Votar na Democracia ou na Ditadura? Por Gilvander Moreira[1]

Para Combate Racismo Ambiental

“Felizes os que constroem a paz, pois serão chamados filhos de Deus” (Mateus 5,9), bradou Jesus Cristo no Discurso da Montanha, na palestina, colônia com povo escravizado e explorado pelo Imperialismo Romano. Dia 28 de outubro de 2018, no segundo turno da Eleição para presidente do Brasil, as eleitoras e os eleitores não votarão apenas em Fernando Haddad ou em Jair Bolsonaro, ou anularão ou farão abstenção, mas votarão, principalmente, pelo fortalecimento da nossa enfraquecida Democracia ou assinarão “um cheque em branco” para reingressar o Brasil em outra Ditadura.

Óbvio que o Partido dos Trabalhadores (PT) cometeu vários erros e praticou contradições, mas também é inegável que a corrupção não iniciou com o PT – há 518 anos há opressão e corrupção no nosso querido Brasil – e que sob o ponto de vista social, os 13 anos de governo do PT trouxeram ganhos de direitos sociais para o povo brasileiro. Estamos em uma sociedade capitalista, na qual a classe dominante sempre insiste em reproduzir e ampliar a desigualdade social. Quanto mais desigualdade social maior será a violência social. Reprimir essa violência, sem superar suas causas, e aumentar a desigualdade social só faz crescer a injustiça social. Como uma cortina de fumaça, a ideologia dominante – as ideias da classe dominante – e as fake News (notícias falsas) estão embaçando a vista de milhões de pessoas que, mesmo sendo oprimidas e exploradas, estão sendo seduzidas a votar em quem vai governar contra elas. A privatização da fé cristã, dentro e fora da Igreja Católica, com Teologia da Prosperidade, espiritualidades intimistas e moralismos também tem causado um divórcio entre o ensinamento de Jesus Cristo e a prática de muita gente que se diz cristã. Bolsonaro defende torturadores e a tortura, diz que vai liberar o comércio de armas e diminuir a idade penal. Enfim, ele pensa que com repressão resolverá violência social e desigualdade econômico-social. Lego engano. Por outro lado, Fernando Haddad apresenta um programa de governo com “um lápis em uma mão e a carteira de trabalho assinada em outra” e com políticas sociais de inclusão. No entanto, Haddad sofre com o antipetismo disseminado no tecido social.

Neste cenário gravíssimo, convém puxar à memória um pouco do que aconteceu na Ditadura militar-civil-empresarial de 1964 no Brasil. Os capitalistas, abocanhando a terra em propriedade privada capitalista, promoveram a mecanização da agricultura, desde a época da ditadura militar-civil-empresarial de 1964 e, assim, realizaram o que muitos chamaram de ‘revolução verde’, em contraposição ao projeto de sociedade que incluía fazer as reformas de base: reformas agrária, urbana, da educação, tributária e política. Sob o fomento do governo federal, os capitalistas da cidade levaram todo o arsenal industrial de máquinas com pacotes químicos para a produção agropecuária. Assim, “ensejou um modelo agrário/agrícola que mereceu a fina caracterização de “uma agricultura sem agricultores”, produzindo “muitos trabalhadores e trabalhadoras rurais sem terra ao concentrar muita terra em poucas mãos” (PORTO-GONÇALVES; CUIN; LEAL; NUNES SILVA, 2015, p. 90). Na época da ditadura, “entre 1967/1978, os latifúndios no Brasil ampliaram sua área em 69,9 milhões de hectares. Foi o período da denominada modernização da agricultura da ditadura militar de 1964, que trouxe consigo o crescimento da concentração fundiária nas grandes propriedades latifundistas” (OLIVEIRA, 2015, p. 30).

A ditadura militar-civil-empresarial de 1964 fomentou também a repressão e o assassinato de lideranças camponesas, conforme demonstra um integrante da Comissão Nacional da Verdade (CNV). “A ditadura ‘terceirizou’ mortes e desaparecimentos forçados de pelo menos 1.196 camponeses e apoiadores, com financiamento do latifúndio. O Estado se omitiu, acobertou e terceirizou a repressão política e social no campo, executada por jagunços, pistoleiros, capangas e capatazes a serviço de alguns fazendeiros, madeireiros, empresas rurais, grileiros e senhores de engenhos, castanhais e seringais” (GILNEY VIANA, ex-coordenador do Projeto Memória e Verdade da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República).[2]

Durante o século XX, várias ditaduras militares foram fomentadoras de injustiça agrária em vários países da América AfroLatÍndia. A Guatemala, por exemplo, esteve sob as botas dos militares, em ditadura militar, de 1954 até 1996. Durante as quase quatro décadas de chumbo, 40 mil pessoas foram assassinadas pela Ditadura militar na Guatemala. Na Guatemala, de 24 a 29 de novembro de 2004, participando do VII Congresso Missionário Latino-Americano e II Congresso Americano Missionário, pudemos sentir e perceber que o povo guatemalteco ainda está profundamente ferido pela opressão e repressão da ditadura militar. Uma advogada chorou muito, enquanto me dizia: “Há profundas feridas em nosso povo. Sofremos a mais cruel das ditaduras da América Latina. Enquanto eu estudava na Universidade, diversas vezes ficamos sitiados sem poder sair, pois o exército cercava a universidade para pegar os ‘subversivos’. Um dia, nos despedimos de um professor, às 18 horas. Ao chegar em minha casa, às 20 horas, eu soube que aquele professor, competente e profundamente humano, tinha sido assassinado. Isso corta nosso coração de dor. Ainda hoje é arriscado denunciar, pois podemos ser perseguidos. Graças a Deus, está aumentando a pressão internacional reforçando nossa luta pelos Direitos Humanos e Sociais” (Depoimento de uma advogada guatemalteca, durante o VII Congresso Missionário Latino-americano, dia 25/11/2004 na cidade da Guatemala).

