MPF/AP quer suspensão dos efeitos do decreto de extinção da Renca

Para a instituição, medida viola direitos fundamentais e pode resultar em ecocídio na Amazônia

Ministério Público Federal no Amapá

Em ação ajuizada nesta segunda-feira (28), o Ministério Público Federal no Amapá (MPF/AP) pede à Justiça Federal concessão de tutela de urgência para suspender os efeitos do Decreto nº 1942 de 22/8/2017 que extingue a Reserva Nacional do Cobre e seus Associados (Renca). O MPF/AP defende que a medida adotada pela Presidência da República, além de contrariar a Constituição Federal, põe em risco a preservação do meio ambiente e fere direitos fundamentais dos amazônidas, em especial o direito à consulta prévia.

Na ação, o MPF/AP argumenta que, embora a instituição da Renca tenha tido o objetivo de proteger o patrimônio mineral da União, não há dúvidas de que também criou uma área de proteção ambiental qualificada, devido à função conservacionista de recursos naturais que possui. O órgão ressalta que, a partir da Constituição Federal de 1988, as áreas de proteção ambiental passaram a ter regime jurídico próprio para supressão ou alteração. Assim, a extinção via decreto presidencial “representa invasão da competência legislativa do Congresso Nacional, dado que apenas a este caberia desafetar ou restringir os limites de uma unidade de conservação, por meio de lei específica”.

A extinção da Renca, alerta o MPF/AP, “ameaça a diversidade biológica, o ambiente natural, a integridade das unidades de conservação federal e estadual e o modo de vida dos povos indígenas e população tradicional daquela região, tendo em vista os grandes impactos socioambientais decorrentes de atividades minerárias”.

Para o órgão, o poder público também não teve cautela quanto a antever os perigos que a extinção da Renca pode ocasionar às unidades de conservação e terras indígenas vizinhas ao permitir a instalação de empreendimentos minerários que notoriamente causam grandes impactos ambientais.

Ao agir à revelia da comunidade e lideranças indígenas locais, a Presidência da República violou o direito de consulta prévia estabelecido pela Convenção 169, da OIT. Nesse sentido, o MPF/AP enfatiza: “o Amapá não é mais um Território Federal, autarquia de natureza especial da União, sobre o qual esta pode livremente dispor. Não é mais possível a instituição de projetos como o da ICOMI (Manganês em Serra do Navio, de 1954-1997), sem que antes toda a população e estâncias políticas, econômicas e comunidade científica local possam intervir”.

O MPF/AP salienta que desconhece caso de efetivo sucesso que alie a atividade minerária à proteção da natureza, restando inegáveis prejuízos à população do entorno e ao meio ambiente local. Portanto a simples instalação de empreendimento minerário, pesquisa e lavra não significa desenvolvimento econômico e social de uma região.

Ecocídio – Para o MPF/AP, a extinção da Renca viola diversos compromissos internacionais firmados pelo Brasil, configurando-se verdadeiro “ecocídio”, pois causará a destruição em larga escala do ecossistema amazônico, com a maximização da exploração mineral de área preservada. Desde o final do ano passado, o Tribunal Penal Internacional decidiu classificar o ecocídio como crime contra a humanidade.

O entendimento do Direito Internacional foi, portanto, ampliado para proteger adequadamente o meio ambiente. “Assim, a ampliação não planejada de exploração mineral em área de proteção ambiental qualificada na Amazônia, como a Renca, ensejará grave lesão ao meio ambiente e, consequentemente, a toda humanidade”.

Renca – A Renca, instituída por decreto em 1984, corresponde a uma área de aproximadamente 4,6 milhões de hectares. Quase metade está localizada no sudoeste do estado do Amapá, abrangendo os municípios de Laranjal do Jari, Mazagão, Pedra Branca do Amapari e Porto Grande. A reserva encontra-se encravada em região de inúmeras áreas legalmente protegidas, com destaque para a Terra Indígena Wajãpi, Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, Florestas Nacional do Amapá e Estadual do Amapá, Reserva Extrativista do Cajari, Reserva do Desenvolvimento Sustentável do Uiratapuru e Estação Ecológica do Jari. No Pará, nas Terras Indígenas Rio Paru D’Este e TI Parque Tumucumaque, que congregam as etnias Aparai Wajãpi Wayana, Ararai Katxuyana e Tiryó Wajãpi Wayana.

Confira aqui a íntegra da ação.

Imagem: Governo federal reabriu a área na Amazônia para a exploração mineral – AFP

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