Conselho Popular reúne com Prefeito Crivella, abordam seis tópicos, esclarecem intenções para Politica Habitacional do Rio

Por Tyler Strobl, no Rio On Watch

Quinta-feira, 24 de maio, foi um dia de avanços para o Conselho Popular e sua luta pelo direito à moradia na cidade do Rio de Janeiro. Não somente alguns de seus membros estavam presentes em um encontro com representantes congressistas em Brasília, mas também um grupo se reuniu com o prefeito do Rio, Marcelo Crivella. Após meses de protestos do Conselho Popular –e meses nos quais a prefeitura vem adiando ou não cumprindo a promessa de marcar reuniões– Eliane Oliveira, advogada da Pastoral das Favelas e da Arquidiocese do Rio de Janeiro, recebeu uma ligação do gabinete do prefeito às 21:30hs na quarta-feira, dia 23 de maio, e uma reunião foi marcada para às 10:00hs do dia seguinte. Os membros do Conselho Popular correram para reunir um grupo para apresentar seu manifesto recém publicado ao prefeito. No dia 27 de maio, o Conselho Popular se reuniu para discutir a reunião ocorrida e comunicar as ideias debatidas. A seguir, os seis principais tópicos que surgiram através das respostas do prefeito.

1. Remoção versus reassentamento

O primeiro tópico do manifesto reivindica o “fim imediato à política de remoção nas favelas”, estimando que mais de 20.000 famílias sofrem riscos se o prefeito seguir com seu Plano Estratégico para a cidade. O Prefeito Crivella já havia dito que não haverá remoções sob sua administração, declaração repetida por ele na reunião do dia 24. Entretanto, seus comentários sobre a resposta ao primeiro tópico gerou certa confusão. Eliane lembra: “Nesse momento ele falou que jamais terá remoção, seria reassentamento. Foi exatamente isso que ele falou em relação a remoção”. Os membros do Conselho Popular questionaram a diferença entre remoção e reassentamento, o que para eles significa praticamente a mesma coisa. Não se sabe como o prefeito diferencia “remoção” de “reassentamento”, o que gera preocupações de que com uma simples troca de palavras o prefeito reabra espaço para remoções indesejadas.

2. Decreto 44557

Duas semanas depois do desabamento de um prédio, que era uma ocupação habitacional, no Centro da cidade de São Paulo no dia 1 de maio, Crivella assinou o Decreto 44557. O decreto cria um grupo de trabalho que abrange diversos municípios com o propósito de tratar de “assuntos relacionados à reassentamento de famílias moradoras de unidades públicas ou particulares em ocupação irregular”. Diversos líderes de comunidades e ativistas estão atentos e criticam a medida. O decreto dá ao grupo de trabalho 30 dias para apresentar recomendações de políticas e, até o momento, grupos da sociedade civil não foram convidados a participar. O Conselho Popular solicitou que seja informado sobre as decisões do grupo de trabalho, mas os membros estão preocupados com a possibilidade do decreto ser um outro instrumento para remoções em favelas e nos prédios ocupados na cidade.

3. Promessas feitas

Crivella transmitiu alguns planos concretos sobre os quais alguns membros do Conselho Popular estão otimistas. Um dos defensores públicos que atua para as comunidades envolvidas no Conselho Popular refletiu: “Achei tudo vago, sem compromisso nenhum. Só ouvi duas coisas concretas. Ele vai tentar se reunir com comunidades com problema em área federal junto com os órgãos da União. A outra promessa foi a de tornar a Barrinha uma Área de Especial Interesse Social“. Ainda que não esteja no papel, essas são notícias boas. Primeiro, as comunidades em área federal no Rio se reuniram com representantes em Brasília no mesmo dia, então o suporte do prefeito ajudará na causa. Segundo, reconhecimento e proteção para as 51 famílias da Barrinha aliviará o medo de remoção e assim poderão seguir normalmente com suas vidas.

