Segmentos diversos presentes no Ocupa Brasília (24), resistiram à truculência e afirmam a continuidade das mobilizações
Por Lizely Borges
Da Página do MST
Estudantes, servidores públicos, povos tradicionais, movimentos populares e organizações sociais presentes no Ocupa Brasília, ato em defesa da renúncia imediata de Michel Temer (PMDB) e eleições gerais diretas realizado nesta quarta-feira (24) em Brasília-DF, reafirmam que a intensa repressão policial aos manifestantes que marchavam em direção ao Congresso Nacional não deve retirar a população das ruas nas mobilizações pela defesa da democracia e contra à retirada de direitos em curso.
O ato convocado por um conjunto de centrais sindicais e frentes populares e compreendido como histórico pela representatividade dos grupos e segmentos presentes vindos de todas as regiões do país, totalizando cerca de 200 mil, é avaliado como exitoso ainda que o governo não reconheça a rejeição popular à sua gestão e a legitimidade da manifestação, e tenha recebido os marchantes com balas de borracha, spray de pimenta e bombas de efeito moral.
Embora que a pauta mais imediata seja a renúncia de Temer, reivindicação potencializada após a delação de um dos donos do grupo JBS, Joesley Batista, sobre o envolvimento do presidente na compra de silêncio do ex-presidente da Câmara e deputado cassado, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), as manifestações populares ganham contornos crescentes de defesa de um novo projeto político para o país, orientado por interesses populares.
“A gente fala agora nas ruas da escolha de modelo, dos rumos da sociedade. Temos a compreensão de que Temer vem transformando Brasília em uma praça de guerra, mas o problema que ele já vem transformando o Brasil todo em praça de guerra se a gente considerar os massacres no campo, os ataques às populações tradicionais, a retirada de direitos”, argumenta o membro da coordenação nacional do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Bruno Pilon em referência a adoção de um modelo de desenvolvimento de expresso na diminuição do Estado em garantir os direitos sociais.
A avaliação dos movimentos campesinos é a de que é preciso reverter a lógica de Estado mínimo para a população de baixa renda e máximo para capital privado, no campo materializado pelo agronegócio. O progressivo número de massacres de trabalhadores da terra, como de Colniza e Redenção, ambos no Pará, evidencia, para os movimentos, sobre quais sujeitos o Estado compromete-se a proteger e privilegiar.
O esforço em orientar, pela decisão popular, novos rumos para o país é também compartilhada pelo vice-presidente regional do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), Cláudio Ribeiro. A categoria que vem progressivamente sofrendo com medidas de austeridade, em especial o congelamento dos gastos sociais por vinte anos (PEC 55/251) e as práticas de flexibilização do trabalho docente, defende a necessidade de ampliação da luta.
“O ataque a gente sofre na educação pública é contínuo e as contrarreformas vão atacar diretamente todas os direitos sociais. Temos que nos organizarmos para defender que continue existindo o direito social. A luta contra as reformas não é pontual, é uma luta contra um projeto de sociedade que tem que ser intensificada cada vez mais”, diz. Ele anuncia que a categoria permanece em Brasília após o ato para reunião nacional na definição de uma nova greve nacional nos próximos dias.
Legitimidade pela repressão
Além do forte aparato policial utilizado pela polícia militar do Distrito Federal, categoria subordinada diretamente ao governador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), incluindo uso de cavalaria, tropa de choque, helicópteros e uso de arma letal, para progressivamente afastar os manifestantes pela Esplanada, no início da tarde o presidente Temer editou, em edição extra do Diário Oficial, um decreto que autorizou o emprego das Forças Armadas no período de 24 a 31 de maio.
Com a justificativa de ser “uma ação de garantia da lei e da ordem”, uma tropa com 1200 homens do Exército, Marinha e Aeronáutica instalou-se ao longo da Esplanada e pelos Ministérios. A convocação das Formas Armadas é ação prevista pelo Decreto Complementar 3.897/2001 em casos excepcionais quando estiver esgotada ou não for possível a atuação dos agentes de segurança comumente presentes nas manifestações populares, como policias federal, civis, militares ou corpo de bombeiros.
Avaliada como afirmação de um estado de exceção pelas organizações populares, a medida provocou espanto no ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF). “Espero que seja mentira”, declarou ao ter conhecimento do decreto. “É muito triste que o governo receba os trabalhadores que vem todo o Brasil para se manifestar com bomba de efeito moral, bala e o exército nacional. Só faz isso porque não tem legitimidade e precisa conquistar a legitimidade pela força”, declarou a presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Carina Vitral. Conjuntamente com a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), as entidades estudantis protocolaram na mesma tarde, anterior ao ato, um abaixo-assinado com 220 mil assinaturas com a reivindicação de realização de eleições diretas e renúncia de Temer em razão da insustentabilidade do governo. O documento foi entregue ao presidente da Câmara.
De acordo com a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), em anúncio realizado na noite desta quarta, o corpo de bombeiros registrou 45 feridos e 12 detenções. Sobre os registros fotográficos de uso de arma letal por policiais, o órgão informou que será aberto inquérito de investigação.
Diante da pressão popular e da bancada de oposição no Congresso Nacional, que se retirou do parlamento ao ter conhecimento da violência dirigida aos manifestantes e em oposição à continuidade de apreciação da pauta do dia, o presidente Temer revogou o decreto na manhã desta quinta-feira (25), após reunião com ministros.
Continuidade das ações
Os setores presentes no ato anunciam a continuidade das mobilizações, com a definição nos próximos dias de novas paralisações nacionais.
O secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Rodrigo Rodrigues, também destacou a necessidade de ampliação do debate popular em torno da reforma política. Ele relata a retomada da defesa de uma nova Constituinte, mobilização iniciada no governo Dilma, com participação de 7 milhões de brasileiros na realização de um plebiscito Constituinte, em 2014. Uma proposta foi levada à ex-presidente e deve ser retomada pelas Frentes populares. “Precisamos de uma profunda reforma política, de eleições gerais. É preciso aprofundar este debate como a população para reverter este projeto político de retirada de direitos”, defende.
“Agora é continuar tencionando na política. A base aliada de Temer já está abandonando. A tarefa da classe trabalhadora é derrubar o presidente, pelas ruas”, reforça o membro da coordenação nacional do MST, Marco Baratto.
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Polícia Militar usa helicópteros para dispersar manifestantes Foto: Mídia Ninja