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Ativistas comunitários e familiares de vítimas de violência policial lotaram o Centro do Teatro do Oprimido no Rio de Janeiro na noite de 8 de dezembro, como parte de uma campanha comunitária contra as operações policiais nas favelas da cidade.
A campanha, “Caveirão Não: Favelas Pela Vida e Contra as Operações“, foi lançada com três dias de eventos na semana passada, liderada e organizada pela Rede de Comunidades e Movimentos Contra a Violência. Protestos, reuniões com a imprensa, e exibições de filmes chamaram a atenção para a violência policial, ressaltando o seu impacto desproporcional sobre jovens negros no Rio.
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, quase 22.000 brasileiros perderam a vida em operações policiais entre 2009 e 2016. Destes mortos, 99,3% eram homens, 81,8% tinham entre 12 e 19 anos de idade, e 76,2% eram negros. Apenas em 2016, houve 4.224 mortes atribuídas ao conflito com a polícia civil e militar–25,8% a mais do que em 2015. No evento da sexta-feira, jornalista do Complexo da Maré e representante da Rede Contra a Violência, Gizele Martins, lembrou ao público que “a pauta do povo negro não pode ser uma pauta secundária… Necessita ser primordial em qualquer pauta”.
É difícil encontrar dados sobre operações policiais em favelas, mas a campanha Caveirão Não! espera mudar isso. Os organizadores da campanha estão montando um dossiê documentando o números de operações policiais nas favelas, o seu impacto local e os fundos públicos utilizados nestas operações. Gizele relatou que os integrantes da campanha começaram a se reunir mensalmente tanto com membros das comunidades como com parceiros internacionais. “A gente quer que a campanha vá para o mundo todo”, ela disse.
Mães de vítimas da violência policial também falaram naquela noite, exigindo justiça para os assassinos dos seus filhos e apoio aos moradores das favelas. Duas representantes da Rede Contra Violência, Ana Lucia de Oliveira e Maria Dalva Correa, ambas mães de filhos mortos pela polícia, lideraram a discussão de abertura naquele anoitecer. Michel Antonio de Oliveira da Silva, filho de Ana Lucia de Oliveira foi torturado e morto pela milícia em Ramos na Zona Norte em 2008. Maria Dalva Correa perdeu o seu filho no Massacre do Borel em 2003 quando quatro jovens foram mortos em uma operação policial na Tijuca. Embora nenhum dos assassinos tenha sido acusado, ambas as mulheres continuam esperançosas. “A comunidade está avançando”, disse Ana Lucia, “e vai avançar muito mais”.
Em seguida, os organizadores mostraram o documentário Luto Como Mãe e uma prévia do filme a ser lançado Nossos Mortos Têm Voz. Há sete anos, Luto Como Mãe mostrou os protestos corajosos das mães das vítimas dos massacres de Acari, Via Show, e Baixada Fluminense em 1990, 2003 e 2005, respectivamente. Agora, Fernando Sousa e Gabriel Barbosa, diretores do Nossos Mortos Têm Voz esperam contribuir com a luta contínua contra a impunidade policial. Produzido pelo Quiprocó Filmes em parceria com o Fórum Grita Baixada, o Centro dos Direitos Humanos da Diocese de Nova Iguaçu, e Misereor, o documentário retorna à região da Baixada Fluminense, no Grande Rio, para acompanhar a luta de seis mulheres que buscam justiça para os seus filhos e irmãos.
Uma das protagonistas do filme, Joanna D’Arc Mendes, esteve presente na noite de sexta-feira. Joanna perdeu o seu filho mais novo, Flávio Mendes Pontes, em março de 2004. Após treze anos, ela conta a história como se fosse ontem: “Três policiais invadiram a minha casa dizendo que receberam uma denúncia anônima que a gente estava guardando drogas dentro da casa. Revisaram tudo e não acharam nada… Tiraram meu filho dos meus braços e atiraram nele na rua”. Um dos policiais envolvidos teve as acusações anuladas, enquanto os outros dois iriam participar do massacre na Baixada em 2005–a mais sangrento da história do Rio de Janeiro.
Joanna, Ana Lucia, Maria Dalva, e todas as outras mulheres que continuam a protestar pelos entes queridos que perderam são destemidas. Todas elas—apesar do trauma psicológico, saúde em declínio e até ameaças de morte–continuam a buscar por justiça face à impunidade desenfreada. Com o apoio de cineastas, de organizações comunitárias e de parceiros internacionais, elas podem ainda encontrar consolo. No entanto, há algo que está claro. Elas não irão parar. “Temos que lutar”, disse Ana Lucia. “Não podemos desistir. Jamais podemos recuar.”