“Por mais que não tenha criado o conteúdo, essa pessoa [que fez o primeiro upload] é chave na disseminação —e pode ser um IP de uma agência de marketing ou alguém ligado a algum partido”, escreveu Patrícia Campos Mello
No GGN
O professor Miguel Freitas, especialista em telecomunicações da PUC-Rio, enviou para a Procuradoria Geral da República, em novembro de 2018, um relatório com dados que ajudariam a identificar quem foram os primeiros disseminadores de fake news no WhatsApp contra o PT, durante a corrida presidencial vencida por Jair Bolsonaro. Mas quase 2 meses depois do feito, ninguém entrou em contato com o pesquisador.
A PGR enviou o relatório para a Polícia Federal mas, segundo informações da Folha desta quinta (17), o relatório sequer foi anexado no inquérito oficial sobre o caixa 2 no WhatsApp de Bolsonaro, e nenhuma providência foi tomada até agora.
De acordo com a jornalista Patrícia Campos Mello, num primeiro momento, a PF até chegou a negar que recebeu o relatório. Depois, pela assessoria, afirmou que o documento foi recebido “fora dos autos” pelo delegado Thiado Marcantonio, responsável pelo inquérito que apura o disparo em massa de mensagem no WhatsApp que favoreceram o presidente eleito.
O professor escreveu à PGR que o relatório reúne “informações técnicas e indícios sobre as origens de algumas das postagens falsas mais relevantes observadas neste processo eleitoral em grupos públicos de WhatsApp” e que poderia “auxiliar em algumas linhas de investigação quanto ao uso e disseminação das ‘fake news’ na eleição de 2018.”
Freitas coletou dados de um total de 277 grupos de WhatsApp durante a eleição. Identificou 16 notícias falsas de grande circulação. Depois, chegou a “identificadores sobre o primeiro upload de cada vídeo ou imagem de WhatsApp”.
Os investigadores poderiam requerer na Justiça o registro que o WhatsApp mantém desses identificadores e, com isso, se chegaria ao IP da pessoa que fez primeiro o upload do material falso, além da data e a hora do envio. A Folha perguntou se alguma providência foi tomada e a assessoria disse apenas que o relatório foi recebido “fora dos autos”.
“Segundo o pesquisador, quando um arquivo de mídia é carregado pela primeira vez, ele produz nos servidores do WhatsApp um registro (log) que permite recuperar posteriormente a identificação do usuário que enviou esse conteúdo.”
“É tecnicamente possível obter, via judicial, informações sobre a origem de uma mídia digital enviada ou encaminhada na plataforma WhatsApp. Essas informações incluem o número do celular associado, a hora do acesso e o endereço IP do usuário que realizou o primeiro envio dessa mídia para a plataforma. Mídias digitais, tais como fotos e vídeos, encaminhados entre grupos e entre diferentes usuários dentro da plataforma WhatsApp preservam a capacidade de rastreamento ao usuário de origem”, afirma o relatório recebido por Procuradoria e PF.
Segundo a jornalista, nos EUA, o WhatsApp já forneceu esses metadados ao FBI (polícia federal americana) algumas vezes, mediante ordem judicial durante investigação de crimes.