As autoridades universitárias da UFMG que foram conduzidos coercitivamente teriam solicitado ao delegado um exemplo concreto de prova e ele referiu-se a um livro “fora do escopo” do projeto e falsificação de assinaturas de bolsistas. Nada foi mostrado
Por Rudá Ricci[1] e Robson Sávio[2], na Revista Fórum
O sol ainda despontava timidamente por entre as montanhas de Minas Gerais quando uma diligência da Polícia Federal aportou na Reitoria da Universidade Federal de Minas Gerais, uma das universidades mais produtivas do país, um patrimônio nacional. No Ranking Universitário Folha (RUF), edição 2016, divulgado em agosto do ano passado, aparecia como o melhor ensino universitário do país. Somente esta qualificação já despertaria surpresa por este tratamento da PF. Mas a situação foi ainda mais inusitada e espetacular: oitos pessoas foram conduzidas coercitivamente à sede da Polícia Federal. Dentre eles, o Reitor Jayme Arturo Ramirez, a vice-Reitora Sandra Regina Goulart Almeida (que foi recém-eleita Reitora desta Universidade e, portanto, poderá ser preterida a ser empossada tendo esta ação como pretexto), Rocksane de Carvalho Norton (ex vice-Reitora), Heloísa Starling (coordenadora do projeto Memória e Verdade e ex-vice-reitora) e Alfredo Gontijo (ex-Presidente da Fundep – Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa da UFMG). Vale destacar que estas autoridades universitárias já prestaram esclarecimentos tanto à Controladoria Geral da União como ao Ministério Público Federal (MPF), o que eliminaria a necessidade da condução coercitiva. Todos têm residência fixa e podem, a qualquer momento, prestar esclarecimentos às autoridades.
O fundamento desta ação policial estaria justificado no Processo n. 45490-73.2017.4.01.3800 da 9ª Vara Criminal da Justiça Federal em Minas Gerais que trata “de requerimento em medida cautelar de busca e apreensão, prisão temporária e condução coercitiva, visando à instrução do Inquérito Policial n. 0391/2017-4-SR/DPF/MG, instaurado para apurar a prática do delito previsto no art. 312 do Código Penal, sem prejuízo de posterior adequação típica”.
Haveria, segundo o despacho judicial, “notícia de possíveis irregularidades na construção e implantação do “Memorial da Anistia Política do Brasil”, em Belo Horizonte/MG, com recursos do Ministério da Justiça e execução da Universidade Federal de Minas Gerais, eis que mais de R$ 20.000.000,00 de recursos públicos foram gastos ao longo de sete anos sem, contudo, haver qualquer resultado aparente acessível ao público. Segundo as investigações, as primeiras pesquisas realizadas no Portal da Transparência e publicações no Diário Oficial da União, além de confirmarem os pagamentos para a construção do memorial que se arrasta desde 2013 e atualmente encontra-se paralisada, apontaram outras suspeitas, mormente a contratação milionária da FUNDEP – Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa – para a produção do acervo a ser exposto no museu antes mesmo dele ser construído. Para a execução do Projeto, foi firmado o Acordo de Cooperação Técnica n. 001/2009, em 16/06/2010, entre o Ministério da Justiça e a UFMG, tendo a UFMG firmado posteriormente contratos com diversas pessoas jurídicas para implantar o projeto, entre as quais a Santa Rosa Bureau Cultural Ltda., a FUNDEP e a Construtora JRN Ltda.” (decisão disponível aqui )
Já o delegado da Polícia Federal Leopoldo Lacerda afirmou, em coletiva na sede da PF, que R$ 4 milhões teriam sido desviados do pagamento de bolsas de estágio e extensão na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Acusação que mantém alguma similaridade com as acusações que envolveram Luiz Carlos Cancellier de Olivo, então reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, cujo desfecho foi uma tragédia que comoveu toda comunidade acadêmica brasileira. Naquela oportunidade, uma denúncia anônima sobre Projetos de Ensino a Distância (EAD) e as divergências administrativas entre o corregedor (Rodolfo Hickel do Prado, nomeado pela administração anterior) e acabaram por gerar a prisão desse Reitor.
As autoridades universitárias da UFMG que foram conduzidos coercitivamente teriam solicitado ao delegado um exemplo concreto de prova e ele referiu-se a um livro “fora do escopo” do projeto e falsificação de assinaturas de bolsistas. Nada foi mostrado.
