Defensoria Pública e Educação em Direitos Humanos em um mundo em crise: qual caminho seguir? Por Wagner Giron de la Torre*

Fonte: Cadernos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo

“Temos de educar o povo, de forma a impedi-lo que pule no nosso pescoço”
Ralph Waldo Emerson – filósofo.

Considerações necessárias para o desenvolvimento do tema

Os horizontes da contemporaneidade reprimem qualquer boa expectativa com relação ao tema da educação em direitos humanos. Nos dias que correm – apesar do discurso diluído com certa insistência sobre os direitos humanos na ordem política como um todo – falar-se sobre dignidade humana se afigura um tanto quanto difícil.

Setenta anos após o advento da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a dignidade humana parece ter perdido qualquer referência valorativa em meio às massas populares, especialmente no ocidente. É expressão vazia de sentido. Para os que discordam desta asserção, basta confrontar a realidade dos milhões de refugiados em pleno século XXI, desprezados, com cambiante indiferença, por pessoas e instituições, ainda que existam positivações de comandos garantindo-lhes o respeito a esse núcleo normativo que deveria ser irredutível.

São homens, mulheres, crianças que tentam fugir dos horrores derivados das intervenções bélicas deflagradas pelas potências ocidentais após o 11 de setembro, que aniquilam culturas milenares, economias antes estáveis e dissipam ordens sociais de países inteiros, tanto no Oriente Médio como na Ásia, África ou América Latina. Intervenções sempre calcadas em mentiras como seu pressuposto imediato, tal qual a fraudulenta alegação do governo estadunidense a respeito do “arsenal de armas químicas” detido pelo Iraque para legitimar, perante a grande imprensa, a guerra de pilhagem de recursos naturais de 2003.

O conjunto dessas intervenções provocam a remoção compulsória de milhões de pessoas, como os refugiados que se afogam, aos milhares, ao tentarem atravessar o Mediterrâneo todo ano, implementando uma fuga desesperada da miséria, do desgoverno em seus Estados bem como dos flagelos decorrentes dos desequilíbrios socioambientais imbricados nessas forças de destruição em massa, ou mesmo tentando se evadir das atrocidades do Estado Islâmico ou de outros tiranetes a serviço dos centros capitalistas. Fontes de opressão, todas elas filhas legítimas do ocidente (ZAJEC; 2015). Na contemporaneidade, poucos perdem o sono diante desses horrores.

Na ordem econômica, transpostos trinta anos da consolidação do estatuto neoliberal, o grau de iniquidades e concentração de renda no planeta ultrapassa os limites sustentáveis de qualquer utopia democrática, estando hoje num nível de acumulação e centralização do capital muito mais severo do que o divisado antes da primeira guerra mundial e do advento do nazifascismo como estrutura de poder (PIKETTY; 2013). Atualmente, apenas oito indivíduos mais ricos do orbe terrestre se apropriam de recursos equivalentes a mais da metade da população mundial (OXFAM; 2018).

Todo esse descaminho em termos de políticas distributivas em proveito de plutocracias contribuiu para aprofundar o descrédito das massas populares nos regimes democráticos, alimentando um ódio transversal e crescente contra partidos políticos e a classe política como um todo, conformando um caldo cultural propício à perigosa direitização nos centros capitalistas (HALIMI; 2015) e em países periféricos e dependentes, como o Brasil, onde o protagonismo partidarizado de setores importantes do sistema de justiça, operou um golpe político que não só afastou uma Presidenta da República legitimamente eleita, como abriu condições de substituí-la por uma horda de oligarcas que assombrosamente, e sem qualquer legitimação social, atua para a destruição dos aportes constitucionais garantidores dos Direitos Sociais, Econômicos, Culturais, Socioambientais etc, pautando o retorno de tempos marcados pela total irrelevância do direito (MACHADO; 2016).

