Projeto Ibaorebu forma 200 indígenas Munduruku como Técnicos em Agroecologia, Enfermagem e Magistério Intercultural

Por André Ramos e Izabel Gobbi, na Funai

Todos já ouviram falar que os Munduruku são um povo guerreiro, que persiste em sua luta até alcançar os objetivos. Poucos sabem, no entanto, o quanto são organizados na hora de reunir muita gente das aldeias e fazer uma festa que integra alegria, debates de propostas e troca de conhecimentos. Estas características foram reafirmadas, durante a Semana de Conclusão do I Ciclo do Projeto Ibaorebu de Formação Integral do Povo Munduruku, realizada no período de 8 a 16 de dezembro.

A semana se dividiu em três momentos: Encontro Munduruku de Educação, Seminário de Apresentação das Pesquisas e Cerimônia de Formatura do Ibaorebu. Foi uma verdadeira festa do conhecimento, com a presença de vários caciques e cacicas, lideranças, pajés, parteiras, sábios e sábias, professores e professoras, anciões e crianças, com a participação de cerca de 2.400 pessoas por dia.

Encontro Munduruku de Educação

O Encontro Munduruku de Educação foi realizado no período de 8 a 10 de dezembro e teve como objetivo discutir assuntos relacionados à educação nas aldeias, ressaltando a importância de refletir sobre a situação atual dos processos educativos próprios e sobre a educação escolar oferecida pelas Instituições do Estado brasileiro. Desta forma, o Encontro também foi uma oportunidade de retomar as discussões que vêm ocorrendo há alguns anos, nas Assembleias Gerais realizadas pelo Povo Munduruku, onde sempre esteve presente a pauta da educação.

O evento discutiu propostas que contribuem na construção de diretrizes para a educação escolar nas aldeias, visando fortalecer propostas pedagógicas específicas e incentivar o trabalho integrado, formando assim uma rede de experiências e conhecimentos entre as 53 escolas das comunidades Munduruku. É sobretudo a busca pela autonomia na gestão escolar uma das principais motivações do Povo Munduruku, que possui o maior número de escolas, professores e alunos indígenas no estado do Pará, com aproximadamente 3.800 estudantes matriculados no ensino fundamental, conforme o último censo escolar.

Foi um momento de retomada, como disseram os Munduruku, que deliberaram sobre a necessidade de um segundo Encontro de Educação, a ser realizado no próximo ano para dar continuidade às discussões e amadurecê-las, avançando rumo à autonomia da educação escolar nas aldeias.

Seminário de Pesquisas

O Seminário de Apresentação das Pesquisas ocorreu no período de 12 a 15 de dezembro, com a exposição dos trabalhos realizados pelos cursistas, ao longo da trajetória de formação construída no Ibaorebu.

Houve ampla participação dos caciques, sábios e demais pessoas das comunidades, que contribuíram na discussão acerca das 48 pesquisas apresentadas. Em muitos momentos, os participantes afirmaram a importância das abordagens apresentadas pelos cursistas do Ibaorebu, referenciadas nos conhecimentos tradicionais e na visão de mundo própria aos Munduruku, contribuindo para o fortalecimento e valorização da identidade.

Entre os temas apresentados estão: A História do Rio Tapajós; Origem e Organização dos Clãs; O Céu e as Estrelas; Normas de Comportamento e Classes de Idades; Medicina Tradicional Munduruku e Medicina Pariwat; Poluição do Rio Cabitutu; Economia Comunitária e Economia Capitalista; Jogos e Brincadeiras; Pintura Corporal; Presságios, entre outros.

A Cerimônia de Formatura: finalizando um ciclo, para que outros se iniciem

No dia 16 de dezembro, os formandos e paraninfos das turmas de Técnico em Agroecologia, Técnico em Enfermagem e Magistério Intercultural se apresentaram com indumentárias tradicionais e vivenciaram, com todos os presentes, momentos de emoção e alegria. As falas dos caciques e representantes de turmas foram marcadas pelo compromisso com a proteção do território e dos conhecimentos próprios, com a reafirmação da identidade e a autonomia do Povo Munduruku.

O momento também foi de ressaltar o desejo de continuidade do Projeto Ibaorebu, com a abertura de novas turmas de ensino médio, especialmente para os jovens que não encontram respostas às suas necessidades na educação escolar convencional ofertada pelas Secretarias de Educação.

O Projeto

O Projeto Ibaorebu de Formação Integral Munduruku é executado pela Funai, por meio da Coordenação Geral de Promoção à Cidadania (CGPC), em parceria com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA), por meio do Campus Rural de Marabá e do Campus de Itaituba. A proposta foi desenvolvida com e para os Munduruku. Além de ser um projeto de educação diferenciada, com formação em cursos médios técnicos, o Ibaorebu é a primeira experiência no país que certifica uma turma de indígenas como técnicos em enfermagem, sendo que todos eles já atuam no subsistema de saúde indígena.

A trajetória do Ibaorebu foi marcada pela criatividade, pela valorização dos conhecimentos e pedagogias próprias e por uma interculturalidade crítica, expressa nas pesquisas e nas abordagens em torno do eixo “Direitos e Cultura Munduruku”, explicam André Ramos e Izabel Gobbi, da coordenação do Projeto na Funai. Segundo eles, durante este processo surgiram muitas dificuldades, que foram superadas graças ao compromisso e ao envolvimento do Povo Munduruku, à contribuição de vários profissionais que acreditaram na proposta, ao apoio da Coordenação de Processos Educativos – COPE/CGPC/FUNAI, do Campus Rural de Marabá – IFPA e ao trabalho constante dos técnicos da Coordenação Regional do Tapajós e das CTL de Jacareacanga e Itaituba.

“Foram oito anos de muita persistência, de conhecimentos compartilhados, trilhando o caminho da autonomia e do protagonismo do Povo Munduruku. Da Aldeia Sai-Cinza, que acolheu o Projeto durante todo esse tempo, trazemos a certeza de que a luta continua, pois a formatura não representa o encerramento do Ibaorebu, mas a finalização de um importante ciclo de formação, para que outros se iniciem”, avaliam.

Foto: Acervo Funai/CGPC

Foto: Acervo Funai/CGPC

 

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