José Moroni: Reforma política aprovada no Congresso mantém sistema excludente

Em entrevista ao Observatório da Sociedade Civil, José Antônio Moroni apontou divergência total entre as novas medidas e a proposta da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, do qual é integrante.

Por Felipe Sakamoto, do Observatório da Sociedade Civil, no Inesc

No início deste mês, o presidente Michel Temer sancionou os projetos de reforma política aprovados por Câmara e Senado. A velocidade da tramitação das propostas em ambas as Casas se deu para que as novas regras possam valer para as eleições de 2018.

Entre as mudanças estão: fundo público para financiamento de campanhas, alterações sobre prestação de contas dos/as candidatos/as, propaganda eleitoral, financiamento coletivo e parcelamento de multas, bem como questões como coligações e cláusulas de barreira.

A aprovação do projeto de lei 8.612/17, chamado de Fundão, cria um fundo público destinado ao financiamento de campanhas com valor estimado em R$ 1,7 bilhão para o próximo ano, porém os/as candidatos/as poderão injetar dinheiro próprio em suas campanhas sem um teto de valor. O fundo partidário – constituído por créditos orçamentários da União, multas e outros recursos financeiros – continua a valer com orçamento de R$ 1 bilhão. Em relação aos financiamentos privados, continua a determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou inconstitucional a doação de pessoas jurídicas para campanhas eleitorais.

A chamada cláusula de barreira acaba com a coligação de partidos para eleições proporcionais a partir de 2020 e estabelece a cláusula de desempenho, que gradativamente impede a propaganda de rádio e tv e o repasse de dinheiro do fundo partidário a partidos pequenos.

O integrante da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político e membro do colegiado do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) José Antônio Moroni avalia as recentes mudanças no sistema eleitoral e as compara com as propostas da Plataforma, que surgiu em 2004, a partir da articulação de cerca de 40 entidades, entre as quais a Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais (Abong), que atuam pela ampla reforma do sistema político brasileiro.

Confira a seguir a entrevista na íntegra.

Observatório da Sociedade Civil – Como você avalia a reforma política sancionada pelo presidente Michel Temer? Como ela dialoga com a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político?

José Antônio Moroni – Não podemos falar que foi votada uma reforma política. O que o Congresso votou foi um arremedo, sem o mínimo de coerência entre as propostas. Uma vergonha perder tanto tempo discutindo o tema para chegar a isso. O que está péssimo piorou com os vetos do Temer, principalmente no que diz respeito ao autofinanciamento, candidatos ricos bancando as suas campanhas. O senso comum pode pensar: “Que bom! Vão colocar dinheiro do bolso”, mas sabemos que não é assim. Este dinheiro retorna depois com os  negócios espúrios feitos com o Estado. Outra coisa é que a desigualdade vai permanecer, pois uma candidatura das forças populares não terá condições de disputar com as candidaturas de ricos. Manteve-se o sistema, é o velho ditado, mudar para tudo ficar igual. Neste sentido, esta reforma aprovada não dialoga com o que a Plataforma propõe que é ter um sistema político alicerçado na soberania popular. Não tivemos nada de fortalecimento da democracia direta, nada de democratização da informação e da comunicação, nada de democratização do sistema político, nada que enfrente a subrepresentação das mulheres, do povo negro, dos povos indígenas, das juventudes nos espaços de poder. E criaram um sistema de financiamento que só favorece aos grandes partidos e os que já são políticos.

Qual é a perspectiva para os partidos menores em 2018?

José Antônio Moroni – A cláusula de desempenho aprovada não vai surtir o efeito que dizem que vai, que é o de inviabilizar partidos de aluguel. O que inviabiliza os partidos de aluguel é não permitir que o tempo de rádio e tv se incorpore quando das coligações na majoritária, por exemplo.  Na verdade, com poucas exceções, não temos partidos no Brasil. O que temos são grupos de interesses que se juntam para tomar o Estado e colocá-lo a seu serviço. Partido tem densidade social e política, tem programa, tem ideologia, tem militância, tem democracia interna e isso está longe de acontecer.

Como o fim das coligações para cargos de deputados/as e vereadores/as para 2020 afeta as dinâmicas entre os partidos?

José Antônio Moroni – Em tese, o fim das coligações nas eleições proporcionais é correta, mas devia vir com a possibilidade de criação de federações partidárias, quando um conjunto de partidos se juntam para atuar de forma conjunta, com base no programa em um tempo longo, por exemplo, até as próximas eleições. A coligação é apenas para o momento das eleições. Proibiram as coligações e não aprovaram a federação. Isso é para fortalecer os partidos que já são grandes. Só serve para os interesses das elites políticas e econômicas.

Por que a reforma foi aprovada agora, um ano antes das eleições?

José Antônio Moroni – Todas as reformas eleitorais aprovadas no Brasil foram assim, em cima da hora, sem grandes debates com a sociedade e unicamente pensando nas próximas eleições e em como manter os mesmos nos espaços de poder. Esta é a lógica. Isso só muda se o povo propuser uma ampla reforma através de uma assembleia constituinte exclusiva e soberana do sistema político por meio da qual o povo decida que sistema político quer, que modelo de democracia quer, qual poder quer.

Vamos falar mais sobre a Reforma do Sistema Político?

Foto: Luis Macedo / Câmara dos Deputados

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