Esse quadro funesto em que imperam massivos discursos legitimadores da irrelevância do direito tem contribuído para o esvaziamento de balizas civilizatórias desenhadas, após lutas seculares, no bloco dos direitos humanos, avançando não só sobre o fragmento seletivo do espectro político, mas abarcando também a flexibilização de direitos comezinhos afetos ao contraditório, ampla defesa e direito às provas lícitas que interessam a ampla clientela pauperizada do sistema criminalizante do Estado, já que pesquisa recente do NEV- Núcleo de Estudos da Violência da USP, aponta que 74% das condenações por tráfico de drogas em São Paulo contaram apenas com o testemunho de policiais militares que participaram das detenções (FONSECA; 2015), alimentando um estado de exceção hoje responsável pela quarta maior população carcerária do planeta.

Como corolário desse denso horizonte, o Brasil se afigura no cenário mundial como o paraíso dos super-ricos. A despeito do desmonte dos direitos laborais e previdenciários e da ampliação do exército imensurável de desempregados, o país titulariza a mais desigual concentração de renda no mundo. Aqui, por obra dessas políticas neoliberais, o décimo mais rico abocanha 52% da renda produzida, além de submeter em média apenas 7% de sua renda em termos tributários, pois, junto com a Estônia, o Brasil é o único país da OCDE-Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, que isenta os dividendos dos ricos do imposto de renda (GOBETTI; ORAIR; 2016).

Portanto, falar-se em direitos humanos nesse cenário não é fácil. Mas é indispensável, mais do que nunca, insistir-se no tema da educação em direitos humanos, mas sob a condição de considerar de forma crítica todo esse conturbado horizonte.

Porém, na senda da Defensoria Pública, qual o tipo de educação em direitos que se almeja? Qual o caminho a seguir?

Alguns indicativos institucionais

Democracia e direitos humanos têm uma relação ontológica. Tal liame, assim como a interdependência, indivisibilidade e universalidade de toda a carta dos direitos humanos estão materializados pela Declaração e Programa de Viena sobre Direitos Humanos (ONU 1993, artigos 5 e 8) e o encargo dos Estados-partes da ONU em promover a proteção e o desenvolvimento democrático através da divulgação e educação para os direitos humanos está enraizado em diversos documentos.

Desde a Carta das Nações Unidas (1945), perpassando pela própria Declaração Universal de 1948, e reforçada por tratados derivativos desses mecanismos, como os Pactos Internacionais dos Direitos Civis e Políticos e dos Direitos Econômicos, Sociais, Culturais, ambos de 1966, encontramos exortações acerca da irredutibilidade do respeito à dignidade humana, que só pode ser alcançada em um mundo onde as pessoas possam viver livres do temor da miséria material e cultural, e, para tanto, os Estados deveriam se empenhar na educação e promoção dos direitos humanos.

No continente americano, a disposição dos Estados para a preservação da cultura em direitos humanos encontra-se moldada desde os considerandos da Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem (1948) e reafirmada na alínea “a” do artigo 41 da Convenção de San José da Costa Rica de 1969.

No mundo todo, a educação para os direitos humanos deveria ser imbuída em toda criança desde os primeiros contatos com as instituições de ensino (artigo 29, “b” da Convenção Sobre os Direitos da Criança de 1989).

Os Estados falharam lastimavelmente nesse intento. Não por acaso é comum, hoje, nos depararmos com discursos de ódio à democracia e à cosmovisão legada por grupos culturais e sociais particularmente marginalizados, excluídos e silenciados (SACAVINO; 2013). A Grande Narrativa imbricada na carta internacional dos direitos humanos, um dos principais legados do esforço civilizatório nos últimos séculos (ALVES; 2004) não foi devidamente respeitada e difundida em nossas “democracias”.

Em paralelo a tais comandos exaustivamente positivados, atreitos à necessária vinculação entre direitos humanos, educação massiva e democracia, temos a órbita normativa jungida às Defensorias Públicas, enquanto instituições estatais.