A questão central que cabe aqui ressaltar é a ofensiva que vem sistematicamente sendo colocada em ação para quebrar o prestígio e a autoridade de dirigentes universitários de nosso país. E, por consequência, buscar respaldo social para justificar a ineficiência das universidades públicas. Lembremos que a reforma trabalhista aprovada pelo Congresso Nacional recentemente vem desmontando o corpo docente em universidades particulares, como é o caso recente da demissão em massa de professores da Universidade Estácio de Sá.
Soma-se a esses casos, a ameaça de morte sofrida pelo reitor da Universidade Estadual de Alagoas (Uneal), Jairo José Campos da Costa, em julho deste ano, em virtude de a universidade ter decidido conceder ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva o título de Doutor Honoris Causa.
A uma semana do lançamento do relatório final da Comissão da Verdade em Minas Gerais (o mais extenso documento já produzido sobre violações aos direitos humanos praticadas durante a ditadura no estado), marcado para o dia 13 de dezembro – data que se recorda os 49 anos da decretação do famigerado AI-5 -, a ação desproporcional da PF foi interpretada por muitos como sinal do recrudescimento do estado persecutório, voltado a criminalizar os segmentos comprometidos com políticas de proteção, defesa, promoção e reparação dos direitos humanos no país.
Não por acaso, a operação ocorre um dia depois de a Anistia Internacional divulgar relatório informando que o Brasil é o país das Américas onde mais se matam defensores de direitos humanos.
As universidades como locus da ofensiva da extrema-direita tupiniquim
A ofensiva sobre as universidades parece sistemática. Trata-se de um movimento que compõe a mudança de hegemonia cultural por que passa nosso país neste início de século. Esta transição foi exposta por André Singer num seminário realizado na USP sobre o avanço do conservadorismo na capital paulista (ver gravação do seminário aqui ), realizado em agosto de 2012. Neste seminário, Singer aludia ao ensaio elaborado por Roberto Schwarz no final da década de 1960, intitulado “Cultura e política, 1964-1969”, publicado originalmente na França e trazido ao público brasileiro em 1978. Nesse ensaio, Schwarz diagnosticava uma intensa produção cultural sob o ethos progressista ou de esquerda, envolvendo produção literária, cinematográfica, dramatúrgica, entre outras. Afirmava o autor:
“Apesar da ditadura da direita há relativa hegemonia cultural de esquerda no país. Pode ser vista nas livrarias de São Paulo e Rio, cheias de marxismo, nas estreias teatrais, incrivelmente festivas e febris, às vezes ameaçadas de invasão policial, na movimentação estudantil ou nas proclamações do clero avançado. Em suma, nos santuários da cultura burguesa a esquerda dá o tom. Esta anomalia – que agora periclita, quando a ditadura decretou penas pesadíssimas para a propaganda do socialismo – é o traço mais visível do panorama cultural brasileiro entre 1964 e 1969.” (página 62).
Singer alertava, contudo, que no início do século XXI, esta hegemonia cultural progressista ou de esquerda começava a fraquejar.
A hipótese auxilia a compreendermos como as universidades brasileiras vêm se tornando um campo privilegiado de um importante e violento embate entre campos ideológicos, em especial, palco de uma ofensiva da extrema-direita que privilegia como inimigo preferencial os movimentos identitários liderados por neofeministas, coletivos LGBTT ou defensores do sistema de cotas. São inúmeros casos de organização estudantil nitidamente reacionários ou mesmo fascistas que conseguem aqui e acolá vitórias em processos eleitorais para eleição de direções de centros acadêmicos ou diretórios centrais de estudantes.
Esta investida parece ter desenhado as universidades como locus da mais vigorosa ofensiva da extrema-direita tupiniquim. Embora com parca fundamentação teórica ou profundidade acadêmica, polemistas radicais como Olavo de Carvalho e, em menor grau, Luiz Felipe Pondé são citados por tais agrupamentos reacionários universitários como referências. Pondé, inclusive, dedica parte de seus esforços e polêmicas para fundamentar o ressentimento dos agrupamentos juvenis de direita ao sugerir seu contínuo fracasso em conquistar o público feminino. Chegou a sugerir a necessidade da direita liberal jovem deixasse de ser chata e criar uma “direita festiva” (ver aqui ) . Mais adiante, lançou novo estímulo e orientação aos jovens de extrema-direita universitária ao diagnosticar que “o aumento de jovens de direita é inversamente proporcional aos professores de esquerda” (aqui). Não se tratava de uma mera provocação como sabemos agora. Tratava-se de assumir um papel de intelectual orgânico de jovens que reagiam à hegemonia política da esquerda no movimento estudantil e aos coletivos identitários juvenis.
