Estudante usa agroecologia para resgatar cultura de comunidades em Matopiba

Região é marcada pelo agronegócio e pela ofensiva contra as famílias que tentam sobreviver no local

Camila Salmazio*, Brasil de Fato

Foi na escola agrícola que Jaime Lima Honório deu os primeiros passos rumo ao seu projeto voltado à agroecologia. Até então, a escola particular onde Jaime cursa técnico agrícola, em Balsas, no Maranhão, só havia desenvolvido projetos voltados ao monocultivo. Os benefícios eram voltados aos grandes fazendeiros. 

Jaime explica que desenvolveu o “Projeto Vida: orgânico sustentável, opção inteligente” e apresentou na escola, causando espanto dos colegas. Esse estranhamento dos colegas de classe e dos professores tem relação com a região que Jaime vive, conhecida como Matopiba. A sigla é a junção das iniciais dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A região é considerada umas das grandes fronteiras agrícolas do país na produção de grãos, mas os métodos de expansão do agronegócio e os agrotóxicos utilizados no local são questionados por ambientalistas.

Jaime mora na comunidade Sete Lagoas, no município de Santa Filomena, no Piauí, que é afetada pelas práticas do agronegócio. O projeto do estudante tem como público alvo os moradores da região. “Eles (os moradores) já trabalham com o sistema agroecológico, só que quando chega para eles e pergunta: você trabalha com agroecologia? Eles respondem: o que é isso? Eles não sabem o que quer dizer. Então é um projeto que vai fazer demonstrações na comunidade, que vai servir de exemplos de que dá certo e vale a pena investir porque beneficiará ele (o morador) e a natureza”, explica Jaime.

A horta de Maria Zulmira, mãe de Jaime, é exemplo da prática entre os moradores das comunidades locais. Durante a passagem da reportagem pelo Sul do Piauí, ela mostrou com orgulho a plantação que trata sem uso do veneno. Apesar do cuidado, o roçado de Maria fica no pé de um morro e é atingido pelos agrotóxicos que descem com as chuvas. “A gente planta, mas quando a fava começa a ir bem, ela fica amarela. Eu acho que é por causa do veneno da serra que jogam de avião, aí prejudica as baixadas”, relata a mãe do jovem.

Jaime, que tem apenas 21 anos, quer aprimorar as experiências da comunidade e organizar os moradores para resistir às ofensivas dos grandes produtores. Mais do que plantar de forma agroecológica, o trabalho de Jaime também é uma maneira de preservar a descendência indígena da maioria dos locais que tem origem gamela. “Há ainda algumas culturas como plantar consociados, várias lavouras junto, que era o que os índios faziam e eles hoje fazem. Brincadeiras de roda que os índios faziam, eles [moradores] brincam. Mas eles esconderam sua cultura, perderam por medo. Para permanecer ali, eles tiveram que se adaptar ao que ofereciam, aos avanços tecnológicos, a lidar com agrotóxicos, ao modo de falar, a linguagem. Tudo foi se perdendo para se prevenir, para não sofrer agressões tão fortes como no passado”, avalia Jaime.

A floresta, as sementes livres de veneno e a força de um jovem de mudar a realidade. É assim que germina e nasce a resistência em Matopiba.

*Com produção de Daniela Stefano.

Edição: Júlia Rohden.

Imagem: As terras na região viraram ativos financeiros, e a especulação alimenta o processo de valorização das terras. / Reprodução

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