Além de ter, dentre suas atribuições, o encargo institucional de orientar, promover, difundir e conscientizar a população em geral para e sobre os direitos humanos (artigo 4º, III, lei complementar federal nº 80/1994, com redação introduzida pela lei complementar nº 132/2009), a Defensoria Pública foi içada pela Constituição a instrumento do regime democrático e de promoção e defesa dos direitos humanos (artigo 134 CF, com redação dada pela E.C. nº 80/2014).

Não é lícito ignorar que o próprio ordenamento jurídico emprestou à Defensoria Pública uma contextura institucional marcadamente teleológica: de buscar primacialmente a orientação e conscientização dos segmentos pauperizados nos aportes dos direitos humanos e da democracia.

Já temos, aqui, um fanal a iluminar o caminho proposto.

Qualquer “educação” serve?

Diante do que foi até aqui averbado, calha adiantar uma pequena premissa, ponto fundamental em face das iniquidades imbricadas na estrutura do modo de produção inerente ao modelo econômico hegemônico: para alcançar os fins de promover direitos humanos e desenvolver/fortalecer o regime democrático, a ação educativa não pode, de modo algum, ser ahistórica e apolítica. Tem de ser fator impulsionador do pensamento crítico.

As sociedades capitalistas são intrinsecamente competitivas, hierarquizadas e desiguais, e suas estruturas de reprodução material moldaram o Estado como instrumento ao acúmulo e concentração do capital (MARX, 2013; PASUKANIS, p.113, 1989; MASCARO, p. 43, 2013), de modo a confinar instituições voltadas à promoção dos direitos humanos à uma posição sensivelmente contra-hegemônica.

Neste tema não sobram ilusões. Não há como ser diferente com relação à Defensoria Pública. Seu escopo normativo direciona-se claramente à promoção, difusão, conscientização dos direitos fundamentais dos segmentos vulnerabilizados e ao esforço institucional da promoção dos valores democráticos. Essa juridificação a conduziu numa vertente altamente conflitiva no tocante aos valores que fundamentam o núcleo central da sociedade competitiva e seu produto primacial que é o Estado. (MASCARO, 2013).

Para naturalizar a desigualdade intrínseca ao sistema de produção capitalista, os regimes de educação tradicionais são dissipados às massas populares para perpetuar sua alienação em relação a história do desenvolvimento estrutural dessas desigualdades, para mantê-las numa inserção acrítica no mundo e para consolidar o domínio.

Em sendo “o conflito a base da sociedade que se industrializa sob o modo de produção capitalista” (SOUZA, 215), a educação em direitos humanos, em sua condição contrahegemônica, tem de servir para emancipar o educando através de instrumentos dialógicos, transformando-o de um ser amplamente dominado e docilizado pelo sistema hierarquizado de ensino, para um ator efetivamente construtor de uma democracia fortalecida, participativa, plural e popular, formadora de “sujeitos históricos ativos, críticos e propositivos capazes de ser gestores corresponsáveis da própria sociedade” (SACAVINO, p. 262, 2013).

Portanto, diante da meta emancipadora subjacente a educação em direitos humanos, é necessário semear no educando (pessoa que dialoga com a ação educadora) o pensamento crítico de toda a matriz histórica fomentadora da realidade concreta na qual está inserido.

Enfatiza PAULO FREIRE (um dos maiores pensadores brasileiros):

Em realidade, não nos será possível nenhum verdadeiro equacionamento de nossos problemas, com vistas a soluções imediatas ou de longo prazo, sem nos pormos em relação de organicidade com nossa contextura histórico-cultural. Relação de organicidade que nos ponha imersos na nossa realidade e de que emerjamos criticamente conscientes. Somente na medida em que nos fizermos íntimos de nossos problemas, sobretudo de suas causas e de seus efeitos, nem sempre iguais aos de outros espaços e de outros tempos, ao contrário, quase sempre diferentes, poderíamos apresentar soluções para eles. (apud SOUZA, 2015)

