Novo ministro da Justiça indicou à Funai condenado por arrendamento e é contra o Executivo demarcar TI’s

Por Renato Santana,  Cimi

O deputado ruralista Osmar Serraglio (PMDB/PR) será empossado nesta terça-feira, 7, como ministro da Justiça. Parlamentar atuante contra a demarcação de terras indígenas, passará por Serraglio os procedimentos demarcatórios realizados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) – alvo de uma segunda Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), na Câmara Federal, engendrada pela bancada do empossado.

Recentemente, o novo ministro se envolveu em mais uma situação constrangedora ao posto que passará a ocupar. Conforme apurações do Ministério Público Federal (MPF), Serraglio assinou ofício pedindo ao atual presidente da Funai, Antônio Costa, que nomeasse o advogado Ubiratan de Souza Maia como coordenador-geral de licenciamentos do órgão indigenista.  

O advogado foi condenado pela Justiça Federal pela prática ilegal do arrendamento de 3,5 mil hectares da Terra Indígena Xapecó, do povo Kaingang, nos municípios de Ipuaçu e Entre Rios, em Santa Catarina. Ubiratan e um comparsa usavam a empresa JM Consultoria Ambiental LTDA como parte do esquema criminoso e devem ressarcir a comunidade, de acordo com a Justiça, em R$ 119 mil.

A indicação de Ubiratan à Funai preocupa o MPF: “Não apenas pela condenação sofrida por Ubiratan, mas também por sua atuação em questões relativas aos direitos dos povos indígenas do Oeste do estado (SC), muitas vezes questionada pelos próprios caciques das comunidades indígenas da região”, diz trecho da nota do MPF/SC. Antes da condenação, o advogado já tinha aparecido no noticiário nacional.

A má fama de Ubiratan ganhou reportagem no jornal Estado de S. Paulo. Em abril do ano passado, durante reunião da primeira versão da CPI da Funai/Incra defendeu o arrendamento de terras indígenas para agricultores – vedado por lei. Também convidado pela bancada de Serraglio para debates na Câmara envolvendo a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, Ubiratan defendeu a tese do marco temporal.

Não foi apenas Serraglio que intercedeu a favor de Ubiratan, defensor de interesses ruralistas, junto à Funai. Luís Carlos Heinze (PP/RS), Valdir Colatto (PMDB/SC), Tereza Cristina (PSB/MS) e Adilton Sachetti (PSB/MT) também assinaram o ofício. Na semana pré-carnaval, Heinze teve uma audiência com o presidente da Funai, ao lado de representantes do Ministério da Justiça e Presidência da República, para tratar de assuntos relacionados à “questão indígena” – conforme a pauta oficialmente divulgada.

“Agora é um ruralista mesmo como ministro da Justiça. Se deputado ele (Serraglio) já defendia tudo o que defendia, como a PEC 215, a perseguição aos antropólogos e organizações aliadas da gente, como ministro vai ser muito pior. Não dá pra pensar que esse ministro vai demarcar nossas terras. A situação é insustentável”, afirma Elizeu Lopes Guarani e Kaiowá, membro do Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI).   

Demarcação no Poder Legislativo

Serraglio é um dos principais articuladores e formuladores da PEC 215, que aguarda votação pelo Plenário da Câmara. Para o novo ministro do Poder Executivo, o procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas deve ser transferido para o Legislativo. Em outubro de 2015, Serraglio apresentou uma proposta substitutiva – votada e aprovada – acrescentando à PEC a tese do marco temporal.     

Comentando sobre entrevista de uma antropóloga ao jornal Folha de S. Paulo, assim o novo ministro se posicionou: “Na memória dela antes a casa dela, há 200 anos, era uma terra indígena. Ela que saia da casa e entregue a chave para a Funai. Se (a terra indígena) é imemorial, todos somos invasores. É ridículo. Essa antropóloga deve ser financiada pela Funai”, disse o ruralista ao programa Notícias Agrícolas (assista aqui).

Para o novo ministro da Justiça, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu – ao julgar as condicionantes envolvendo a homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol – que vale a tese do marco temporal. “O STF decidiu que é a partir de 5 de outubro de 1985. Se nessa data não estava na terra, não existe demarcação”, disse Serraglio durante entrevista sobre a PEC 215.

No entanto, a decisão do STF define as condicionantes de Raposa Serra do Sol como não vinculantes às demais terras indígenas do país. O ponto é que o caso Raposa passou a ser utilizado por alguns defensores do marco temporal. No pleno da Corte Suprema, a tese já sofreu derrotas importantes e os ministros deverão definir ainda este ano um posicionamento definitivo sobre o marco temporal.

Conforme noticiou o site De Olho nos Ruralistas, “Osmar Serraglio declarou ao Tribunal Superior Eleitoral, em 2014, um patrimônio de R$ 5,4 milhões. Os bens mais valiosos estão ligados ao mercado imobiliário. Imóveis rurais, ele declarou dois. Um de 24 hectares em Nova Prata do Iguaçu (PR), por R$ 5.966,54, e outro em Umuarama (PR), que ele possui desde 1976, por R$ 409, 20. Em 1997 o deputado possuía R$ 704 mil”.

Imagem: Manifestação contra a PEC 215. Crédito Tiago Miotto/Cimi.

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