Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi
O total liquidado pela Funai com demarcações de terras indígenas em 2016 chegou a pouco mais de R$ 3 milhões (Siop, 2017). Já os deputados e deputadas ruralistas que compõem a linha de frente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e do Incra 2, instalada em outubro para investigar os procedimentos demarcatórios, gastaram no mesmo período perto de R$ 3.5 milhões em cotas parlamentares (Câmara Federal, 2017).
Entre janeiro e dezembro do ano passado, o deputado ruralista Alceu Moreira (PMDB/RS) custou aos cofres públicos R$ 476.373,00. Quase meio milhão de reais foram gastos pelo presidente da arquivada e da atual CPI da Funai e Incra 2 com manutenção de escritório, viagens aéreas, veículos, alimentação, divulgação da atividade parlamentar, telefonia e consultorias técnicas (contratação de um escritório de advocacia).
No ano de 2015, Moreira fechou com R$ 469.111, 24 de cota parlamentar faturada. Em dezembro deste mesmo ano, a CPI da Funai/Incra foi instalada com o intuito de investigar as demarcações realizadas pelos órgãos estatais. Os trabalhos da CPI foram encerrados em agosto de 2016, sem um relatório final. Menos de dois meses depois a CPI da Funai/Incra 2 foi aberta elegendo, novamente, Moreira como presidente.
“Vão lá os anjos defensores dos índios certamente para financiar outros interesses”, disse Moreira em junho de 2013 – durante audiência na Câmara Federal. O parlamentar, em inúmeras ocasiões, questionou os gastos públicos com “demarcações fraudulentas” financiando “interesses de ONG’s bolivarianas”. Apontou ainda que o dinheiro do contribuinte é gasto com “vigarices ideológicas”. Nunca mostrou provas.
Nas eleições de 2014, o ruralista e outros seis colegas que dirigiram a CPI arquivada e seguem atual arrecadaram entre empresários e empresas do agronegócio R$ 9 milhões. Ou seja, sete parlamentares receberam do setor que se opõe às demarcações o triplo usado em 2016 pelo Estado para garanti-las. A desproporção é ainda maior contabilizando o que o próprio Estado injeta na ação legislativa anti-indígena dos ruralistas.
No Brasil, conforme dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), existem 1.113 terras indígenas. Desse total, 4,13% estão identificadas (47), 15,72% a identificar (175) e 31,35% sem nenhuma providência (348). São terras que amargam a morosidade do governo em demarcá-las. Um déficit que se arrasta deixando um rastro de impunidade, violência e luta. Se a Funai tivesse executado toda a dotação de 2016, o liquidado com as demarcações saltaria de R$ 3 milhões para apenas R$ 6 milhões. Enquanto a Funai segue sucateada e atacada, os ruralistas ganham muito dinheiro.
Eduardo Cunha custou menos que Alceu Moreira
O ex-presidente da Câmara e deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) custou, entre janeiro e maio de 2016, R$ 87.579,22. No mesmo período, Moreira devorou R$ 225.969,51 do erário público. O atual presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ), durante todo o ano, utilizou R$ 328.680,27 da cota parlamentar. O ruralista, todavia, supera colegas destacados da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).
Relator da CPI da Funai/Incra 2, o deputado Nilson Leitão (PSDB/MT) utilizou R$ 378.900,64 da cota durante o ano legislativo de 2016. No mesmo período, Luiz Carlos Heinze (PP/RS), 1º Vice-Presidente da CPI, acessou R$ 392.687,71. Já o presidente da FPA, deputado Marcos Montes (PSD/MG), R$ 439.931,30. Mandetta (DEM/MS), 2º Vice-Presidente, chegou a R$ 448.536, 21.
Nelson Marquezelli (PTB/SP), 3º Vice-Presidente, o político que em outubro disse: “Quem não tem dinheiro, não estuda”, gastou uma quantia que arcaria com vários cursos de nível superior: R$ 447.374,36. Entre ruralistas integrantes da CPI, Tereza Cristina (PSB/MS) foi quem mais gastou: R$ 841.223,00. Sem exceção, todos estes parlamentares integram esforços pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215.
É exatamente para eles, inclusive, que a PEC 215 aguarda votação em uma Comissão especial: a proposta pretende transferir do Poder Executivo para o Poder Legislativo a demarcação de terras indígenas, quilombolas (realizadas pelo Incra) e a criação de áreas de preservação ambiental. Além disso, a PEC prevê a adoção do marco temporal.
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Imagem: Indígenas protestam diante do Supremo Tribunal Federal – Fábio Nascimento