloca-se acima da sociedade, da Igreja e do Papa. Opor-se ao rei significava opor-se a Deus. Com isso toda população estava obrigada a seguir uma única fé: a religião do rei, “Um rei, uma lei, uma fé“, lema de Luís XIV. O regime absolutista caracterizou-se pela intolerância religiosa e pelas violentas perseguições a quem se opunha à religião do rei.

Luís XIV de Bourbon, conhecido como “Rei-Sol” (5 de setembro de 1638, Saint-Geramin-en-Laye, França – 1 de setembro de 1715, Versailles, França) foi o 64º monarca da França, tendo governado de 1643 até 1715. Símbolo do poder absolutista,

Filho de Luís XIII e Ana de Áustria, com apenas quatro anos e oito meses, em maio de 1643 sucedeu ao pai, mas só começa a reinar efetivamente aos 24 anos. Durante sua infância, o país é governado pela mãe, a regente, e pelo primeiro-ministro, o cardeal Mazarin. Tinha nove anos quando em 1648 começa a guerra civil conhecida como “La Fronde” (em francês, funda ou atiradeira, referência à arma com que arruaceiros franceses quebravam as vidraças das casas dos simpatizantes do cardeal Mazarin), que dura até 1653, quando o cardeal domina o movimento e passa a construir um grande aparato centralizado em torno do jovem príncipe. Símbolo do poder absolutista a frase “L’État c’est moi” – O Estado sou eu – é a ele atribuída.

Sérgio Fernando Moro (Maringá, 01 de agostos de 1972), filho de Odete Starke Moro e Dalton Áureo Moro, casado com a Rosângela Wolff de Quadros, juiz Federal, mestre e doutor em direito pela Universidade Federal do Paraná. Atuou como juiz em vários casos de repercussão nacional, entre os quais: “ Escândalo do Banestado”, “Operação Farol da Colina” e “mensalão” (auxiliando a ministra do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber). Atualmente, é juiz da 13ª Vara Federal criminal de Curitiba e comanda a famigerada “Operação Lava Jato”. Por sua atuação na “Operação Lava Jato” foi eleito pelo O Globo, “Personalidade do Ano” de 2014.

Assim como no século XVII, hoje predomina na 13ª Vara Federal de Curitiba o absolutismo. Absolutismo, que tem como mote a ideia aética de que “os fins justificam os meios” e, em nome de um ilusório combate a corrupção, o devido processo legal é atropelado. No século XVII, como afirmado, o rei impunha respeito à sua autoridade por meio da força militar e da cobrança de impostos, hodiernamente o juiz Federal impõe sua autoridade através do autoritarismo com decretações de prisões, conduções coercitivas, escutas telefônicas, delações, penas astronômicas etc. O exército de antes foi substituído pela Polícia Federal de agora, que age como polícia política.

O poder absoluto do soberano da “Lava Jato” chegou ao absurdo inimaginável de “grampear” conversas mantidas da então presidenta da República Dilma Vana Rousseff com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, além disso, divulgou em rede nacional o conteúdo dessas conversas. Não é demais relembrar que compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar o Chefe do Poder Executivo.

Mas, para aquele que tudo pode, o STF é apenas mais um estorvo a ser derrubado em sua luta obsessiva em combater o que ele acredita ser o câncer que deve ser extirpado, ainda que para isso seja necessário matar o doente.

O rei da “Lava Jato” conta com o apoio dos príncipes da República que comandam a Força Tarefa e se encarregam de apresentar à plebe com todo o aparato e tecnologia disponível – com a indispensável participação da mídia – as acusações que levaram ao rei. Acusações recheadas de adjetivos e ilações. Acusações contra aqueles que foram por eles elegidos a condição de inimigos.

É preciso atentar para o fato, conforme observa Anselm Jappe, de que o chamado “Estado democrático atual está muito mais equipado do que os Estados totalitários de outrora para fazer o mal, para perseguir de perto e eliminar tudo o que possa fazer-lhe frente”. Tivessem à época os Estados totalitários os recursos, inclusive de vigilância e  repressão, que os Estados ditos democráticos possuem hoje, no dizer do filósofo e ensaísta Jappe, “nenhum judeu ou cigano teria escapado, nenhuma resistência teria podido nascer, todo fugitivo de um campo de concentração teria sido recapturado imediatamente”.

Interessante observar a análise feita por Massimo Pavarini sobre como a “Operação Mãos Limpas” – exemplo para alguns aqui no Brasil – que relegitimou o sistema penal na Itália. Segundo Pavarini, “na Itália, durante muito tempo e diferentemente do que se registrou em outras realidades nacionais, os sentimentos coletivos de insegurança puderam se manifestar como demanda política por mudança através de uma participação democrática mais intensa. O que equivale a dizer que a comunicação social, através do vocabulário da política, favoreceu uma construção social de mal-estar e de conflito fora  das categorias morais de culpa e pena”. [1]

O paradigma político social da corrupção dá lugar, segundo Pavarini, ao paradigma moralista. “Os magistrados que conduzem as investigações sobre corrupção política são novos ídolos populares, os grandes ‘moralizadores’ porque são grandes ‘justiceiros’”.[2] Qualquer semelhança com a realidade brasileira não é mera coincidência.

O rei pode tudo, pode mandar prender e mandar soltar – justificativa, para que? – o rei não precisa justificar nada. O rei está acima de tudo e de todos. A Constituição da República não foi escrita pelo rei, mas vem por ele sendo apagada.

Apesar de tudo é primavera.

Leonardo Isaac Yarochewsky, é advogado e professor de direito penal da PUC-Minas.

[1] PAVARINI, Massimo. O instrutivo caso italiano. In: Discursos Sediciosos – crime, direito e sociedade, ano 1, nº 2. Rio de Janeiro: Instituto Carioca de Criminologia/Relume Dumará, 1996.

[2] PAVARINI, ob. cit.

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