Casais heterossexuais, homoafetivos e mulheres podem buscar seu doador pela internet. Estudo mostra que 52% buscam doadores com olhos azuis. Entre estes, nem 1% é negro
Por Débora Lopes, na Vice/Outras Palavras
As comédias românticas já mostraram muitas vezes a clássica cena de um sujeito que doa seu esperma: revistas e filmes pornôs à disposição, um recipiente para coletar o “suco do amor” e uma salinha mais fria que corredor de hospital. No Brasil, a procura por um doador de sêmen importado aumentou mais de 2.500% entre 2011 e 2016, segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). A questão é: por que os brasileiros querem que o pai biológico de seus filhos seja um gringo?
Casais heterossexuais, homoafetivos e mulheres a fim de encarar uma “produção independente” podem buscar seu doador até mesmo pela internet. Os dois estados que mais importaram esperma foram São Paulo (52%) e Rio de Janeiro (12%), aponta o 1° Relatório de Importação de Amostras Seminais para uso em Reprodução Humana, divulgado pela Anvisa na última quarta (9).
Além dos itens mais comuns, como cor dos olhos, da pele, do cabelo e tipo sanguíneo (poderíamos até chamá-los de “clássicos”), é possível fazer uma busca avançada e escolher signo, animal favorito, religião, objetivos de vida (reconhecimento, estabilidade financeira, Deus, casamento) e até mesmo talentos e habilidades (culinária, tecnologia, música, artesanato) do doador.
A franquia brasileira do Fairfax Cryobank, banco de sêmen dos Estados Unidos que atua em mais de 50 países, disponibiliza esse tipo de informação em seu site. Porém, o biólogo e diretor científico da unidade, José Roberto Alegretti, afirma que elas não são tão relevantes. “A primeira preocupação é a semelhança e o histórico médico”, disse, em entrevista à VICE. “A pessoa quer uma cópia dela e uma gestação saudável. [Quando se trata de] um casal, o homem quer um clone dele. Ele quer buscar um doador que seja igual porque ele vai ter um filho e quer que o filho se pareça com ele.”
O que é curioso, visto que o relatório da Anvisa mostra que 52% das buscas foram por doadores com olhos azuis e, em segundo lugar, castanhos (24%). E olhos azuis não são um padrão brasileiro. A maioria dos doadores é formada por caucasianos (95%). Negros sequer alcançaram 1% nas doações.
“Existe uma falsa ideia de que as pessoas querem usar amostras importadas porque querem ter filhos loiros de olhos azuis. Mentira. Isso não existe”, pontua Alegretti. “Elas querem ter segurança, informação. E os bancos norte-americanos, em comparação ao banco brasileiro, oferecem uma gama de informações do doador muito maior, assim como uma gama de exames genéticos.”
Um dado relevante é o aumento da importação de sêmen gringo feita por casais homoafetivos e mulheres que querem ser mães solo. Em 2014, 78 mulheres fizeram a solicitação da amostra seminal. Já em 2016, o número mais que dobrou. Foram 167 mulheres. O gráfico acima detalha isso bem.
Se a semelhança é uma busca essencial para essas famílias, a tecnologia tem facilitado o trâmite todo. Alegretti explica que é possível recorrer ao “Face Match”, uma análise aprofundada a partir da foto de quem busca o esperma e do próprio doador. Ali, características físicas são comparadas por profissionais para garantir que exista a maior paridade possível entre as duas partes.
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.