O advogado Fellipe Simões Duarte, especialista em Direito Ambiental e Membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MG, afirma que os processos contra a Samarco estão caminhando a passos lentos porque a burocratização atrapalha bastante o andar da Justiça brasileira. Para sua maior lerdeza, foi suspenso o processo criminal contra as 21 pessoas acusadas de homicídio com dolo eventual porque os advogados dos réus alegaram terem sido utilizadas provas ilícitas.
Por Luciana Gaffrée para Combate Racismo Ambiental
A Samarco, a Vale e a BHP Billiton são acusadas de vários crimes nas esferas criminal, civil e administrativa, devido à maior tragédia ambiental do Brasil, o rompimento da barragem do Fundão (MG), em 5 de novembro do ano passado.
O Ministério Público Federal de Minas Gerais denunciou 21 pessoas acusadas de homicídio com dolo eventual. Emanuely Vitória, de 5 anos e Thiago Damasceno Santos, de 7 anos, são duas das 19 vítimas soterradas pela lama.
Os rejeitos não só mataram crianças, adultos e idosos, mas também cerca de 1 trilhão de organismos vivos. Além disso, eliminaram do mapa o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, destruindo a história e as memórias dos sobreviventes, expulsos de suas terras e com suas vidas radicalmente alteradas.
Foram 600 quilômetros de destruição tangível e intangível. Relatórios da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES) informam sobre as consequências atuais deste desastre ambiental, entre elas os níveis de metais apresentando concentrações superiores aos valores permitidos pela legislação ambiental e a massa de rejeito presente na calha dos rios disponibilizando contaminantes para o meio ambiente por muito tempo ainda. Para ter acesso aos relatórios, clique aqui.
Para o advogado Fellipe Simões Duarte o juiz, ao suspender o processo criminal contra as 21 pessoas acusadas de homicídio com dolo eventual, agiu com cautela, mandando oficiar às companhias telefônicas para apurarem se efetivamente houve escuta telefônica ilícita. Se forem ilícitas, deverão ser desconsideradas.
Entretanto, o advogado alerta para o fato de que se forem as principais provas, ao serem desconsideradas, poderão gerar uma anulação de todo o processo.
Se por um lado ninguém quer a anulação do processo por homicídio doloso, pois 19 pessoas morreram, entre elas duas crianças, por outro a Constituição Federal diz que são inadmissíveis quaisquer provas ilícitas. Vale lembrar que nenhum juiz deve jamais se colocar acima da Constituição, pontualizou o advogado.
A lentidão jurídica continua e, com relação à responsabilidade administrativa, não é diferente. O advogado explica que a Samarco terá que pagar multas, mas recorrerá da decisão e isso poderá levar outro bom tempo.
Como não poderia ser de outra forma, também na esfera da responsabilidade civil a coisa anda a passos de tartaruga. Há um acordo preliminar, porém como é um processo muito complexo, onde o prejuízo é difícil de ser calculado, porque o dano ambiental não afeta só o meio ambiente, mas também pessoas, empresas, deixando uma pegada quase incomensurável, como mensurar efetivamente qual o tamanho do dano ambiental? Sendo assim, este processo também está prorrogado, com prazo em aberto.
Soma-se a isso uma justiça muito lenta, onde um processo simples não demora menos de três anos e um processo como este, não sendo anulado, quem sabe não durará uns dez anos ou até mais? Sorte para a Samarco, que terá todo o tempo do mundo para tomar as providências compensatórias cabíveis.
É óbvio que os advogados da Samarco vão se utilizar de todos os meios legais para esticar ao máximo o processo. A lei o permite. Lentidão gera impunidade. Portanto, o que se precisa é de uma justiça mais efetiva, com julgamentos mais rápidos, afirma o advogado.
Tem chance de acabar em pizza? Tem chance. Afinal, no Brasil tudo é possível.
Para o advogado Fellipe Simões Duarte, as leis de proteção ao meio ambiente no país estão sofrendo um rápido retrocesso, onde protegê-lo significa caminhar em passos lentos.
E quando se busca desburocratizar o processo, não é para proteger o meio ambiente, mas para facilitar a obtenção do licenciamento. Cada vez mais o Brasil afrouxa os procedimentos ambientais para garantir investimentos.
*Luciana Gaffrée é jornalista, formada pela Universidade da República do Uruguai. Mora em Montevidéu, Uruguai.
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Local: Distrito de Bento Rodrigues, Município de Mariana, Minas Gerais. Foto: Rogério Alves/TV Senado