Bolsonaro tem mais que o dobro das intenções de votos entre homens do que entre mulheres de acordo com as duas últimas pesquisas eleitorais.
No cenário em que Lula está fora da disputa e o deputado federal do PSL lidera com 22%, ele alcança 30% de intenção de votos entre homens e apenas 13% entre mulheres, segundo o Datafolha. Já na pesquisa Ibope, no mesmo cenário, ele conta com 20% no geral, ostentando 28% dos votos de homens, e, novamente, 13% das mulheres.
Parte dessa diferença deve-se à defesa, por parte do candidato, de pautas como o armamento da população e à sua retórica mais agressiva, que encontram mais eco entre homens. Mulheres apresentam um posicionamento mais crítico a esse discurso – até porque, para cada morto, ferido ou preso, ficam filhas, mães, irmãs, esposas, que acabam sendo obrigadas a também viverem esses dramas.
Quando o ex-presidente é incluído entre os candidatos, aparece com 39% e Bolsonaro, 19%, no Datafolha, e 37% contra 18%, no Ibope.
Marina Silva, que tem um eleitorado de mulheres pelo menos 50% maior que o de homens em ambas as pesquisas, protagonizou o ponto alto do debate na RedeTV!, na última sexta (17), quando criticou Bolsonaro por ele defender que o fato de mulheres ganharem menos que homens exercendo a mesma função não ser uma preocupação do presidente da República por ser algo já vetado pelas leis trabalhistas.
E ela foi além: ”Nós somos mães, nós educamos os nossos filhos. A coisa que uma mãe mais quer é ver um filho sendo educado para ser um cidadão de bem. E você fica ensinando para os nossos jovens que têm de resolver as coisas na base do grito, Bolsonaro”. Foi possível verificar, pelas expressões do candidato, que ele ficou encurralado.
Assim que a propaganda eleitoral no rádio e TV começar, a campanha de Geraldo Alckmin – que disputa diretamente com o capitão da reserva do Exército uma vaga no segundo turno devido à proximidade do eleitorado – deve inundar os eleitores com peças para desconstruir Bolsonaro. O tucano conta com um latifúndio de coligações envolvendo partidos da centro-direita e direita e, por isso, colherá 44% do tempo de exposição.
Um dos focos dos spots inseridos na programação para mostrar quem é o adversário promete ser casos em que o candidato foi acusado de machismo.
Há um núcleo da candidatura de Bolsonaro representado por seus 15% de votos espontâneos (tanto na pesquisa Datafolha, quanto na CNT/MDA, divulgada segunda) que deve fechar com ele mesmo que quebre o pescoço de um gatinho em praça pública e depois dê uma bicuda no cadáver.
Foi assim quando Donald Trump, então candidato à Presidência dos Estados Unidos, foi acusado de violência sexual contra mulheres. O escândalo, que apareceu durante a campanha, não foi capaz de interferir no resultado. Afinal, ele não foi eleito por culpa de sites russos e notícias falsas, apesar disso poder ter colaborado, mas porque parte considerável dos eleitores acreditou em sua promessa de geração de empregos.
É difícil prever o que acontecerá com a parcela de eleitoras de Bolsonaro que ainda está disposta a mudar de voto e, principalmente, com as indecisas caso sejam bombardeadas com a imagem de um candidato que diz que a diferença salarial de homens e mulheres na mesma função é uma não-questão eleitoral.
Ou se ouvirem o áudio em que diz que a deputada Maria do Rosário (PT-RS) ”não merecia” ser estuprada por que ele a considera ”muito feia”. Por conta disso, aliás, Bolsonaro tornou-se réu no Supremo Tribunal Federal em ações penais.
Ou ainda se for reproduzido o que ele disse, em um evento, em abril do ano passado: “Eu tenho cinco filhos. Foram quatro homens, a quinta eu dei uma fraquejada e veio uma mulher”.
Em um debate no SBT, em outubro de 2014, Aécio Neves chamou Dilma Rousseff de ”leviana” – o que é visto como algo especialmente agressivo contra mulheres, principalmente entre grupos sociais mais humildes. Após o episódio, e de sua exploração pela campanha, a petista foi de 42% para 47% no eleitorado feminino, enquanto o tucano passou de 46% para 41%. A mudança pode ter ocorrido pela percepção de que a economia ia bem até aquele momento, mas foi o suficiente para criar uma narrativa que foi usada no segundo turno das eleições presidenciais.
O Brasil é outro de lá para cá e não se sabe qual o comportamento de uma sociedade ultrapolarizada, curtida em quatro anos de desemprego galopante e em índices de mortes violentas maiores que os de guerras, em que a sociedade exige liberdade e ordem, direitos e deveres. E cansada de tudo o que está aí pode ficar suscetível a quem prometa lhe salvar.
Também não se sabe se, no caso de Bolsonaro, esse degrau de votos segue até o final ou se o voto de mulheres acompanhará o de homens ou ainda se o de homens acompanhará o de mulheres. Certamente, isso vai gerar acalorados debates nos jantares de família, nos intervalos de colégios e faculdades, na hora do almoço no trabalho.
Bolsonaro tem repetido, exaustivamente, que seus adversários querem colocar nele a pecha de ser contra direitos das mulheres, dos negros, da população LGBTT. Mas terá que se esforçar um pouco mais se quiser parecer convincente.
Pois, até o final das eleições, ele continuará tentando convencer as eleitoras de que não é misógino. E seus adversários, lembrando do contrário.
Todos nós, homens, educamos a nós mesmos, desde cedo, para sermos violentos com os outros gêneros. A grande questão é como atuamos para reverter isso ao longo da vida.
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Foto: Jair Bolsonaro grita atrás de Maria do Rosário em discussão na Câmara, em setembro de 2016 – Marcelo Camargo / Agência Brasil