As primeiras horas de um longo dia que está distante de terminar. Entrevista especial com Adriano Pilatti

Ricardo Machado – IHU On-Line

O furacão que passou por Brasília no início da noite da quarta-feira, 17-5-2017, deixou estragos não somente no Palácio do Planalto, mas também causou efeitos na esplanada dos Ministérios e no Congresso Nacional. A delação de Joesley Batista coloca no centro da tempestade o presidente Michel Temer que, em seu pronunciamento na tarde de ontem, garantiu que não renunciará ao cargo. Os efeitos políticos, econômicos e sociais já começam a mostrar seus sinais. Os ministros Roberto Freire (PPS) e Bruno Araújo (PSDB), da Cultura e das Cidades, respectivamente, renunciaram aos cargos ainda na tarde da quinta-feira. Além disso, o senador Aécio Neves será investigado por ter recebido R$ 2 milhões da JBS, conforme autorizou o ministro Fachin. O impacto econômico foi tamanho que a Bovespa, pela primeira vez desde 2008, recorreu ao mecanismo do circuit breaker, que trava a negociação das ações quando chega a um determinado nível de queda, que foi de 10,4%.

Para discutir o atual momento, a IHU On-Line convidou o professor Adriano Pilatti para analisar, no calor dos acontecimentos, por e-mail, a atual conjuntura. “Este longo dia ainda não acabou, em breve as gravações estarão liberadas, e ele [Temer] perderá qualquer condição de prosseguir. O establishment já compreendeu isso e agora procura apressar a substituição do fósforo queimado por outro pau mandado capaz de garantir a articulação parlamentar necessária para aprovar a pilhagem dos direitos da classe trabalhadora”, analisa Pilatti.

Em sua opinião, “O Congresso atual é parte do problema e não de sua solução”, um primeiro passo a ser dado para sair da crise passa pela “radicalização democrática, a devolução da escolha das alternativas de superação ao povo”, complementa.

Adriano Pillati é graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestre em Ciências Jurídicas pela PUC-Rio e doutor em Ciência Política pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro – Iuperj, com pós-doutorado em Direito Público Romano pela Universidade de Roma I – La Sapienza. Foi assessor parlamentar da Câmara dos Deputados junto à Assembleia Nacional Constituinte de 1988. Traduziu o livro Poder Constituinte – Ensaio sobre as Alternativas da Modernidade, de Antonio Negri (Rio de Janeiro: DP&A, 2002). É autor do livro A Constituinte de 1987-1988 – Progressistas, Conservadores, Ordem Econômica e Regras do Jogo (Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Qual o impacto político, econômico e social da não renúncia de Michel Temer?

Adriano Pillati – Meramente protelatório. Este longo dia ainda não acabou, em breve as gravações estarão liberadas, e ele perderá qualquer condição de prosseguir. O establishment já compreendeu isso e agora procura apressar a substituição do fósforo queimado por outro pau mandado capaz de garantir a articulação parlamentar necessária para aprovar a pilhagem dos direitos da classe trabalhadora que só criminosos temerosos de punição podem mesmo aceitar votar nominalmente, contando com a cobertura dos financiadores e da mídia associada. Temer é o anel, que era vidro e se quebrou, para o Capital o importante agora é aprovar as maldades antes que a resistência popular aumente.

IHU On-Line – A curto prazo, como ficam as reformas Trabalhista e da Previdência?

Adriano Pillati – Para a continuidade das reformas, é agora imprescindível a nomeação do novo presidente pelo Congresso, por isso a luta por eleições gerais é também imprescindível para a defesa dos direitos dos que a ela se opõem. Sem a continuidade do atual esquema de poder, tais “reformas” se inviabilizam no curto prazo. E realizar as reformas é o golpe estrutural a que o golpe conjuntural do ano passado visava abrir caminho. Com eleições gerais, as reformas serão reprovadas no debate eleitoral, prevenindo nova ofensiva no médio prazo.

IHU On-Line – Como superar a atual crise política brasileira?

Adriano Pillati – A resposta é vasta, atenhamo-nos apenas ao necessário para começar a supera-la. Como? Pelo exercício direto e imediato do poder constituinte, do direito de resistência e da desobediência civil, para impedir o Congresso de deliberar sobre qualquer outra matéria que não seja o impeachment e a convocação de eleições gerais que reconstruam a legitimidade dos poderes constituídos. É importante compreender que não basta eleição direta para a Presidência: sem um novo Congresso, ninguém que seja sério conseguirá governar e as reformas serão consumadas.

Além disso, eleições isoladas para a Presidência facilitam a ascensão de aventureiros. O Congresso atual é parte do problema e não de sua solução. A cidadania precisa obriga-lo a autodissolver-se por meio da aprovação de uma PEC que convoque eleições gerais. A crise do sistema oligárquico só poderá ser superada democraticamente, pelo voto direto. Esta é a premissa necessária para superar a crise: contra a radical degeneração dos poderes constituídos, a radicalização democrática, a devolução da escolha das alternativas de superação ao povo.

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