Campanha busca declaração das favelas como Patrimônio da Humanidade pela UNESCO

por Luisa Fenizola, em RioOnWatch

A organização TETO nasceu no Chile como TECHO, mas já atua em 19 países na América Latina, inclusive no Brasil, em mais de 100 comunidades em quatro regiões metropolitanas. Para além da construção de casas emergenciais, o TETO também busca apoiar o desenvolvimento comunitário e incidir nas políticas que atingem as favelas. Nesse sentido, a ONG está com uma campanha para que as favelas sejam declaradas patrimônio da humanidade pela UNESCO. O argumento central é de que, apesar do estigma, as favelas são lugares únicos e preenchem os critérios estabelecidos pela instituição.

Esses pré requisitos incluem, por exemplo, ser “um tipo de edifício ou conjunto arquitetônico… que ilustre significativos estágios da história humana”, o que podemos argumentar que as favelas cumprem este requisito, por serem expressão de uma urbanização acelerada e manifestação máxima da desigualdade contemporânea. Também incluem “representar uma obra-prima do gênio criativo humano”, neste caso as favelas preenchem pela criatividade na construção das casas, e “mostrar um intercâmbio importante de valores humanos… no desenvolvimento da arquitetura… do planejamento urbano, ou do desenho de paisagem”, que cumprem pelo caráter colaborativo das construções via mutirão e pelo espaço de sociabilidade e integração que representam. É possível alegar ainda que as favelas cumprem inclusive critérios estéticos, devido à composição visual que formam e as suas vistas privilegiadas. Para ser declarado patrimônio, basta preencher um dos 10 pré-requisitos.

“Nos assentamentos populares e favelas há a evidência mais clara da busca por sobrevivência na América Latina, começando no trabalho colaborativo e organizado dos moradores e moradoras. Um testemunho que se expressa na resistência a violação permanente dos direitos humanos e no esforço constante das pessoas que vivem lá para construir suas próprias respostas e soluções. Tudo isso constitui um patrimônio que, como sociedade, temos que reconhecer e preservar”, coloca Juan Pablo Duhalde, Diretor das Áreas Sociais do TECHO Internacional.

No Rio, não só o Cais do Valongo é considerado patrimônio mundial, mas “entre a montanha e o mar,” o Rio foi a primeira paisagem cultural urbana declarada Patrimônio Mundial. Na candidatura da cidade apresentada à UNESCO pelo IPHAN, foram exaltados elementos como o Pão de Açúcar, o Corcovado, a Floresta da Tijuca, o Aterro do Flamengo, o Jardim Botânico, a praia de Copacabana e a entrada da Baía da Guanabara. As favelas não são mencionadas, ainda que componham a paisagem da área delimitada, que começa em Copacabana e atravessa a Baía de Guanabara. Raquel Rolnik, relatora especial da ONU para o direito à moradia adequada, declarou na ocasião que as favelas eram uma parte integral desse status de patrimônio:

Nada mais forte nesta paisagem que a presença das favelas, espaço de autoprodução da vida cotidiana de milhares de cariocas e migrantes, que, na contingência de uma cidade que os excluiu e diante da absoluta precariedade dos meios, construíram um espaço de resistência e inserção, contraditório e complexo como é sua relação com a cidade. Agora este lugar está protegido–internacionalmente–e sua geografia de puxadinhos e pequenos lotes deve ser inscrita e consolidada em uma legislação que reconheça direitos, protegendo o lugar da arbitrariedade de remoções e projetos factoides.

A partir da campanha e das assinaturas, os organizadores pretendem ganhar visibilidade suficiente para incidir sobre o debate que ocorrerá na reunião da UNESCO do dia 24 junho, na qual novos nomes serão adicionados à lista. O Brasil, inclusive, integra esse ano o comitê de 13 países responsáveis pela escolha. “O objetivo principal é dar visibilidade aos assentamentos populares e favelas da América Latina, e fazer com que o público se envolva com essa realidade. A candidatura é só um mecanismo para consegui-lo”, explica Camilo Sánchez, Chefe de Campanhas do TECHO Internacional. A organização acredita que o título pode contribuir para o reconhecimento da realidade das favelas e para uma maior vontade política de governos e disposição de indivíduos para trabalhar com os moradores com o objetivo de trazer melhorias para o território.

Além disso, o status de patrimônio traz consigo a responsabilidade de preservação. A organização propõe que sejam conservados o esforço, a capacidade e o potencial dos moradores de favela, ao mesmo tempo que a realidade possa ser transformadas positivamente por e para eles.

Assine a petição aqui.

Assista o vídeo da campanha (em espanhol):

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