4. Políticas habitacionais

O Conselho Popular apresentou várias recomendações para políticas habitacionais progressivas, ressaltando que muitas favelas precisam de projetos de urbanização que sigam as demandas e ideias locais e citaram iniciativas lideradas pela comunidade como o exemplo do Laboriaux, na Rocinha. O prefeito deu duas principais respostas. Primeiro, que não haveria regularização fundiária em comunidades que ainda não têm a infraestrutura urbana necessária. “Ele falou que só faria regularização fundiária se tivesse regularização urbanística. Mas não tem dinheiro, então não se fará nada, porque é preciso fazer isso antes”, declarou Eliane. Enquanto o prefeito falhou em comprometer-se claramente com projetos de urbanização, ele discutiu planos para construir mais casas. O prefeito alegou que suas promessas sobre o desenvolvimento de habitação, totalizando 10.000 unidades com estimativa de terminar em 2020, serão construídas em Rio das Pedras, em terras recentemente adquiridas pela Prefeitura em um acordo com o estado do Rio de Janeiro.

5. Milícias e controle de facções

Um dos tópicos mais problemáticas foi a forma como Crivella discute as barreiras para o desenvolvimento urbano nas favelas do Rio. “Ele deixou claro que ‘em comunidade com milícia não faremos [regularização fundiária]’. Ele falou várias vezes”, declarou Eliane. Estima-se que mais de 2 milhões de pessoas, através da região metropolitana do Rio, moram em áreas controladas por milícias, mas os membros do Conselho Popular sentiram que Crivella focou nas milícias ou no controle por facções injustamente no contexto de bairros pobres. A moradora da Barrinha, Jaqueline Andrade disse que antes de cada um começar a falar, Crivella perguntou-lhes se eles vinham de uma comunidade controlada por milícia, e se não, se havia presença de traficantes. O anteriormente citado defensor público relatou que achou isso preocupante: “Eu falei, ‘prefeito só pra deixar registrado, conheço várias [comunidades] que não têm milícia nem tráfico’”. De acordo com o advogado, Crivella respondeu: “Eu não conheço nenhuma”. Na semana seguinte, na reunião do próprio Conselho Popular, os membros do Conselho expressaram preocupação, por perceberem que a compreensão do prefeito sobre favelas é severamente limitado, o que pode, potencialmente, impedir qualquer desenvolvimento significativo.

6. O Papel da sociedade civil

Durante a reunião, Crivella pediu ao Conselho Popular para lhe apresentar projetos, de acordo com os requisitos do manifesto. O grupo propôs diversas ideias de políticas específicas como a eliminação de impostos atrasados de prédios abandonados com o intuito de estimular o desenvolvimento de projetos de habitação pública. Ainda assim o prefeito pareceu ter ignorado as ideias e continuou a pedir por projetos concretos, “como se ele não tivesse pessoas capazes de fazer projetos”, notou Eliane. Isso leva à questão do papel da sociedade civil no Rio de Crivella. Ainda que grupos da sociedade civil tenham sido chamados para participar dos grupos de trabalho como deverá acontecer com o do Decreto 44557, o prefeito expressou seu desejo deles apresentarem propostas de política prontas em relação aos direitos à moradia. É preciso perguntar se o prefeito realmente quer a contribuição da sociedade civil, já que foi dado ao grupo apenas 12 horas para se preparar para a reunião.

A reunião do Conselho Popular com o Prefeito Marcelo Crivella foi um passo à frente ainda que muitas questões tenham sido deixadas sem resposta. Como serão os “reassentamentos” na sua administração? Quais projetos serão propostos pelo grupo de trabalho do Decreto 44557? Como a perspectiva do Crivella sobre as milícias e o controle de facções afeta as formas de urbanização e regularização fundiária e quais comunidades se beneficiarão? Apenas o tempo dirá, mas muitos no Conselho Popular estão cautelosamente otimistas. Como Jaqueline da Barrinha disse, “às vezes prometem muito e fazem pouco. Ele falou que nenhuma comunidade seria removida no governo dele. Ao meu ver foi produtiva [a reunião], mas a gente precisa ver se irão realmente cumprir com o que se comprometeram”.

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