Assustador também é que entre as propostas capitalistas de Jair Bolsonaro está acabar com o Ministério do Meio Ambiente e com a fiscalização feita por fiscais do IBAMA, do ICBbio e do Ministério do Trabalho. Isso, segundo ele, “para não incomodar o (grande) produtor”, ou seja: latifundiários e empresários do agronegócio estarão completamente liberados para aprofundar a devastação ambiental e o envenenamento da terra, da água, do ar e dos alimentos. Isso é proposta de exterminador do futuro. Necessário o alerta feito por diversos intelectuais orgânicos na Nota “O futuro da Amazônia passa pelo voto nas eleições de 2018”, que diz: “Sem Amazônia não existe o Brasil, tal qual o conhecemos”. Na Nota, afirmam: “são quatro os serviços que o bioma presta aos amazônidas, ao Brasil e ao resto do planeta.

1º- O ciclo das águas. Hoje, pelo conhecimento científico construído, são os rios voadores que vêm da Amazônia que espalham as chuvas por todo território brasileiro, indo inclusive até ao Uruguai, Argentina e Paraguai. Sem a floresta para injetar mais água na atmosfera, esses rios voadores não se formam. Uma simples Sumaúma, árvore imensa da Amazônia, injeta cerca de mil litros de água por dia na atmosfera. Portanto, sem a floresta Amazônica o Sul e o Sudeste brasileiro, onde estão 70% da riqueza da América Latina, se transformam em um deserto.

2º- O ciclo do carbono. Cada árvore corresponde a toneladas de carbono fixado em sua estrutura. Quando uma árvore dessa é queimada ou entra em decomposição, esse carbono é liberado em forma de gás e vai reforçar o aquecimento global, contribuindo para a mudança do clima em todo o planeta.

3º- A mega diversidade. Cada metro quadrado da Amazônia tem mais biodiversidade que em qualquer lugar do mundo. Daí provêm alimentos fantásticos como o açaí, cupuaçu, castanhas, folhas, raízes etc. Também vêm os fármacos, as essências, os cosméticos, os óleos e outra quantidade incalculável de riquezas que a só a natureza pode oferecer. Trocar essa riqueza por mais algumas cabeças de gado, a exploração de minerais ou algumas toneladas de soja é uma loucura absoluta. Mas, ela pode se tornar real se um candidato for eleito.

4º- Os povos originários. Na Amazônia estão vários povos originários ainda remanescentes do grande genocídio que se abateu e se abate sobre eles até hoje. Eles nos preservaram o que ainda temos de riquezas naturais na Amazônia, a sua biodiversidade, além de nos mostrarem que é possível viver da natureza sem destruí-la. Papa Francisco insiste em ouvir essas populações originárias no Sínodo Panamazônico de 2019 em Roma. Portanto, a destruição da floresta é também o tiro final no coração das nossas populações indígenas remanescentes. Alertamos para propostas que são contrarias à vida e atingem diretamente os povos originários.

Somos contrários a qualquer proposta que leve ao fechamento de órgãos públicos que defendem os direitos que estão a serviço da defesa da vida e do planeta (Ministério do Meio Ambiente, dos organismos de controle como IBAMA e ICMBIO), concessões de obras sem licenciamento ambiental, enfim, uma lista infinita de agressões ao ambiente e aos povos que podem se tornar realidade. Toda essa riqueza fundamental está em jogo. Ou preservamos ou destruímos o que nos resta. Os serviços prestados pela Amazónia são naturais e o conhecimento sobre eles é de ordem científica, mas uma decisão política pode derrubar tudo que a natureza nos oferece em sua infinita generosidade. O futuro da Amazônia passa pelo voto nas eleições de 2018.”

Pelos motivos expostos, acima, e por muitos outros que não há espaço para colocar aqui, a opção ética e cristã é votar em Haddad n. 13 e seguirmos dialogando e construindo a Democracia não apenas representativa, mas direta e participativa. Em nome do Deus da vida, das crianças, das próximas gerações, por amor ao próximo e pela paz, humildemente sugerimos o voto em Haddad, n. 13.

Referências:

CNBB. Campanha da Fraternidade de 2017: Os Biomas Brasileiros e Defesa da Vida. Ed.

CNBB. Brasília. 2017.

NOBRE, Antônio. Os rios voadores. https://www.youtube.com/watch?v=34Y93Ar4tCA.

_______. A Máquina de fazer água. https://www.youtube.com/watch?v=HqAvP_hpzTA

Acesso em 15/10/18.

OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Camponeses, indígenas e quilombolas em luta no campo: a barbárie aumenta. In:Conflitos no Campo Brasil 2015. Goiânia: CPT Nacional, p. 28-42, 2015.

PORTO GONÇALVES, Carlos Walter; CUIN, Danilo Pereira; LEAL, Leandro Teixeira; NUNES SILVA, Marlon. Bye bye Brasil, aqui estamos: a reinvenção da questão agrária no Brasil. In: Conflitos no Campo Brasil 2015. Goiânia: CPT Nacional, p. 86-99, 2015.

Notas:

[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG.

E-mail: [email protected] – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –

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[2] Jornal A Verdade, dez./jan./2017, n. 190, ano 17, p. 5. Cf. www.averdade.org.br

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