Novos escândalos sexuais abalam ONGs internacionais de ajuda humanitária

Oxfam, Save the Children, Christian Aid e Cruz Vermelha estariam envolvidas em, pelo menos, 120 casos de abusos

Por Pablo Guimón, no El País

Um novo escândalo sexual está abalando as ONGs que trabalham em países afetados por desastres naturais ou conflitos bélicos. O jornal britânico The Times detalhou ao menos 120 casos de abusos sexuais de funcionários das organizações, Oxfam, Save the Children, Christian Aid e Cruz Vermelha. A mais atingida pelas acusações é a Oxfam, após o jornal desvendar que funcionários seus pagaram prostitutas com dinheiro da ONG enquanto trabalhavam para aliviar as consequências do terremoto de 2010 no Haiti.

O Reino Unido já anunciou que retirará o financiamento de todas as ONGs que não cumpram os  padrões de comportamento no trabalho de campo, como alertou a ministra de Cooperação, Penny Mordaunt, em reposta às acusações de exploração sexual contra os funcionários da Oxfam no Haiti. A organização humanitária, uma das mais importantes do país, se viu envolvida em um enorme escândalo após o The Times publicar o conteúdo de um demolidor relatório interno: de acordo com ele, funcionários da missão que a ONG lançou no país caribenho após o devastador terremoto de 2010, entre eles seu chefe, Roland van Hauwermeiren, contrataram  os serviços de prostitutas — algumas, provavelmente, menores de idade — com o dinheiro da organização. “Em relação à Oxfam e qualquer outra organização que tenha problemas de salvaguarda, esperamos que cooperem plenamente com as autoridades. Cessaremos os fundos de qualquer organização que não o fizer”, disse a ministra Mordaunt através de um comunicado.

O escândalo se estendeu no domingo a outras missões humanitárias e a outras ONGs. Até o ponto de Priti Patel, predecessora de Mordaunt no ministério, alertar de que se tolerou que “pedófilos predadores” explorassem o setor de ajuda humanitária. Um ex-funcionário da Cruz Vermelha e das Nações Unidas, Andrew MacLeod, reconheceu ao The Sunday Times que existe uma falta de respostas contra a “pedofilia institucionalizada” entre os colaboradores em missões internacionais. As revelações causaram um questionamento da regulamentação das organizações dedicadas à cooperação internacional.

The Sunday Times publicou que pelo menos 120 funcionários de organizações não governamentais britânicas foram acusados de abusos sexuais no ano passado. De acordo com os números publicados pelo jornal, a Oxfam registrou 87 casos; a Save the Children, 31 — dos quais dez “foram levados ao conhecimento da polícia e das autoridades civis”; e a organização Christian Aid registrou dois incidentes. No caso da Oxfam, com 5.000 empregados e uma rede de 23.000 voluntários, a organização enviou às autoridades 53 dessas acusações. Segundo a Save the Children, os 31 casos registrados em seu meio ocorreram no estrangeiro e 16 pessoas foram despedidas como resultado das acusações. A Christian Aid afirmou, por sua vez, que afastou um de seus funcionários e tomou “atitudes disciplinares” contra outro. A Cruz Vermelha no Reino Unido admitiu que ocorreu “uma pequena quantidade de casos de assédio”, que o jornal afirma terem sido cinco.

O jornal The Observer, por sua vez, publicou no domingo acusações de um antigo funcionário da Oxfam que detalha como os colaboradores utilizaram prostitutas no Chade em 2006. Nessa época, o chefe da missão no país era o próprio Roland van Hauwermeiren, que se demitiu em 2011 após admitir a exploração sexual de mulheres no Haiti. De acordo com o The Times, a diretora executiva da ONG à época, Barbara Stocking, ofereceu a Van Hauwermeiren uma “saída por etapas e digna” porque sua demissão teria “implicações potencialmente sérias” para o trabalho da Oxfam e sua reputação.

A Oxfam reconheceu que “o comportamento de alguns membros de seu pessoal no Haiti foi totalmente inaceitável” e destacou que iniciou uma investigação interna para chegar “ao fundo” do assunto. Também informou ao Parlamento e à agência de cooperação britânica (DFID), assim como a outros doadores, como a UE e a ONU. A ministra Penny Mordaunt adiantou que entrará em contato com todas as ONGs britânicas que estão trabalhando no estrangeiro para que a informem sobre a existência e a resolução de casos anteriores e de medidas adotadas para que não se repitam. “É absolutamente desprezível que a exploração e os abusos sexuais continuem ocorrendo no setor de ajuda humanitária”, escreveu a titular de Cooperação.

Mordaunt se reunirá na segunda-feira com responsáveis da Oxfam, que recebeu 36 milhões de euros (145 milhões de reais) do Estado no último ano fiscal. “Darei a eles a oportunidade de me dizerem em pessoa o que fizeram após os incidentes e verei se demonstram as qualidades morais que eu penso que necessitam” disse a ministra na BBC. A Oxfam afirmou que agora conta com uma equipe dedicada a detectar possíveis casos de conduta inapropriada e uma linha telefônica confidencial para denunciantes. Mas Mordaunt sugeriu no domingo que não acredita que os novos procedimentos, por si sós, sejam suficientes para convencê-la de que a ONG deve continuar recebendo fundos públicos. “Não importa se existe uma linha para denúncias. Não importa que existam boas práticas de salvaguarda. Se a liderança moral não está no topo da organização, não podemos tê-la como parceira”, disse.

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Zuleica Nycz e Amyra El Khalili

Museu Rodin, Paris. Foto: Tania Pacheco

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