O front de embate no campo educacional gerou, ainda, num programa fundamentado num intenso movimento reacionário norte-americano que aqui ganhou o nome de Escola Sem Partido. Vale registrar a dezenas de websites norte-americanos que pregam o confronto com o que denominam “doutrinação escolar” (ver ) que sugerem a doutrinação de “idiotas úteis” e o “uso das escolas para subverter o excepcionalismo norte-americano” (o valor nacional à liberdade pessoal e individual, que alimentaria a possibilidade de mobilidade social para atingir as expectativas de sucesso individual, base do “sonho americano”).
Outro ataque da extrema-direita às universidades brasileiras se dá através da “colonização” de professores e alunos através do patrocínio de bolsas de estudo de pós-graduação no exterior, patrocínio de congressos e eventos científicos internacionais e outras parcerias institucionais financiadas por fundações e think tanks norte-americanos, com vistas a ampliação dos segmentos de direita dentro das academias.
O que ocorreu nesta quarta-feira na UFMG não é um simples caso de investigação ou um fato isolado. Trata-se de uma ofensiva político-ideológica sobre o mundo acadêmico e educacional brasileiro.
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ANEXOS
NOTA OFICIAL DA COVEMG SOBRE AÇÃO POLICIAL NA UFMG
A Comissão da Verdade em Minas Gerais (COVEMG) recebeu com surpresa e indignação a notícia da realização da operação da Polícia Federal, ironicamente, intitulada “Esperança Equilibrista”.
Há um evidente ataque de setores conservadores e autoritários contra a Universidade brasileira e tudo o que essas instituições representam para o Brasil.
O ocorrido com o reitor da UFSC, a absurda nota de instituição financeira do exterior a criminalizar o ensino superior público, as inúmeras investidas contra os setores profissionais, artísticos e culturais que lutam contra o arbítrio e pela democracia real são claros sinais do estado de exceção em curso no país.
A construção do Memorial da Anistia em Belo Horizonte é um complexo projeto arquitetônico e de engenharia que envolve a reforma de prédios antigos e a construção de novos equipamentos em terreno com problemas estruturais. Portanto, o devido acompanhamento dessa obra, paralisada a fórceps pelo atual governo federal, não deveria ser objeto de ação policial e sim, de adequações financeiras, técnicas e administrativas.
Os acervos memorialístico e documental que compõem o Memorial, de vital importância para a história, a memória e a justiça em nosso país, demandam uma construção cuidadosa e diversificada.
Ao criminalizar uma das maiores Universidades do país abre-se a porta para a criminalização de todo um segmento que não se alinha aos setores autoritários. Nós da Covemg conhecemos bem essa metodologia.
Manifestamos nossa solidariedade aos dirigentes e ex-dirigentes da UFMG constrangidos nessa operação. Afinal, tendo residência fixa e sendo cidadãos do mais alto conceito, a condução coercitiva se transforma numa brutal violência, a evidenciar o obscurantismo que envolve ações da justiça e da polícia nesse momento histórico.
Estendemos à toda a comunidade da UFMG nossa solidariedade e apoio.
Belo Horizonte, 06 de dezembro de 2017.
COMISSAO DA VERDADE EM MINAS GERAIS
Carlos Melgaço Valadares
Emely Vieira Salazar
Jurandir Persichini Cunha
Maria Celina Pinto Albano
Maria Ceres Pimenta Spínola Castro
Paulo Afonso Moreira
Robson Sávio Reis Souza (coord.)
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AGENDA DE LUTA CONTRA A AÇÃO DA PF NA UFMG
14 HORAS: Coletiva de impressa na Assembleia Legislativa de Minas Gerais
17 HORAS: Assembleia da Comunidade Universitária e ato político em frente a Reitoria da UFMG no Campus Pampulha.
20 HORAS: Reunião da Frente Brasil Popular em solidariedade a UFMG e em defesa do Memorial da Anistia no Sindicato dos Jornalistas, av. alvares Cabral, 400, centro, BH.
