O Direito à Vida: Moradores Comemoram a Favela e Lutam por Seus Direitos

Brian McNamara – RioOnWatch

O Rio de Janeiro é conhecido mundialmente por belos bairros à beira-mar, como Copacabana, e a impressionante estátua do Cristo Redentor, mas para além das vistas panorâmicas da borda sul da cidade, existe uma realidade contrastante que também, é maravilhosa. Dispersas pelo Rio estão mais de 1000 favelas, que ocupam um papel crucial como a espinha dorsal da economia do Rio e a alma da cultura carioca. Habitada por mais de um quinto da população da cidade, essas comunidades são o lar de uma grande parte da classe trabalhadora do Rio. Nas palavras de Claudia Rose, moradora da Maré, na Zona Norte do Rio, “se todas as nossas favelas não trabalharem um dia, a cidade para”. Além disso, esses bairros coesos têm moldado a cidade por mais de cem anos através de expressões culturais como música, dança e grafite, criando a vibrante cidade que existe hoje. No entanto, apesar de fornecer a essência econômica e cultural que sustenta o Rio por gerações, as favelas têm sido constantemente marginalizadas da cidade formal, tanto por outros grupos da sociedade carioca quanto nas políticas governamentais excludentes. Como resultado, os moradores das favelas formaram uma cultura de resistência para superar preconceitos e a repressão sistemática.

Para comemorar esta história resiliente e prosseguir com a luta pela integração igualitária, a vereadora Marielle Franco nascida e criada na favela da Maré, em colaboração com o Museu da Maré, organizou uma série de discussões, oficinas e atividades culturais nos dias 23 e 24 de junho no museu. O evento, que incluiu comida, debates, performances de dança pelo grupo APAFUNK, esquetes realizados pelo Projeto Entre Lugares Maré e oficinas para desenvolver formas de resistência e expressão, reuniu moradores da Maré, Alemão e Providência, bem como outras favelas, para promover a comunidade e motivar a ação coletiva.

O evento começou com uma discussão conduzida por Marielle Franco, Ana Paula Lisboa e Claudia Rose, que falaram de suas experiências pessoais com a exclusão da cidade formal e do orgulho que sentem da comunidade. O palco foi aberto para outros moradores, que expressaram o que o direito à favela significa para eles.

A discussão focou na identificação e busca pelos direitos dos moradores, tanto os garantidos na legislação brasileira quanto nos direitos humanos internacionais. Central nesta luta está o que Marielle chamou de “Direito à Vida”. Ela explicou: “A Maré é um lugar que deveria ser tratado e elaborado não enquanto periferia, mas enquanto um bairro da cidade que tem acesso a transporte, circulação, organização, processos econômicos e empreendedores”. Muitas vezes, são negadas oportunidades aos moradores devido a políticas e preconceitos persistentes que os tratam como entidades separadas e não como parte da cidade formal. Especificamente, a infraestrutura pública é pobremente mantida e as necessidades por transporte público não são satisfeitas, tornando difíceis as viagens entre as comunidades e o resto da cidade. Além disso, as escolas e os serviços de saúde também são mau conservados, o que pode limitar ainda mais as oportunidades disponíveis aos moradores. Esses fatores se combinam tornando a vida diária difícil para moradores, inibindo a atividade econômica e a interação com a população do resto da cidade.

Além disso, muitas vezes é negado aos moradores o direito de existir com dignidade como membros iguais da sociedade. A falsa representação das favelas na mídia, a negligência do governo e o racismo se combinam para criar estereótipos imprecisos das favelas como áreas empobrecidas e perigosas, habitadas principalmente por criminosos. Como resultado, muitos moradores experimentam condescendência e discriminação advindas de moradores da cidade formal por causa de onde moram. Em alguns casos, até mesmo são negados empregos a moradores ou a entrada em programas de educação por serem de favelas. Apesar da prevalência desses estereótipos, muitos moradores têm grande orgulho de suas comunidades e exigem o respeito e a aceitação da sociedade formal da cidade. Ana Paula Lisboa comentou sobre isto dizendo que “as pessoas da Zona Sul precisam saber que a gente não mora na Maré só por necessidade, mas é também porque a gente quer morar aqui”. Os moradores da cidade formal precisam desconstruir estereótipos nocivos e começar a reconhecer os valores que as favelas trazem para o Rio.

Finalmente, a discussão centrou-se no direito à segurança e à liberdade frente a opressão do Estado. O conflito violento é comum em muitas comunidades como resultado da atual guerra contra as drogas, que falha em acabar com o comércio de drogas e provoca confrontos sangrentos entre policiais e traficantes em muitas comunidades. No clima atual, muitos moradores sentem que seu bem-estar e direitos básicos são fundamentalmente desconsiderados. “A gente não quer direitos sociais só quando pararem com essa guerra às drogas ou quando o tráfico terminar. Como cidadãos da cidade e como cidadãos da favela queremos a partir de hoje”, afirmou Marielle, exigindo que a segurança comunitária esteja na vanguarda das políticas de segurança.

Além desta conversa inicial, a noite de sexta-feira incluiu uma série de oficinas destinadas a capacitar os moradores na busca por seus direitos. Aulas de dança, grafite, produção cultural e teatro proporcionaram ferramentas de expressão cultural para celebrar a identidade da favela e serem usadas como forma de resistência. Outra oficina focou na memória e na história de Maré, para fortalecer a identidade local. Além disso, uma aula sobre violência policial forneceu técnicas pacíficas para enfrentar a violência policial e prevenir abusos.

O sábado incluiu conversas importantes sobre o direito à cidade, discussões sobre saneamento e saúde, educação e a discriminação por parte das forças de segurança pública. O dia também incluiu um esquete do projeto Entre Lugares Maré centrado na homofobia e na violência contra as mulheres. As discussões diversas e poderosas proporcionaram aos moradores fóruns para expressarem suas experiências e frustrações, continuarem a fortalecer identidades culturais e adquirirem habilidades para fortalecer a resistência. O evento celebrou e promoveu a construção do legado da resistência das favelas.

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