Em debate sobre privatização das águas, PFDC defende maior controle do Estado sobre atividades das grandes corporações

Encontro fez parte da programação do Fórum Mundial Alternativo da Água (Fama) e colocou em destaque as violações de direitos humanos provocadas pelo uso inapropriado dos recursos hídricos

Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC)

“Eu acho que nós temos como pensar agora em responsabilizar Estado e grandes corporações por esses danos que causam ao conjunto das populações”, defendeu a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, durante o debate “Privatização e contaminação das águas”, realizado no último domingo (18) na Universidade de Brasília (UnB). O encontro fez parte da programação do Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama) e colocou em debate aspectos relacionados a ameaças aos povos, comunidades tradicionais e às mulheres; saúde; comprometimento da segurança e da soberania alimentar; captura corporativa das águas e a arquitetura da impunidade aos responsáveis pelas violações de direitos. 

A procuradora relembrou que mesmo antes da Constituição Federal de 1988 o Brasil já possuía uma legislação que previa a proteção das águas, citando a Resolução nº 1, de 23 de janeiro de 1986, do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que estabelecia critérios básicos e diretrizes gerais para a avaliação de impacto ambiental, levando em conta – entre outros critérios – as bacias hidrográficas e os efeitos cumulativos causados pelos empreendimentos.

Deborah Duprat citou, também, a Política Nacional de Recursos Hídricos, instituída pela Lei nº 9.433/1997, que tem entre seus objetivos assegurar a necessária disponibilidade de água; a utilização racional e integrada dos recursos hídricos; e a prevenção e a defesa contra eventos hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos recursos naturais. Ponto destacado pela procuradora foi o fato de a legislação reconhecer a água como um bem de domínio público e recurso natural limitado, estabelecendo seu uso de forma prioritária para o consumo humano em casos de escassez. Além disso, acrescentou a procuradora, a lei estabeleceu que a gestão dos recursos hídricos deve ocorrer de forma descentralizada e com a participação do poder público, dos usuários e das comunidades.

As desterritorializações motivadas pelos grandes empreendimentos também foram criticadas pelos especialistas. De acordo com Flávio Valente, representante da Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (FIAN Brasil), 377 escolas de ensino fundamental foram fechadas no Piauí desde 2014, forçando as famílias a se deslocarem de seus territórios de origem. “Nós temos que começar a discutir nesse momento como fazer convergência. Convergência de lutas, convergência de agendas e convergência de energias. Porque a luta de Correntina, por exemplo, é a mesma luta do pessoal do sul do Piauí. É o mesmo aquífero. Mas as pessoas estão divididas”, criticou Valente. A coordenadora do Grupo de Trabalho Saúde e Ambiente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Raquel Rigotto, destacou a expressão dos conflitos ambientais na saúde humana. “É claro que isso reflete nos nossos corpos. E não reflete igualmente. Reflete de uma forma dividida, segmentada, produtora de desigualdades entre as classes sociais, entre os grupos étnicos e raciais”, afirmou a especialista.

“Nós estamos em ano de eleição. Eu acho que é hora de discutir o modelo econômico desse país. É hora de colocarmos na pauta das disputas presidenciais qual é o país que pensamos. Será que vamos continuar nesse modelo que condena eternamente as margens a serem margens e o centro a crescer como centro?”, finalizou a procuradora Deborah Duprat ao defender – no campo do Direito – uma atuação mais potente para garantir a punição dos responsáveis e evitar novas violações de direitos humanos relacionadas à questão ambiental.

Sobre o FAMA – O Fórum Alternativo Mundial da Água (Fama) é um evento que tem o objetivo de unificar internacionalmente organizações e movimentos sociais que lutam em defesa da água como direito humano. Como parte da programação, Deborah Duprat participou, no último sábado (17), da abertura da Assembleia Popular das Águas, ocasião na qual também estiveram presentes a procuradora-geral da República, Raquel Dodge; o vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia; o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Herman Benjamin; e a secretária de Direitos Humanos e Defesa Coletiva do CNMP, Ivana Farina.

Foto: Leonardo Prado/Secom/PGR

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