A Câmara de Vereadores de São Paulo aprovou na última terça-feira (9) o Projeto de Lei 270/2017, que cria o Conselho Municipal de Desestatização, mais um passo na direção da montagem do arcabouço legal e administrativo para implementar uma das propostas centrais da campanha de João Doria ao cargo de prefeito, que consiste em vender bens públicos para a iniciativa privada ou estabelecer concessões e parcerias com ela para gerir equipamentos e serviços públicos.
O Conselho tem a atribuição de decidir quais bens podem ser desestatizados e será composto exclusivamente por secretários subordinados ao prefeito e, portanto, sob o comando de sua vontade. Não há no Conselho nenhuma representação da sociedade civil e tampouco qualquer mecanismo previsto de controle público e transparência.
O PL, que ainda aguarda a sanção do executivo, apenas sugere a realização de audiências ou consultas públicas não vinculantes, isto é, as pessoas que se manifestarem, mesmo que se posicionem majoritariamente contra a proposta, não precisam ter seus argumentos levados em consideração.
Na prática, a lei é um cheque em branco ao prefeito. A única brecha, inserida através de uma emenda durante o debate no legislativo, é que, depois de decididos os bens a serem desestatizados, a autorização de venda terá de passar pelos vereadores. Evidentemente passar pela Câmara é um avanço na medida em que exige pelo menos a publicização do que está sendo decidido. Entretanto, considerando como são armadas as coalizões e constituídas as bases de qualquer legislativo do país, e, particularmente na Câmara de São Paulo, onde o prefeito constituiu maioria, dificilmente os vereadores irão barrar as decisões tomadas pelo conselho.
A lei prevê ainda a criação de um Fundo Municipal de Desenvolvimento para onde vão os recursos provenientes da venda ou exploração comercial dos equipamentos e serviços. A lei estipula que esse fundo investirá prioritariamente em educação, habitação, saúde, transporte/mobilidade e segurança, prioridades de fato em São Paulo. Mas há algumas pegadinhas aí. A primeira delas é que o texto fala em “prioritariamente” e não exclusivamente. E, em segundo lugar, porque a própria lei aprovada diz que a critério do conselho que, como já afirmei, é composto exclusivamente pelo governo, o Fundo pode ser usado para cobrir qualquer tipo de despesa.
Parece-me que estamos embarcando em um processo com pouco controle social, transparência e debate, coisas absolutamente necessárias antes de se decidir sobre algo tão importante como o destino dos equipamentos e serviços públicos de São Paulo. Além disso, bens serão vendidos sem o devido debate em torno do interesse público para gastar em despesas que tampouco sabemos se são ou não prioritárias. No fim, a cidade vai ficar sem o bem público e o dinheiro.
Falei sobre isso na minha coluna da última quinta-feira (11) na Rádio Usp. Ouça aqui.
—
Imagem: Parque da Luz está na lista de áreas verdes que terão serviços oferecidos à iniciativa privada pela prefeitura. Foto: @juagnelo/Instagram