Para concretizar tais premissas, Paulo Freire pontificou alguns princípios básicos para o desenvolvimento de uma verdadeira educação emancipadora e democrática. Tais princípios são, segundo Ana Inês De Souza:

(…)A ação dialógica, como matriz de uma educação democrática e da própria democracia enquanto vida; a relação de organicidade da educação com o contexto histórico-cultural; a duplicidade de planos instrumentais da educação; preparo técnico e senso de perspectiva histórica; a importância do desenvolvimento da infraestrutura para o desenvolvimento da consciência do homem, de um estágio de interesses quase restritos a formas vegetais de vida (consciência intransitiva) a um estágio de preocupações mais abrangentes, porém ainda ingênuas (consciência transitivo-ingênua); e a importância da educação, de um trabalho formador, para o desenvolvimento desta consciência ingênua para uma consciência crítica que se caracteriza pela profundidade na interpretação dos problemas (consciência transito-crítica) (SOUZA, p. 40/41, 2015).

Esses aportes calham relevantes ao tema, pois, para Paulo Freire, não há neutralidade no processo educativo (SOUZA, p. 43, 2015).

Ana Inês de Souza ainda ressalta:

(…)o desenraizamento implícito na industrialização diz respeito ao processo de alienação. O homem distancia-se de suas raízes ontológicas, ou seja, de humanizar-se pelo trabalho, de ser mais. Ao contrário, o trabalho na indústria, fragmentado, repetitivo, divide o homem, alienando-o do processo e dos frutos de sua produção e consequentemente de si mesmo (p. 47, 2015).

Pensar a educação em direitos humanos como uma alternativa social para o presente quadro de barbárie “implica, entre outras coisas, na formação humana” (SCHNORR, p. 67, 2015).

Esse processo de conscientização não pode ficar alheio ao diálogo com a essência da realidade concreta das pessoas, objeto e sujeitos da ação educativa. Para Paulo Freire “ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão” (apud SCHNORR, p. 76, 2015).

Uma das balisas mestras propostas é que em qualquer projeto de educação para os direitos humanos, promovido por uma Defensoria Pública, a estrutura dialógica com o educando, a possibilidade ampla de sua oitiva em todo o processo de educação para os direitos humanos, o desvelamento de sua realidade concreta, é imprescindível, assim como é imprescindível pautarmos tais projetos educacionais emancipadores não apenas pela ótica do culturalismo eurocêntrico, responsável, em grande medida, pela perpetuação do racismo estrutural que define a sociedade brasileira (SOUZA, 2017; OURIQUES, 2013), mas, em especial, por pensadores críticos urdidos no solo deste continente, impregnados do conhecimento concreto de suas vicissitudes e dependência econômica estrutural (MARINI, 2000).

A difusão, portanto, das experiências teóricas e empíricas, produzidas por pensadores Latino-Americanos é indispensável para moldar a adequada leitura da realidade estrutural da dura realidade das vastas frações populacionais pauperizadas neste continente. (OURIQUES, 2014).

Essas premissas estruturais, pautadas no diálogo histórico-estrutural da realidade concreta de nossas existências e contradições, com respeito primacial à oitiva/participação da pessoa que será sujeito do projeto educativo/conscientizador deve orbitar sobre os escopos de redistribuição imbricados na carta de direitos humanos, mas sem perder de vista a vasta polissemia que permeia o tema, principalmente jungida às reivindicações pelo reconhecimento.