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PUC Minas se manifesta sobre situação na UFMG
A Reitoria da PUC Minas acompanha atentamente e manifesta sua preocupação em relação à operação policial deflagrada na manhã desta quarta-feira, por meio da qual se fez a condução coercitiva para depoimentos de oito pessoas, entre elas o reitor da Universidade Federal de Minas Gerais, professor Jayme Arturo Ramirez, e a vice-reitora daquela Universidade, professora Sandra Regina Goulart Almeida.
Ao entender que tanto os órgãos de controle dos atos administrativos da União quanto a Polícia Federal têm sua legal competência de apuração e resolução de denúncias, a PUC Minas expressa sua defesa de que tais ações se deem dentro do amplo respeito à dignidade e aos direitos individuais e que as autoridades responsáveis pelas mesmas não cedam à tentação da espetacularização midiática que, como sabemos, pode, por antecipação, condenar e punir cidadãos de bem e que possuem inequívoco histórico de bons serviços prestados à sociedade e, no caso específico, à causa da educação.
Assinam:
Professor Dom Joaquim Giovani Mol Guimarães
Reitor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte
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Nota de parlamentares do PT sobre condução coercitiva na UFMG
*Nota Pública*
A operação da Polícia Federal que na manhã desta quarta (06) conduziu coercitivamente os atuais reitores e os ex-reitores da UFMG é uma prova de que a onda de arbitrariedade e exibicionismo no país está longe de acabar. Demonstra-se que o martírio do ex-reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier, não foi o suficiente para constranger aqueles e aquelas que hoje entendem ter o direito de utilizar prerrogativas legais para produzir perseguições de cunho político e pessoal.
Não há qualquer justificativa para a forma como a operação se deu. Não há qualquer justificativa para conduzir coercitivamente dirigentes universitários, cidadãos e cidadãs conhecidas publicamente, com endereço estabelecido, cumprindo suas funções e que, a qualquer momento, estariam à disposição da Polícia Federal para prestar as explicações que fossem necessárias. A banalização das conduções coercitivas visa apenas o espetáculo, a autopromoção de agentes públicos mais acostumados aos holofotes do que à prática de suas funções.
Temos explícito mais um episódio de uma ofensiva contra as conquistas progressistas dos últimos anos, desta vez dirigida contra a Educação brasileira e seu propósito de democratizar e libertar. Não por coincidência, o gesto de violência da Polícia Federal voltou-se contra o *Memorial da Anistia*, ação da UFMG que busca promover o resgate da verdade reprimida pela Ditadura Militar brasileira, contribuindo para restabelecer no Brasil o tão elementar direito à memória.
Somamo-nos à indignação já manifestada pela direção da UFMG, conclamando a sociedade para defender a instituição dessa caçada brutal, sustar a operação e punir disciplinarmente os responsáveis, em particular aqueles que autorizaram tamanha arbitrariedade.
_Dep. Margarida Salomão – Presidenta da Frente Parlamentar em Defesa das Universidades Públicas
_Dep. Carlos Zaratini (PT-SP) – Lider do PT na Câmara
_Dep. Angelim (PT-AC) – coordenador do núcleo de educação do PT na Câmara
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Nota da Andifes
Memória da Ditadura
A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), em nome dos (as) sessenta e três reitores(as) das Universidades Federais brasileiras, vem, mais uma vez, manifestar a sua indignação com a violência, determinada por autoridades e praticada pela Polícia Federal, ao conduzir coercitivamente gestores (as), ex-gestores (as) e docentes da Universidade Federal de Minas Gerais, em uma operação que apura supostos desvios na construção do Memorial da Anistia.
É notória a ilegalidade da medida, que repete práticas de um Estado policial, como se passou com a prisão injustificada do Reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo, da Universidade Federal de Santa Catarina, há pouco mais de dois meses. Apenas o desprezo pela lei e a intenção política de calar as Universidades, lócus do pensamento crítico e da promoção da cidadania, podem justificar a opção de conduzir coercitivamente, no lugar de simplesmente intimar para prestar as informações eventualmente necessárias. Ações espetaculosas, motivadas ideologicamente e nomeadas com ironia para demonstrar o desprezo por valores humanistas, não ajudam a combater a real corrupção do País, nem contribuem para a edificação de uma sociedade democrática.
