Bolsista do Observatório da Educação é o primeiro mestre da etnia Ye’kuana

Por Lucas Lopes, na Capes

Castro Costa da Silva, bolsista do programa Observatório da Educação (Obeduc), é o primeiro membro da etnia Ye’kuana a obter o título de mestre. Com a dissertação “Transformações socioespaciais das comunidades indígenas Ye’kuana e Sanumã na região de Auaris – Roraima”, o estudante recebeu nota máxima em sua defesa de mestrado em Geografia na Universidade Federal de Roraima (UFRR).

Em seu trabalho, Castro tematizou problemas enfrentados atualmente por comunidades indígenas, como a escassez de recursos naturais. O bolsista relata que mudanças culturais como a sedentarização afetam a maioria das comunidades indígenas atualmente. “Ao longo dos anos, a sedentarização das comunidades indígenas começou a trazer como consequência a escassez dos recursos naturais, como falta de caça, pesca e de solos férteis para as roças, palhas e madeiras, que ficavam cada vez mais distantes. As comunidades indígenas eram caracterizadas pela mobilidade”, informou o mestre em Geografia.

Duas comunidades indígenas foram o seu objeto de pesquisa: Ashikamau (dos Sanumã subgrupo yanomami) e Fuduwaadunha (dos Ye’kuana do tronco linguístico Caribe), localizado na região de Auarís, no município de Amajari, na Terra Indígena Yanomami, estado de Roraima. “Essas duas comunidades ocupam o mesmo espaço há mais de meio século, desde a chegada do homem branco à região em 1963. Atualmente, é um polo de atração para moradores de outras comunidades, incluindo comunidades indígenas da Venezuela”, explicou Castro.

Segundo o pesquisador, a presença de políticas públicas, como postos de saúde e escolas, além de missionários e militares atraíram as populações indígenas. “O carro-chefe de tudo isso foi a construção da pista de pouso que, na década de 90, foi ampliada e asfaltada”, completou o geógrafo. Para a orientadora da dissertação, Maria Bárbara de Magalhães Bethonico, os vários mapas e levantamentos sobre o uso e organização do espaço que Castro produziu servem de referência para os moradores da área nas discussões sobre a presença Sanumã junto aos Ye’kuana e o crescimento populacional. “O estudo conseguiu elucidar a situação que leva a conflitos no uso dos recursos naturais (caça, pesca, locais para roça)”, acrescentou.

Comunidades Indígenas

Entender a dinâmica das comunidades indígenas é fundamental na formação de um geógrafo, explicou Castro. “Antes de entrar na faculdade, eu me perguntava: como chegamos aqui? Será que sempre vivemos aqui? Nossos vizinhos Sanumã vieram de onde? Consegui entender todos esses questionamentos durante nosso trabalho. A ciência da geografia tem muito a contribuir com os povos indígenas no Brasil”, ponderou.

Por meio de sua formação, Castro pretende contribuir na construção de um Plano de Gestão Territorial e Ambiental na Terra Indígena Yanomami. “Os organizadores sempre me convidam para dar palestra sobre Plano de Gestão Territorial e Ambiental, sobre o uso do espaço e dos recursos naturais. Essa é a maior contribuição que posso dar daqui para frente ao diálogo entre meu povo e os não-indígenas, principalmente com os órgãos públicos”, diz Castro.

Oportunidades

Para o geógrafo, os povos indígenas do Brasil tiveram ampliado seu acesso à educação a partir dos anos 2000, por meio de iniciativas de reserva de vagas. “Atualmente sou mestre e o que me garantiu essa conquista foi a bolsa do Obeduc”, refletiu o pesquisador. Para Maria Bárbara, a abertura de espaços específicos para a formação de alunos indígenas foi decisiva para consolidar a oferta de oportunidades. “Sempre nos deparamos com vários pesquisadores interessados em estudar os índios, porém existia pouca abertura para que esses indígenas realizassem suas próprias pesquisas. Com a criação de institutos como o Insikiran, na UFRR, os alunos indígenas podem promover um diálogo sobre outras formas de ver, pensar e viver no mundo”.

Castro pretende prosseguir na vida acadêmica e pesquisar o uso do território e as mudanças culturais em seu doutorado. “Esses são os temas que estamos discutindo atualmente em nossas comunidades. Escolas foram implantadas sem muitas discussões e hoje as comunidades sofrem com a falta de jovens para realizar os trabalhos comunitários, pois a maioria deles [dos jovens] vivem nas cidades. A partir dessas pesquisas, quero conhecer o mundo em que vivemos e como ele funciona”, concluiu o bolsista.

Obeduc

O programa Observatório da Educação, resultado da parceria entre a Capes, o Inep e a Secadi, foi instituído pelo Decreto Presidencial nº 5.803, de 08 de junho de 2006, com o objetivo de fomentar estudos e pesquisas em educação, que utilizem a infraestrutura disponível das Instituições de Educação Superior (IES) e as bases de dados existentes no Inep. O programa visa, principalmente, proporcionar a articulação entre pós-graduação, licenciaturas e escolas de educação básica e estimular a produção acadêmica e a formação de recursos pós-graduados, em nível de mestrado e doutorado.

Maria Bárbara Bethonico orientou o trabalho de Silva sobre problemas indígenas. Foto: Arquivo Pessoal

 

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