Lula deveria agradecer a Doria por ter travado Alckmin por um ano, por Leonardo Sakamoto

Blog do Sakamoto

Lula e Bolsonaro vem dividindo as duas primeiras posições da corrida eleitoral em sucessivas pesquisas de opinião. E o PSDB tem parcela de responsabilidade por esse cenário.

A delação da JBS, que mostrou Aécio Neves sacando milhões dos controladores da empresa como se fossem um caixa eletrônico e usando o primo como mula para transportar o dinheiro, ajudou a jogar uma pá de cal sobre a credibilidade do presidente do partido e, junto, feriu o próprio PSDB. As tentativas públicas de salvar o pescoço de Aécio empurraram ainda mais uma parcela do voto antipetista focado no combate à corrupção e na ”ordem” para o colo de Jair Bolsonaro. Não necessariamente por convicção, mas por exclusão, como aquele que teria mais chances de derrotar o PT ou um de seus indicados.

O mais irônico, contudo, é o fato de João Doria, que não perde uma oportunidade para dizer que visitaria Lula no presídio da Papuda, ter ajudado, involuntariamente, o próprio. Sua vontade incontrolável e afobamento visando à Presidência da República, que começou assim que ele assumiu a Prefeitura de São Paulo, fez com que o tucanato gastasse praticamente um ano em batalhas internas desnecessárias.

Perdeu-se não apenas precioso tempo que poderia ter sido gasto em organização e consolidação de alianças para a candidatura natural do governador paulista ao Palácio do Planalto, mas também criou focos de estresse entre Michel Temer e o próprio. Para Alckmin, que não gosta de tomar esse tipo de decisão, melhor seria que sua candidatura tivesse decantado naturalmente, bem como o reassentamento do PSDB como a liderança eleitoral do centro e centro-direita. E que, claro, não precisasse assumir como presidente do partido para preparar o terreno a si mesmo.

Ao invés de gastar energia para articular nos bastidores um freio a Doria, Alckmin poderia ter se dedicado a uma agenda de construção de sua imagem no Nordeste e entre a população mais pobre – em que o PT segue reconquistando espaço. Mas, atingido por fogo amigo, teve que resolver o problema doméstico primeiro. Alckmin conseguiu desidratar Doria – que acabou dando um fatality nele mesmo, acusado de distribuir ”ração humana para pobres”, em um país com histórico de insensibilidade de governantes com relação à fome. A análise é compartilhada por pessoas do círculo próximo de Lula e correligionários de com os quais este blog conversou.

O PSDB tenta desembarcar do governo como etapa da campanha do ano que vem. Além de extremamente impopular, fato que o crescimento econômico não deve mudar, Temer (com o apoio dos tucanos) patrocinou reformas que afetarão diretamente a qualidade de vida da população. Da expansão do trabalho intermitente à demissão em massa e substituição de empregados por colaboradores, as mudanças farão com o atual ocupante da Presidência seja um elemento radioativo em plena campanha eleitoral. Ao mesmo tempo, Alckmin precisa da máquina da administração pública federal para crescer. As movimentações de Doria, que aceitava ser candidato batendo no peito com orgulho as impopulares reformas de Temer, não ajudou essa difícil costura política.

Enquanto isso, Lula seguiu crescendo em cima do discurso de que trará de volta os anos de bonança vividos durante sua administração – por mais que o ciclo de crescimento de commodities, que financiou os programas sociais, tenha se exaurido. E que irá levar às reformas a referendo, por mais que a convocação desse tipo de consulta seja uma prerrogativa do Congresso e não da Presidência.

A principal dúvida desta campanha, contudo, permanece aberta: Lula poderá competir ou será barrado por uma condenação em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal, em Porto Alegre, ou pela decisão de uma corte superior? O ponto é que é imprevisível qual será o impacto disso junto à sociedade se Lula continuar crescendo e chegar à campanha com uma significativa intenção de votos. Tanto em termos de convulsão social e política, quanto de transferência de votos.

Uma pesquisa a pouco menos de um ano das eleições não vale como previsão, mas como termômetro do momento. Em uma campanha em que emprego, segurança pública e poder de compra devem ser pautas mais importantes que o próprio combate à corrupção devido ao pragmatismo do eleitorado, é interessante acompanhar como os partidos vão construir suas narrativas e, principalmente, suas alianças. Seja como for, o PSDB larga atrasado, fragmentado, confuso. Talvez até demais.

Foto: Jorge Araujo/Folhapress

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