A propósito, Vera Maria Ferrão Candau explicita que:

(…)Em relação à polissemia da expressão educação em Direitos Humanos, os pesquisadores afirmam a importância de não se deixar que esta expressão seja substituída por outras consideradas mais fáceis de serem assumidas por um público amplo, como educação em Direitos Humanos, a uma educação em valores, inibindo seu caráter político. Por outro lado, hoje, a educação em Direitos Humanos admite muitas leituras e esta expressão foi se ‘alargando’ tanto que o seu sentido passou a englobar desde a educação para o trânsito, os direitos do consumidor, questões de gênero, étnicas, do meio ambiente, etc., até temas relativos à ordem internacional e à sobrevivência do planeta. Tendo-se presente esta realidade, corre-se o risco de englobar tantas dimensões, que a educação em Direitos Humanos perca especificidade, tornando difícil uma visão mais articulada e confluente, terminando por se reduzir a um grande ‘chapéu’ sob o qual podem ser colocadas temas muito variados, com os mais diversos enfoques. (p.289, 2009)

Conclusões

O concerto histórico de nossas elites, perpetuou, na América Latina como um todo e no Brasil, em particular, a submissão eterna ao papel periférico que nos foi legado pela divisão internacional do trabalho imposta pelos centros capitalistas, fomentando o desenvolvimento infinito da dialética da dependência econômica a obstar a concretude de qualquer projeto consistente de nação e democracia por estas paragens, a ponto de aprofundar as iniquidades sociais que penalizam a ampla maioria populacional no continente (MARINI, 2000).

Essas tensões, esses conflitos culturais e socioeconômico, a historicidade acrítica das raízes das desigualdades que recaem sobre a imensa massa pauperizada, cujo sofrimento hoje é agudizado pela intensificação de políticas neoliberais claramente antidemocráticas, contribuem para que o tema atreito aos direitos humanos seja esvanecido na região, com gritante distorção de seus conceitos pelas agências fomentadoras da produção ideológica dominante, como, exemplo, a mídia empresarial, que costumeiramente associa a ideia de direitos humanos a “bandidos”, aprofundando o esvaziamento dos esforços pela emancipação humana no continente. (SACAVINO, p. 265, 2013).

Para que a educação em Direitos Humanos aflore verdadeiramente emancipadora, a transformar a vivência e cosmovisão dos sujeitos de suas ações, é necessário investir-se no diálogo com as populações principalmente as mais duramente atingidas pelo avanço das deletérias políticas de “austeridade” neoliberais, reafirmando a avaliação conjunta, entre educador e educando, da realidade concreta dessas pessoas, a força e raíz histórica dessa estrutura de desigualdades, mas sempre pautando as propostas de diálogo a partir do contexto local e latino americano, evitando toldar o projeto educacional por imperativos teórico-culturais eurocêntricos.

As sociedades continentais, e a brasileira por excelência, foram urdidas pelas mazelas de regimes escravocratas cujas sequelas, inclusive estruturais, persistem até hoje (SOUZA, 2017). Sociedades lapidadas na tensão dos conflitos profundos, jamais em pactos sociais metafísicos. Essa tensão, remete, segundo Susana Beatriz Sacavino, a constantes refluxos da temática dos Direitos Humanos:

(…)Essa tensão se vê refletida na constatação de que, depois de vinte anos de desenvolvimento da educação em/para os direitos humanos na América Latina, constata-se que se trabalhou muito, desenvolveram-se muitas experiências, produziram-se muitos materiais pedagógicos, mas o impacto é ainda muito reduzido. (p.263, 2013).

O conflito cultural e socioeconômico tem de fundir o centro de qualquer proposta educativa efetivamente dialética e emancipadora para os Direitos Humanos. Não se pode temer radicalizar os escopos democráticos e emancipadores, em específico nos aspectos Econômicos, Sociais, Culturais, Socioambientais, imbricados na carta universal dos Direitos Humanos. Como enfatiza Boaventura de Souza Santos:

(…)Um projeto educativo (libertador) tem de colocar o conflito cultural no centro de seu currículo. As dificuldades para o fazer são enormes, não só devido à resistência e à inércia dos mapas culturais dominantes, mas também devido ao modo caótico como os conflitos culturais têm vindo a ser discutidos no nosso tempo (…) O projeto educativo tem, pois, nesse domínio, responsabilidades acrescidas. Tem de, por um lado, definir corretamente a natureza do conflito cultural e tem de inventar dispositivos que facilitem a comunicação. (apud. SACAVINO, p. 263, 2013).

