Se o Brasil tivesse um governo republicano e democrático, Michel Temer estaria pedindo um voto de confiança para o conjunto da sociedade diante do escândalo em que foi envolvido pela delação dos donos da JBS. Ao invés disso, reuniu-se novamente com o grande empresariado e o mercado financeiro em um evento em São Paulo a fim de solicitar sua benção.
Tenta, mais uma vez, convencer o capital, que o ajudou a ocupar o Palácio o Planalto, de que é útil e capaz de cumprir a missão que foi delegada por ele: ”Combater a crise econômica jogando a fatura para longe do colo dos mais ricos” e ”Aproveitar a crise para reduzir o Estado – não na parte que garante subsídios, desonerações e isenções de impostos sobre lucros e dividendos, o que beneficia aos ricos, mas reduzindo a parte que atende às necessidades da xepa humilde”.
”Quero dizer que cada passo que nos guiou foi sentimento de responsabilidade. Queremos um futuro melhor. Não há Plano ‘b’. Afinal, a responsabilidade rende frutos”, disse Temer, segundo registro do UOL. ”Seria cômodo que eu assumisse o governo e deixasse as coisas como estavam para o meu sucessor pudesse levar adiante as reformas fundamentais para o Brasil”
E falando em sucessores, Temer contou, no evento, com a ajuda da parte do PSDB – que sonha em assumir o governo federal, em 2018, sem o ônus de ter que aplicar um estelionato eleitoral à la Dilma. Porque, apesar das impopulares Reformas Trabalhista e da Previdência terem mais a cara liberal tucana do que a malemolência peemedebista, os pré-candidatos sabem que dificilmente serão eleitos se tentar empurrá-las para cima dos eleitores.
”O Brasil é mais forte que qualquer crise. Os líderes verdadeiros não recuam”, disse o presidenciável João Doria. ”O Brasil não quer populismo. O Brasil quer reformas”, afirmou o outro presidenciável Geraldo Alckmin.
Na verdade, quando perguntado o que o tal do Brasil quer, a resposta é outra. De acordo com pesquisa Datafolha divulgada em 01/05, 71% da população brasileira é contra a Reforma da Previdência. Pesquisa Vox Populi havia apontado que 93% rejeita o aumento da idade de aposentadoria para 65 anos e do tempo mínimo de contribuição para 25 anos. Ou seja, parece que o Brasil deseja ser tratado com respeito no trabalho e ter dignidade quando for mais velho.
No dia 18 de maio, durante pronunciamento que fez à imprensa, dizendo que não renunciaria diante das denúncias, Temer disse que ”todo um imenso esforço de retirar o país de sua maior recessão pode se tornar inútil. E nós não podemos jogar no lixo da história tanto trabalho feito em prol do país”. Mais do que uma chantagem, um muxoxo.
Isso faz lembrar outra declaração dele, do final de abril. Em entrevista ao apresentador Ratinho, soltou (mais) uma pérola machista que ”os governos agora precisam passar a ter marido, viu, porque daí não vai quebrar”. Creio que, portanto, podemos interpretar seu desabafo ao empresariado dessa forma: ”Sempre fiz tudo o que você quis em nosso casamento e, agora que eu tô com problemas, você me troca por outro? Não sou perfeito, tento dar o máximo. Espero que sua vida seja um inferno sem mim”.
Não dá para dizer que Temer não se esforçou em agradar. Tivemos a aprovação da PEC do Teto dos Gastos (impedindo o crescimento do investimento para a melhoria do serviço público por 20 anos e afetando áreas como educação e saúde) e da Lei da Terceirização Ampla (precarizando trabalhadores e impondo a eles perdas salariais e aumentos de jornadas), entre outros. Está em estágio avançado o trâmite da Reforma Trabalhista (que pode reduzir a proteção à saúde e à segurança do trabalhador). Apenas a Reforma da Previdência (em que trabalhadores pobres serão afetados, seja pelo aumento do tempo de contribuição mínimo para 25 anos, seja pelo aumento na idade mínima para obter o auxílio a idosos pobres) segue lenta porque os parlamentares já perceberam que devem ser punidos pela população nas próximas eleições.
O grandes empresariado teme que Temer esteja ferido de morte e incapaz de entregar a Terra Prometida. E, no caso de sua substituição, prefere uma eleição indireta pelo Congresso Nacional (onde detém larga influência) do que uma eleição direta após cassação de chapa eleitoral – saída mais democrática. Afinal, sabe que apenas um governo que não foi eleito e que não pretende ser reeleito e aceita ser impopular pode fazer as mudanças que eles querem.
Difícil saber se eles vão conceder mais esse voto de confiança a Temer. Mas, vejamos a zoologia. Segundo a ciência, Patos Amarelos não se incomodem com denúncias de corrupção. Uma análise sobre a Operação Lava Jato, por exemplo, mostra que alguns Patos Amarelos não se importam com um ”rouba, mais faz”, desde que continuem a ser bem alimentados. A ciência mostra que há Pato Amarelo que consegue nadar com lama até o bico.