Por Janelson Ferreira
Da Página do MST
Durante toda a Jornada de Luta das Mulheres, centenas de mulheres se reuniram em Dourados, MS, para protestar. As atividades foram realizadas por mulheres trabalhadoras do campo e da cidade, entre elas, as mulheres Sem Terras e as indígenas Guarani-Kaiowás. A programação contou com rodas de conversa, apresentações teatrais, oficinas de autodefesas e festas temáticas, além de um debate sobre o documentário “Lute Como uma Menina”, de Flávio Colombini e Beatriz Alonso.
Na quarta-feira (8), cerca de 500 mulheres fizeram uma marcha pelas principais ruas da cidade. Além da denúncia do ataque à Previdência e outros direitos da classe trabalhadora, da violência contra a mulher, do avanço do agronegócio e da utilização de agrotóxicos, a mobilização exigiu a retomada da Reforma Agrária e o fim do massacre da população Guarani-Kaiowá.
A PEC 287, da contrarreforma da Previdência, junto com o projeto de lei 6787/2016, da contrarreforma trabalhista, constituem duas das mais violentas ofensivas de Temer e do Congresso conservador para acabar com a Previdência Social e com direitos trabalhistas, historicamente conquistados. Além disso, o resgate do PL 4059/2012 e a Medida Provisória 759 seguem o mesmo rumo de ataques que buscam acabar com a Reforma Agrária.
Em Dourados está situada uma das maiores reservas indígenas do país, com duas aldeias: Jaguapiru e Bororó. Lá vivem mais de 12 mil pessoas em uma área de 3,6 mil hectares, o que gera uma densidade demográfica de aproximadamente 0,3 hectares/pessoa. A reserva foi criada pelo SPI (Serviço de Proteção ao Índio) em 1917 com o objetivo de servir de acomodação para famílias indígenas de diversas etnias, e oriundas de várias comunidades. A criação da reserva fez parte de uma política oficial do Estado brasileiro de territorialização da população indígena em pequenas reservas na região sul do Mato Grosso do Sul.
A demora na demarcação das terras indígenas, por omissão do Governo Federal e lentidão do Poder Judiciário, além do ataque de milícias paramilitares financiadas por ruralistas, estão entre as principais causas do aumento da violência contra os índios. A taxa de assassinatos contra a população indígena é mais de três vezes maior que a média nacional, que é de 29 homicídios por cem mil habitantes.
De acordo com relatório divulgado pela ONU (Organização das Nações Unidas), a situação de violência contra a mulher indígena é ainda mais grave. No MS, os casos de violência contra a mulheres indígenas aumentaram em aproximadamente 495% em 2010, quando foram relatadas 104 agressões físicas. Já em 2014 este número saltou para 619. Segundo o documento, mais de uma em cada três índias é estuprada durante a vida, além das mulheres indígenas possuírem um maior índice de mortalidade materna.
O Governo quer acabar com a Reforma Agrária
Também durante a Jornada, na quinta-feira (9), mais de 100 militantes do MST do Mato Grosso do Sul se reuniram com o Superintendente do Incra-MS, Humberto César Mota Maciel, em Campo Grande. Na pauta esteve presente o abandono dos assentamentos e das famílias acampadas em todo estado, por parte do Instituto.
Atualmente, as famílias acampadas e assentadas enfrentam graves problemas gerados pela inoperância do órgão. As dificuldades vão desde a falta de infraestrutura (estradas em má qualidade, falta de água, energia elétrica) até o atraso na concessão de créditos e acompanhamento técnico. E este cenário não está restrito ao estado. Nacionalmente, o Incra passa por um momento de total abandono e desmonte, fruto, principalmente, do descaso do governo ilegítimo de Michel Temer.
Para Marina Ricardo Nunes, da Direção Nacional do MST, o governo busca acabar com a perspectiva de uma verdadeira Reforma Agrária no Brasil. “Não existe perspectiva. A situação é de total abandono do órgão. Os funcionários não têm a mínima condição de realizar um trabalho digno. Esta realidade é consequência de um ataque à Reforma Agrária, aprofundado fortemente após o governo golpista do Temer assumir. Infelizmente, quem mais sofre são as famílias assentadas e acampadas, que ficam abandonadas, sem nenhuma condição de viver em seus lotes e produzir alimento saudável”, assegura Marina.
Conforme afirma a dirigente, existem assentamentos com mais de dez anos e que até hoje não receberam nenhum tipo de crédito. “Temos famílias que não têm nem mesmo DAP e CCU. As condições para as famílias acessarem estes documentos são risíveis. Elas não conseguem comprovar que são agricultoras porque não possuem os documentos mais básicos para isso. Queremos fazer com que o Incra se comprometa, pelo menos, com a emissão destes dois documentos para as famílias que ainda não os têm”, explica.
A DAP (Declaração de Aptidão ao Pronaf) e o CCU (Contrato de Concessão de Uso) são dois documentos básicos para as famílias assentadas, sem os quais elas não têm acesso a diversos direitos. A DAP é um documento de identificação da agricultura familiar, obtida de forma gratuita, e que permite ao agricultor e à agricultura acessarem a pelo menos 15 políticas públicas do Governo Federal, entre elas, assistência técnica e programas de comercialização da produção. Já o CCU, também emitido gratuitamente, é o instrumento que transfere, em caráter provisório, o imóvel rural às famílias assentadas, assegurando a elas o acesso à terra, créditos (como habitação, fomento e infraestrutura) e a outros programas.
Desde que assumiu a presidência, o governo ilegítimo de Michel Temer tem dado várias demonstrações de que deseja acabar com a Reforma Agrária no país. O projeto de lei 4059/2012 libera a compra sem limites de terras por estrangeiros. O projeto é uma afronta a qualquer processo de democratização da terra e só serve à especulação imobiliária, além de representar um sério risco à soberania nacional. A Medida Provisória (MP) 759, editada no fim de 2016, define a compra e venda de terras pelo Incra em dinheiro e atende a uma antiga demanda dos ruralistas pela antecipação da emancipação dos assentados. A MP ainda permite a municipalização da Reforma Agrária. Estas medidas poderão incentivar a venda de lotes, o que foge dos objetivos da Reforma Agrária, coloca as famílias assentadas à mercê do clientelismo político e favorece a legalização de terras griladas por latifundiários.
*Editado por Leonardo Fernandes