O ataque ao candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL) – esfaqueado nesta quinta-feira durante um ato de campanha em Minas Gerais – joga ainda mais incerteza sobre uma corrida eleitoral que já estava bastante indefinida. Uma análise inicial do episódio, porém, indica que o Bolsonaro tende a ser beneficiado eleitoralmente pelo atentado, enquanto o concorrente do PSDB, Geraldo Alckmin, que disputa diretamente com ele o voto mais conservador, é o que deve enfrentar mais dificuldades no novo cenário
Bolsonaro foi transferido nesta sexta-feira para o hospital Albert Einstein, em São Paulo, e está com quadro estável, mas sem previsão de alta. Seu filho, Flávio Bolsonaro, disse que o pai não deve mais realizar campanha nas ruas.
Para analistas políticos ouvidos pela BBC News Brasil, o ataque não deve gerar uma disparada nas intenções de voto ao candidato do PSL, mas tem potencial para, ao menos, consolidar o apoio que ele já conquistou, o que aumenta suas chances de ir ao segundo turno.
Com a saída do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, declarado inelegível pela Justiça, Bolsonaro aparece em primeiro lugar nas sondagens eleitorais. A última pesquisa Ibope lhe dá 22%, dez pontos percentuais acima de Marina Silva (Rede) e Ciro Gomes (PDT), ambos empatados na segunda colocação com 12%. Logo atrás vem Alckmin, com 9%.
O provável substituto de Lula como candidato do PT, Fernando Haddad, aparece com 6% – ele deve ser confirmado na cabeça de chapa petista até terça-feira. A pesquisa, realizada no fim de semana passado, tem margem de erro de dois pontos percentuais.
Propaganda eleitoral e “efeito de mídia”
Havia uma expectativa entre cientistas políticos de que, após o início da propaganda eleitoral em rádio e televisão no final de agosto, Bolsonaro, que tem direito a pouquíssimo tempo, começaria a perder votos, enquanto Alckmin, dono do maior espaço de propaganda, se tornaria mais conhecido e começaria a subir na preferência do eleitorado.
No entanto, após ter sido vítima de uma facada, Bolsonaro deve ser beneficiado por uma mistura do que analistas chamam de “efeito tragédia” e “efeito de mídia”, em que há uma intensa cobertura da imprensa, com viés positivo, já que ele foi vítima de um ataque. Além disso, ele agora terá uma justificativa legítima para não comparecer aos debates com outros candidatos, onde tem sido alvo preferencial dos adversários.
“Bolsonaro receberá uma exposição intensa nos próximos dez dias, que não teria sem esse ataque, numa cobertura que vai suavizar sua imagem de agressividade, pois aparecerá numa posição de fragilidade. Não vai perder votos e pode ser até que suba um pouco”, acredita o cientista político Jairo Pimentel Jr., pesquisador da FGV.
A socióloga Esther Solano, professora Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) que vem estudando de perto seguidores do Bolsonaro, também acredita que o ataque deve consolidar o eleitorado que o candidato já construiu. O episódio, diz, reforça entre seus apoiadores a leitura de que “o cidadão de bem está desprotegido” e que é preciso ser duro no combate a violência, uma das principais propostas do candidato.
“Mas não acredito que isso vai ajudar a conquistar muitos votos de indecisos, pois esse grupo mais moderado pode entender, com esse ataque, que o discurso agressivo na verdade estimula atos violentos”, pondera.
O analista político Alberto Almeida, que vem afirmando desde o ano passado que o cenário mais provável nessa eleição seria novamente um segundo turno entre PT e PSDB, reconhece que o atentado aumenta as chances de Bolsonaro.
“O eleitor que está apoiando Bolsonaro tradicionalmente votava no PSDB. Para Alckmin crescer nas pesquisas, Bolsonaro tem que cair. Esse ataque realmente dificultou a vida do tucano”, constata o analista político Alberto Almeida, autor do livro “A cabeça do brasileiro”.
Por outro lado, Marina, Ciro e Haddad têm, por sua trajetória política, mais espaço para crescer disputando os votos da esquerda. Para os analistas entrevistados, o atentado poderia atrapalhar a transferência de votos de Lula para Haddad caso o autor do ataque fosse um militante claramente ligado ao PT. As primeiras informações apuradas pela Polícia Federal, no entanto, não indicam qualquer conexão do suspeito com o partido.
Adélio Bispo de Oliveira confessou ter esfaqueado o candidato. Ele é solteiro, tem 40 anos, é morador de Juiz de Fora (MG) e foi filiado ao PSOL entre 2007 e 2014. Suas postagens no Facebook indicam um perfil político mais à esquerda, porém com alguns elementos contraditórios como apoio à redução da maioridade penal, tema mais frequentemente defendido pela direita, e rejeição generalizada a políticos. Ele também criticava a ex-presidente Dilma Rousseff.
Depois de ter atacado Bolsonaro, ele foi preso e indiciado pela Polícia Federal “por atentado pessoal por inconformismo político”.
Redução dos ataques?
Além do aumento da exposição, o atentado também pode oferecer uma blindagem a Bolsonaro contra os fortes ataques que vem recebendo de seus concorrentes, principalmente por suas declarações agressivas com mulheres e a favor do armamento da população. Na esteira dessas críticas, a última pesquisa Ibope mostrou um aumento da rejeição ao candidato, que subiu de 37% para 44% em cerca de duas semanas, maior patamar entre os concorrentes.
“O crescimento da rejeição em geral antecede a perda de intenção de voto. Esse atentado, porém, vai obrigar os concorrentes a segurar os ataques ao Bolsonaro, freando esse processo de aumento da rejeição”, analisa Pimentel.
“Atacar alguém numa situação delicada como a de Bolsonaro pode provocar o que chamamos de efeito bumerangue, quando o ataque acaba se voltando contra seu autor”, acrescenta.
O cientista político considera que a redução dos ataques pode deixar Bolsonaro numa posição mais favorável também para uma eventual disputa de segundo turno, caso contenha o aumento da sua rejeição. Em geral, o candidato que sai vitorioso dessa segunda etapa é aquele que desperta menos repulsa no eleitorado, sendo capaz de atrair eleitores que optaram por outros nomes no primeiro turno.
A última pesquisa Ibope, realizada antes do ataque, mostrou que Bolsonaro seria derrotado em segundo turno por Ciro, Marina e Alckmin e empataria com Haddad. O petista, porém, ainda é pouco conhecido e tem potencial de crescer na preferência do eleitor, avaliam os analistas.
Impacto do ataque pode perder fôlego até eleição
Já Alberto Almeida acredita que o “efeito de mídia” que deve beneficiar o candidato do PSL inicialmente tende a perder fôlego até a eleição. O primeiro turno ocorre apenas em sete de outubro, daqui a um mês.
Ele recorda a morte do candidato a presidente Eduardo Campos (PSB) na queda de um avião em agosto de 2014. O primeiro resultado foi que a comoção gerada pelo acidente e a grande exposição da sua substituta, Marina Silva, catapultaram a candidata as pesquisas de intenção de voto, deixando-a empatada na liderança com Dilma Rousseff (PT). Conforme o impacto da notícia foi passando e os ataques à Marina se intensificaram, seu apoio foi murchando e ela acabou em terceiro lugar, atrás de Dilma e Aécio Neves (PSDB).
“O ataque beneficia Bolsonaro, mas se tivesse ocorrido a poucos dias da eleição, teria impacto bem maior”, afirma Almeida.