É sintomático que este caso grotesco de abuso de poder tenha como pretexto averiguar irregularidades na execução do projeto Memorial da Anistia do Brasil, que tem, como uma de suas finalidades, justamente preservar, em benefício das gerações atuais e futuras, a lembrança de um período lamentável da nossa história. Na ditadura, é bom lembrar, o arbítrio e o abuso de autoridade eram, também, práticas correntes e justificadas com argumentos estapafúrdios.
As Universidades Federais conclamam o Congresso Nacional a produzir, com rapidez, uma lei que coíba e penalize o abuso de autoridade. E exigem que os titulares do Conselho Nacional de Justiça, da Procuradoria Geral da República, do Ministério da Justiça e do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria da União intimem seus subordinados a balizarem as suas atividades pelos preceitos constitucionais, especialmente quanto ao respeito aos direitos individuais e às instituições da República. A sociedade não pode ficar sob ameaça de centuriões.
A Andifes, as reitoras e os reitores das Universidades Federais solidarizam-se com a comunidade da Universidade Federal de Minas Gerais, com seus gestores, ex-reitores e com seus servidores, ao mesmo tempo em que conclamam toda a sociedade a reagir às violências repetidamente praticadas por órgãos e indivíduos que têm por obrigação respeitar a lei e o Estado Democrático de Direito. As Universidades Federais, reiteramos, são patrimônio da sociedade brasileira e não cessarão a sua luta contra o obscurantismo no Brasil.
Brasília, 06 de dezembro de 2017.
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NOTA DE EX-REITORES E EX VICE-REITORES DA UFMG
Nós, ex-reitores e ex-vice-reitores da Universidade Federal de Minas Gerais, tornamos pública nossa indignação pelos fatos ocorridos no dia 06 de dezembro, quando os atuais dirigentes da UFMG e outros membros da comunidade universitária foram levados, por medida coercitiva, à sede da Polícia Federal, para prestar depoimento em investigação que transcorre em sigilo.
Repudiamos o uso de medida coercitiva quando sequer foi feita uma intimação para depoimento, em claro descumprimento ao disposto nos artigos 201, 218 e 260 do Código de Processo Penal. Por condução coercitiva, entende-se, na interpretação do Desembargador Cândido Ribeiro, “um instrumento de restrição temporária da liberdade conferido à autoridade judicial para fazer comparecer aquele que injustificadamente desatendeu a intimação e cuja presença seja essencial para o curso da persecução penal, seja na fase do inquérito policial, seja na da ação penal.” Diante de tal definição, repudiamos inteiramente o uso da condução coercitiva e mais ainda a brutalidade e o desrespeito com que foram tratados o Reitor e a Vice-Reitora, as ex-Vice-Reitoras e outros dirigentes e servidores da UFMG, em atos totalmente ofensivos, gratuitos e desnecessários.
A UFMG e seus dirigentes sempre se pautaram pelo respeito à lei e pelo cumprimento de decisões judiciais. Os fatos ocorridos atingem, portanto, esta grande e respeitável instituição: a Universidade Federal de Minas Gerais, um patrimônio de nosso Estado e do país.
Reiteramos nossa confiança na Universidade Federal de Minas Gerais e na probidade de seus dirigentes, aos quais prestamos nossa total solidariedade e apoio.
Reitor Eduardo Osório Cisalpino – Gestão 1974-1978
Reitor José Henrique Santos – Gestão 1982-1986
Reitora Vanessa Guimarães Pinto – Gestão 1990-1994
Reitor Tomaz Aroldo da Mota Santos – Gestão 1994-1998
Reitor Francisco César de Sá Barreto – Gestão 1998-2002
Reitora Ana Lúcia Almeida Gazzola – Gestão 2002-2006
Reitor Ronaldo Tadêu Pena – Gestão 2006-2010
Reitor Clélio Campolina Diniz – Gestão 2010-2014
Vice-Reitor Evando Mirra de Paula e Silva – Gestão 1990-1994
Vice-Reitor Jacyntho José Lins Brandão – Gestão 1994-1998
Vice-Reitor Marcos Borato Viana – Gestão 2002-2006
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MENSAGEM DE REPÚDIO DO PROFESSOR BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS PELA CONDUÇÃO COERCITIVA DO REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
Na minha qualidade de Director do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, quero manifestar o mais vivo repúdio pela despropositada e ilegal condução coercitiva de que foi vítima o Reitor e a equipa reitoral da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Quero ao mesmo tempo testemunhar a mais veemente solidariedade a estes académicos íntegros e quero pedir-lhes, em nome da comunidade académica internacional, que não se deixem intimidar por estes actos de arbítrio por parte das forças anti-democráticas que tomaram conta do poder no Brasil.
