Estamos diante de um ataque à soberania nacional

Suelen Aires Gonçalves*, no Sul21

O alerta foi dado!

As últimas notícias sobre a execução de Marielle Franco e Anderson Gomes merecem atenção total da sociedade civil e das instituições democráticas brasileiras. Estamos diante de um caso emblemático, estamos diante de um caso que nos apresenta com toda nitidez a agenda neoliberal  e de produção de morte, necropolícica como diria Achille Mbembe.

No dia de hoje, o Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime organizado (GAECO) do MP do estado do Rio de Janeiro (MP-RJ), em uma ação conjunta com a Polícia Civil desencadeou uma operação chamada “Os Intocáveis”, em Rio das Pedras – Zona Oeste do Rio de Janeiro. O nome da operação diz muito, pois refere-se a milicianos integrantes da milícia mais antiga e poderosa do Estado do Rio de Janeiro.

Neste momento, o objeto da ação do MP-RJ estava voltado aos crimes ligamos ao ramo imobiliário ilegal em Rio das Pedras, com inúmeras ações violentas e assassinatos. Indícios apontam uma ligação desse ramo do crime com o “Escritório do Crime”, que seria o braço armado da organização especializada em assassinatos por encomenda.

Um dos presos no dia de hoje é o Capitão Adriano Magalhaes da Nobrega, investigado por integrar o “Escritório do Crime”, segundo o MP do Rio de Janeiro o “Homem Forte” do “Escritório”. Esta organização é suspeita da execução de Marielle Franco e Anderson Gomes em 14 de março de 2018. Pois bem, esse senhor acima citado teve sua mãe, Raimunda Veras Magalhães e esposa, Danielle Mendonça da Costa Nóbrega ocupando cargos na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro no gabinete do então Deputado Estadual Flavio Bolsonaro (PSL-RJ), hoje  senador eleito.

As coincidências não param por aí. Além de empregar familiares do Capitão Adriano Magalhaes da Nobrega, o senador eleito fez duas homenagens na ALERJ para aquele que é apontado como o “Homem Forte” do Escritório do Crime. Em 2003, foi apresentada uma moção de louvor pelo “brilhantismo”. Na segunda homenagem, o PM em questão “prestava serviços a sociedade desempenhando com absoluta presteza e excepcional comportamento nas suas atividades”. Já em 2005, Flavio Bolsonaro concede a Medalha Tiradentes, a mais alta honraria da ALERJ.

As milícias aparecem como uma referência recorrente e preocupante das falas e relações da família Bolsonaro. Isso aparece em diversos momentos da sua trajetória política. Em 2003, Jair Bolsonaro elogiou a ação um grupo de extermínio no estado da Bahia, e para completar a manifestação, ele sugere que o esquadrão da morte “migre” para o Rio de Janeiro:

“Enquanto o Estado não tiver coragem de adotar a pena de morte, o crime de extermínio, no meu entender, será muito bem-vindo. Se não houver espaço para ele na Bahia, pode ir para o Rio de Janeiro. Se depender de mim, terão todo o meu apoio”, afirmou o então deputado Jair Bolsonaro. [1]

Infelizmente não é a primeira e nem será a última manifestação da família Bolsonaro sobre o tema das Milícias. Em 2008, na então CPI das Milícias no Estado do Rio de Janeiro, Bolsonaro faz novos elogios aos grupos paramilitares. Flávio Bolsonaro também diz ser favorável à legalização das milícias, durante seu mandato como deputado estadual pelo Estado do Rio de Janeiro.  Em seu discurso, apresenta sua proposta para a segurança da população, ou seja, retirando do Estado a atribuição sobre a segurança pública:

“As classes mais altas pagam segurança particular, e o pobre, como faz para ter segurança? O Estado não tem capacidade para estar nas quase mil favelas do Rio. Dizem que as milícias cobram tarifas, mas eu conheço comunidades em que os trabalhadores fazem questão de pagar R$ 15 para não ter traficantes”, afirma. [2]

Para nossa dor, esse tipo de cidadão está no poder central. Estamos diante de um caso gravíssimo que ataca diretamente as instituições democráticas no Brasil. A mistura de um governo anti-povo, aplicando uma agenda neoliberal para com a população, retirando direitos históricos da classe trabalhadora como o caso da reforma da previdência, o debate sobre o retrocesso histórico sobre o acesso a armas de fogo no Brasil, e essa relação obscura com as milícias é um barril de pólvora prestes a explodir. Gostaria de chamar a atenção a todas e todos, estamos diante de um caso que pode mudar o curso da história em nosso país e que pode ajudar a esclarecer o Caso Marielle Franco e Anderson Gomes, executados em março de 2018. Por eles, pela justiça e por todas e todos nós, nenhum silêncio.

(*) Socióloga, Doutoranda em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e membra do Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania (GPVC-UFRGS).

Notas

[1] Leia mais: Em discursos, Bolsonaro já exaltou milícias e grupos de extermínio

[2] Leia mais: Deputado quer legalizar milícias no Rio.

Foto: Guilherme Santos/Sul21

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