Para relembrar a Violência da Polícia Mineira no Grito dos Excluídos em Diamantina, MG, 2015

No dia 7 de setembro de 2015, algumas estudantes que participavam do Grito dos Excluídos em Diamantina foram agredidas, e uma delas foi levada presa. Na próxima semana, dia 05 de abril, será realizada audiência a respeito, com o claro intuito de criminalizar as manifestantes. Em contraponto a isso e para que relembremos a violência, seguem texto que narra o desrespeito aos direitos humanos e vídeo que documenta tudo.   

Na Fundação Padre José Koopmans – Funpaj

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À Secretaria de Direitos Humanos e Participação Social de Minas Gerais, sobre o 07 de setembro de 2015 em Diamantina/MG:

Sou Maria Mariana Batista Cangussu e como cidadã fui participar do “Grito dos Excluídos”, manifestação pacífica que teve com a principal pauta “o terceiro aumento abusivo da passagem de ônibus em Diamantina”. Além disso, sabemos que há várias irregularidades nos procedimentos referentes ao transporte público, desde estruturais com ônibus em péssimas condições, falta de transporte nas periferias, falta de iluminação, pontos de ônibus cobertos para os usuários, e o recente aumento da passagem de R$ 2,00 para R$ 2,50 sem nenhuma melhoria, além da contratação sem licitação de nova empresa para prestar o serviço de transporte coletivo.

Além dessa pauta, a manifestação trazia também a questão da precarização do ensino superior (pois os professores da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM se encontravam em greve), e a questão da redução do salário dos Vereadores. Éramos em torno de 20 manifestantes estudantes junto a outros da sociedade civil organizada, sendo que estes recolhiam assinaturas para um abaixo assinado. Nós carregávamos apenas cartazes escritos “Ditadura Nunca Mais” e apitos coloridos.

Quando cheguei ao local onde ocorria o desfile, a manifestação popular já estava ocorrendo e as pessoas estavam organizadas do lado de fora da barra de contenção e pronunciavam palavras de ordem e cantavam.  Foi quando juntei-me ao  pequeno coletivo de no máximo 30 pessoas. Neste momento os estudantes já alegavam que desde que a manifestação havia se posicionado ali, um policial sem identificação e com um cassetete de madeira já estava com uma postura hostil com relação aos manifestantes.

Com menos de 20 minutos junto aos manifestantes, fui abordada por policiais que afirmaram precisar do nome da minha mãe, meu telefone, o endereço e que eu apresentasse a minha carteira de identidade, pois seria qualificada enquanto líder da manifestação. Expliquei ao policial que não era líder, portanto precisava abordar outra pessoa para tal qualificação, explicando a ele que era só mais uma manifestante. Este policial, por nome Cássio, me abordou repetidamente prejudicando a minha participação na manifestação. Foi então que os demais manifestantes se propuseram coletivamente a serem identificados enquanto líderes, todos apresentando a carteira de identidade, explicando e afirmando que eu não era a líder do movimento.

Nesse momento, um soldado que estava atrás da barra de contenção e sem identificação, rompeu a grade e me pegou por trás, torcendo meu braço e me empurrando em direção ao camburão. Neste ato truculento, outros policiais puxaram meu cabelo e rasgaram meu vestido, me arrastando com os seios de fora pela rua até o camburão. Nesse mesmo momento o policial que rompeu a grade, bate nos manifestantes (momento que o vídeo fica sem foco), os manifestantes gritam pedindo que haja a intervenção de uma policial feminina para me acompanhar. A estudante que entra na minha frente para consertar meu vestido e proteger meus seios à mostra apanha do policial com um cassetete de madeira. Outros são feridos no pescoço e outro estudante no braço tentando defender o rosto de outra agressão.

Fui levada com o vestido rasgado, descalça e sem bolsa na parte traseira do camburão (lugar abafado e apertado, quase um navio negreiro). Exigi que me levassem no médico, pois estava sentindo muita dor no braço e no ventre além da falta de ar. Durante o caminho ao hospital os policiais Cássio e Renan ridicularizavam minha situação e meus machucados. Quando chegamos ao hospital o policial Cássio não permitiu que o médico me consultasse sozinha, me intimidando e oprimindo minhas falas sobre as dores em frente ao médico, fato que fez com que o médico pedisse que esse policial se retirasse da sala.

Durante a espera para a radiografia do braço o policial ficou dando lição de moral e desqualificando minha situação enquanto manifestante. Quando questionei sobre as infrações aos Direitos Humanos, ambos riram e afirmaram que “Essa aula ai não é importante, matamos essa lição”. Fui conduzida até a Polícia Civil onde havia outros estudantes machucados e que também tiveram entrada no hospital e queriam fazer a denúncia.

Durante a elaboração do Boletim de Ocorrência – BO feito pelo policial Cássio, não houve a transcrição da nossa versão, afirmando que esta não era relevante e continuou fazendo chacota aos Direitos Humanos. A postura hostil só mudou quando chegou o Superintendente de Ensino e professor da Universidade. Após ter acesso ao BO notei que além das informações que foram omitidas, o policial afirmou inverdades como ao dizer que policiais mulheres participaram da ação. Ou seja, além das agressões físicas e psicológicas o policial ainda cometeu fraudes no Boletim de Ocorrência.

Eu e outros estudantes prestamos depoimento sobre o caso para a Polícia Civil, sendo que esta ficou de solicitar o laudo médico nos hospitais e pedir ao legista que o tornasse corpo delito, pois no dia não havia médico legista na polícia civil. Até o momento desta denúncia o laudo não havia ficado pronto.

Diante do exposto, venho solicitar que a “Secretaria de Direitos Humanos e Participação Social do Estado de Minas Gerais” se posicione e se empenhe na apuração do caso de abuso de autoridade e violência cometidos pela Polícia Militar de Diamantina a partir dos fatos narrados. Assim, solicito também que seja encaminhada uma denúncia à Corregedoria de Polícia de Minas Gerais para que os policiais envolvidos nessa ação sejam punidos, nos termos da lei 4898/65 que regula o Direito de Representação e o processo de Responsabilidade Administrativa Civil e Penal, nos casos de abuso de autoridade.

Acompanha essa denúncia uma cópia do vídeo que flagrou a ação truculenta da polícia, bem como fotografias da manifestação e de algumas das lesões físicas causadas pelos policiais.

Que se faça valer os direitos civis e políticos adquiridos por meio da nossa Constituição Federal de 1988, sendo que para tanto será necessário punir os agressores e garantir a nossa integridade física, pois estamos com receio de sofrer retaliações na cidade e na Universidade. Solicitamos também que a “Secretaria de Direitos Humanos e Participação Social de Minas Gerais” apure os demais casos de abuso de autoridade e violência que nós jovens e estudantes estamos sujeitos cotidianamente.

 Diamantina/MG,  setembro de 2015.

Maria Mariana Batista Cangussu

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