Carta das comunidades quilombolas e indígenas do Vale do Guaporé (RO)

Comunidades indígenas e quilombolas do Vale do Guaporé, em Rondônia, se reuniram nos dias 22 e 23. No documento final do encontro, os/as participantes apontam reivindicações e que também estão voltando aos seus territórios “conscientes que precisamos de nossa união para enfrentar as dificuldades e para manter mais vivas e atuantes nossas comunidades”. Confira:

CPT

Nos dias 22 e 23 de setembro de 2018 estivemos reunidos na Comunidade Quilombola de Jesus, nas margens do Rio São Miguel, no Vale do Guaporé, no estado de Rondônia, representantes das comunidades indígenas Puruborá, do Rio Manoel Correia (Seringueiras) e kujubim (Rio Cautário, Costa Marques); de quilombolas da Comunidade de Santo Antônio (São Francisco do Guaporé), de Santa Fé e do Forte Príncipe da Beira (Costa Marques) e da Comunidade de Jesus (São Miguel do Guaporé).

Sentados todos juntos, conversamos, recuperando e trocando experiências, memória da vida e da luta das famílias das comunidades pela conquista dos nossos territórios ancestrais, de nossos processos de resistência e de enfrentamento às ameaças sofridas, seja por parte de grileiros e fazendeiros, seja pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Exército Brasileiro.

Trocando saberes e experiências, partilhando alimentos, sabores e saberes. As comunidades presentes reafirmam nossa vontade de unir forças pelo reconhecimento e titulação de nossos territórios, dos quais apenas dois estão titulados, em longos processos que têm muita dificuldade para avançar. Também unir forças pela defesa dos nossas terras e rios contra invasões, retirada de intrusos e domínio dos recursos naturais. Também pelo direito à educação, com construção de escolas, educação diferenciada indígena e quilombola, com resgate das nossas histórias e culturas próprias, com capacitação de professores e acesso a ensino médio e superior. Contamos com a parceria da EFA-VALE de São Francisco do Guaporé, que teve representantes no encontro.

Reivindicamos pelo direito à saúde, com a construção de postos de saúde em várias comunidades que precisam deles, resgate de saberes tradicionais de parteiras, benzedores e benzedeiras, e também pela presença de profissionais de enfermagem indicados pelas próprias comunidades, assim como atendimento médico regular, que na maioria das comunidades não existe.

Discutimos sobre a necessidade de garantia dos nossos direitos previdenciários diferenciados. A recuperação de nossos espaços de lazer e esporte para a juventude, para festas e eventos culturais. A falta de água tratada e a construção de poços artesianos. A dificuldade de transporte, de meios como camionetes e barcos, assim como estradas encascalhadas.  Moradias decentes, com acesso aos programas de crédito habitacional, acesso a madeira e materiais de construção, que às vezes nos são negados. Direitos a abertura e plantio de roças e criação de animais nos próprios territórios, para aqueles que sofrem impedimentos. Sempre dispostos a acolher e receber visitantes, também deploramos o turismo invasivo. Exigimos energia para as comunidades onde ainda não chegou, telefone e meios de comunicação eficientes e modernos, como a internet, que algumas comunidades ainda precisam.

Juntos nos comprometemos a lutar pelos nossos direitos, com envolvimento da juventude, que participou ativamente deste encontro, e ajuda de parceiros, como a CPT-RO, com assessoria jurídica e contando com políticas públicas voltadas às nossas comunidades. Voltamos às nossas comunidades animados a construir articulações entre os quilombolas de Rondônia, que nos representem, e redes de solidariedade entre comunidades tradicionais e indígenas, que nos fortaleçam, conscientes que precisamos de nossa união para enfrentar as dificuldades e para manter mais vivas e atuantes nossas comunidades.

Na Comunidade Quilombola de Jesus, dia 23 de setembro de 2018.

Foto: Romario Delapicola

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