por Edmund Ruge, em RioOnWatch
Na segunda-feira, 11 de junho, às 6:30hs, moradores do Complexo da Maré acordaram com estrondosas rajadas de alto calibre. Um helicóptero da polícia dava rasantes sobre telhados nas favelas de Nova Holanda, Parque União e Rubens Vaz, atirando sobre casas e becos. Caveirões destruíram ruas.
Alguns se esconderam na relativa segurança de suas casas, enquanto outros, que já haviam saído para o trabalho ou para a escola, foram forçados a encontrar abrigo no comércio local. Uma moradora relatou que se escondeu em um bar nas redondezas: “Antes de chegar no meu carro começou a troca de tiro. Eu fiquei escondida dentro de um bar, e balearam meu carro todinho. Ou seja, por um segundo, eu teria estado dentro do carro. Não aguento mais essa bobeira não”.
Muitos entraram nas redes sociais, reportando tiroteios e aparições do helicóptero à mídia comunitária do Maré Vive, que por sua vez alertou em sua rede: “Bala voando em várias partes helicóptero largando o aço de cima pra baixo, caveirão em terra fazendo o mesmo”.
Essa foi a primeira operação policial nesta parte da Maré em cerca de sete meses, já que a mais recente ocorreu em fevereiro, na Baixa do Sapateiro, vários quilômetros ao sul. Tal incursão resultou na morte de Jeremias Moraes da Silva, de 13 anos.
Exceto que, desta vez, não houve operação policial. Ao menos, assim foi, de acordo com a Polícia Militar do Rio. O 22º Batalhão da Polícia Militar da Maré atribuiu os tiroteios da manhã a um confronto entre facções rivais.
Como o esmagador consenso dos cidadãos não foi suficiente, evidências em vídeo começaram a circular rapidamente. Misturado entre passageiros do lado oposto da Avenida Brasil, um motorista de ônibus registrou um helicóptero da polícia disparando tiros ao cruzar a rodovia. Outro morador fotografou o que os repórteres consideraram ser um helicóptero do CORE (Polícia Civil) circulando pelas favelas e trocando tiros.
Até a manhã de terça-feira, autoridades ainda não haviam reconhecido que uma operação policial tinha acontecido. Maré Vive compartilhou imagens de um vídeo do helicóptero sobrevoando a Maré e atirando para baixo, comentando sarcasticamente: “Realmente não foi uma operação. Esse helicóptero aí dando tiro em uma das ruas mais movimentadas da Maré, a Teixeira Ribeiro, é ilusão de ótica. Tá todo mundo delirando, geral emaconhado”.
Mesmo com a procura de respostas por grupos locais da sociedade civil, a polícia não ofereceu nenhum esclarecimento. A ONG Redes da Maré publicou uma foto de uma calçada esburacada, registrada por um morador, e escreveu: “Procurada pela Redes da Maré, a Assessoria de Comunicação da Polícia Militar disse que não tinha informações sobre a operação na Maré e o 22º Batalhão da Policia Militar, localizado no território, não assumiu a operação, mas informou que estaria ocorrendo um confronto entre os grupos civis armados”.
Até a tarde de terça-feira, a unidade da CORE cedeu à pressão da mídia, dizendo à Globo News que sua equipe havia entrado no Parque União para “checar informações” e que seus caveirões e helicóptero foram atacados a tiros.
Pressionado por mais informações pela Redes da Maré, a Assessoria de Comunicação da Polícia Civil não respondia a e-mails e telefonemas.
O diretor da Redes, Alberto Aleixo, denunciou veementemente a operação, apontando para as táticas de guerra usadas pela Polícia Civil: “É totalmente proibido a helicópteros fazer disparos de cima para baixo e é totalmente irregular, é ilegal. A nossa lei não permite. Só em casos de guerra que é possível, mas não é o caso que a gente tá vivendo hoje. A Polícia Civil não é as Forças Armadas… A Polícia Civil brasileira, que é a polícia administrativa e judiciária, deve cumprir mandados judiciais”.
“A gente está muito preocupado que isso se transforme em ação corriqueira”, disse Alberto. “Têm marcas de disparos por toda Teixeira Ribeiro, na Rua Principal, na Parque União, e na Rubens Vaz”.