O consigna evocado pelo filósofo norte-americano no século XIX e que serviu de epígrafe a este escrito, marcou a massificação dos projetos de educação liberal nos últimos cento e cinquenta anos, produzindo um contingente imensurável de pessoas alienadas, docilizadas e profundamente individualistas. Tais limites e imposições educacionais hegemônicos são poderosos. Para superá-los, qualquer projeto de educação em/para os Direitos Humanos deve fomentar o desenvolvimento do pensamento crítico através do diálogo e conhecimento da experiência concreta com os sujeitos da ação educativa, de forma a transformá-los em agentes emancipados e emancipadores, capazes de fincar suas garras libertárias na jugular das forças do atraso, tentando, quem sabe, superá-las na busca necessária de uma sociedade menos desigual, mais justa e solidária.

*Defensor Público do Estado de São Paulo. Pós-graduado em Direitos Humanos e Acesso à Justiça da FGV/SP. In: Cadernos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo. São Paulo, v. 3 n. 12 p. 9-17, mai 2018.

REFERÊNCIAS

ALVES, J. A. Lindgren. A Declaração dos Direitos Humanos na PósModernidade. Disponível < http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/25499-25501-1-PB.pdf> Acesso: 07.2.2017

CANDAU, Vera Maria Ferrão. Educação em direitos humanos. SP. Quartier Latin. 2009

GOBETTI, Sergio Wulff e ORAIR, Rodrigo Octávio. O paraíso dos super-ricos. Jornal Le Monde Diplomatique Brasil. Ano 9, nº 102, abril de 2016.

FONSECA, Anderson Lobo. A força da palavra repressiva. Jornal Le Monde Diplomatique Brasil. Ano 8, nº 93, 2015.

HALIMI, Serge. Direitização, modo de usar. J. Le Monde Diplomatique Brasil. Ano8, nº 95, jun/2015.

MACHADO, Marta. A Irrelevância do direito. J. Le Monde Diplomatique Brasil. Ano 10, nº 111, out/2016 .

MASCARO, Alysson Leandro. O Estado e forma política. SP. Boitempo. 2017.

MARINI, Ruy Mauro. A Dialética da dependência. RJ. Vozes. 2000.

MARX. Karl. O Capital. Livro I. SP. Boitempo, 2013.

OURIQUES, Nildo. O colapso do figurino francês: crítica às ciências sociais no Brasil. RJ. Insular. 2017.

OXFAM https://brasil.elpais.com/brasil/2017/01/13/economia/1484311487_191821.html, acessado em 29.1.2018.

PASUKANIS, E.B. “A teoria do direito e o marxismo”. RJ, Renovar, 126, 1989.

PIKETTY, Thomas. O capital no século XXI. RJ: Ed. Intrínseca, 2013

SACAVINO, Susana Beatriz. Democracia e educação em direitos humanos na América Latina. RJ. Ed. Nova América.2013.

SCHNORR, Gisele Moura. Pedagogia do Oprimido. Artigo inserido na coletânea “Paulo Freire, vida e obra. Ana Inês de Souza org. SP, Expressão Popular. 2015.

SOUZA, Ana Inês. Educação e atualidade brasileira: a emersão do povo na história. Artigo inserido na coletânea “Paulo Freire, vida e obra. Ana Inês de Souza org. SP, Expressão Popular. 2015.

SOUZA, Jessé. A elite do atraso: da escravidão à lava jato. RJ. Leya. 2017.

ZACET, Olivier. Oriente Médio em ebulição.J. Le Monde Diplomatique Brasil. Ano 9, nº 100, 2015.

Ilustração: Dali.

 

 

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