Eles sabem bem que nada disto tem a ver pessoalmente com eles enquanto indivíduos, pois sabem que não há nenhuma razão jurídica que justifique tais acções. Os actos de que são vítimas visam, isso sim, desmoralizar as universidades públicas e preparar o caminho para a sua privatização.
Estamos certos que estes desígnios não se cumprirão, pois a resistência da comunidade académica e do conjunto da cidadania democrática brasileira a tal obstarão.
O Reitor da UFMG e a sua equipa reitoral estão agora na linha da frente dessa resistência e merecem por isso não apenas a nossa solidariedade, mas também todo o nosso respeito.
Coimbra, 6 de Dezembro de 2017
Boaventura de Sousa Santos
Director do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra
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Nota dos Reitores de Instituições Públicas de Ensino Superior de Minas Gerais
Os reitores das Instituições Públicas de Ensino Superior de Minas Gerais, representados pelo Fórum de Dirigentes das Instituições Públicas de Ensino Superior (Foripes – MG), manifestam total indignação pela forma como foi conduzida a ação da Polícia Federal hoje, na UFMG, quando foram levados para depor, de forma coercitiva, o reitor, Jaime Ramirez, a vice-reitora, Sandra Goulart, e as ex-vice-reitoras, Heloísa Starling e Rocksane Norton, além de outros professores e do presidente da Fundação de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep), Alfredo Gontijo.
O acompanhamento dos processos administrativos pelos órgãos de controle internos e externos é parte do cotidiano de nossas instituições. Encontradas falhas, ações corretivas e eventualmente punitivas devem ser tomadas, resguardados os direitos dos envolvidos – em especial o direito de ampla defesa. A desnecessária condução coercitiva dos servidores, que nunca se recusaram a cooperar com qualquer investigação, acompanhada da divulgação de nota à imprensa, mancha de maneira indelével sua reputação. Inverte, no olhar da população, o ônus da prova, transferindo a eles o dever de provar sua inocência.
A atitude da Polícia Federal ganha ainda maior gravidade por estar inserida em um conjunto de ataques à universidade pública brasileira, responsável pelos cursos de graduação e pós-graduação melhor avaliados por entidades públicas e privadas no país e no exterior e pela grande maioria da pesquisa realizada no país.
Dessa forma, os reitores do Foripes – MG expressam total solidariedade aos colegas da UFMG e esperam que todos os fatos sejam rigorosamente apurados, respeitando o devido processo constitucional.
Assinam:
Ana Lúcia de Assis Simões – UFTM
Charles Okama de Souza – IF SUDESTE MG
Cláudia Aparecida Marliére de Lima – UFOP
Dagoberto Alves de Almeida – UNIFEI
Dijon Moraes Júnior – UEMG
Flávio Antônio dos Santos – CEFET-MG
Gilciano Saraiva Nogueira – UFVJM
João dos Reis Canela – UNIMONTES
José Ricardo Martins da Silva – IFNMG
José Roberto Soares Scolforo – UFLA
Kléber Gonçalves Glória – IFMG
Marcelo Bregagnoli – IFSULDEMINA
Marcus Vinicius David – UFJF
Nilda de Fátima Ferreira Soares – UFV
Paulo Márcio de Faria e Silva – UNIFAL
Roberto Gil Rodrigues Almeida – IFTM
Sérgio Augusto Araújo da Gama Cerqueira – UFSJ
Valder Steffen Júnior – UFU
Notas:
[1] Sociólogo, Doutor em Ciências Sociais e Diretor Geral do Instituto Cultiva. Coordenador técnico do programa Comunidades Educadoras premiado pela UNESCO como uma das 16 experiências mundiais exitosas em educação.
[2] Licenciado em Filosofia e Doutor em Ciências Sociais. Professor adjunto da PUC Minas e coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da PUC Minas (Nesp). Membro da Comissão da Verdade de MG.
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Enviado para Combate Racismo Ambiental por José Carlos.